Em um futuro incerto, uma doença misteriosa faz com que as pessoas percam a capacidade de falar e de escrever. A linguagem se dissolve ou fica severamente debilitada, substituída por ruídos grotescos. Sem condições de diálogo, a incompreensão rapidamente degenera em violência física nas situações mais banais.
Esse é o cenário caótico descrito em Sons da fala, conto publicado em 1983 nos Estados Unidos. Eu não conhecia nada sobre a autora Octavia E. Butler (1947-2006), até que me chegou às mãos o livro Filhos de sangue, que traz essa história. Soube, então, que ela é uma referência no gênero ficção científica (ou “especulativa”, como alguns preferem), tendo recebido diversos prêmios na carreira.
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O mundo de Sons da fala talvez não esteja distante. Afinal, se temos a linguagem e não a usamos para diálogo e colaboração, ela serve para quê? Enquanto a chuva não para de cair no Estado, também não cessam as postagens com conteúdo falso ou manipulado nas redes sociais. Ora, se mesmo frente ao maior desastre natural já visto, usam-se as palavras mais para enganar e agredir do que para unir, restará o quê?
Não que Octavia Butler seja uma pessimista incorrigível. Ela diria, talvez, que o ser humano ainda está na adolescência e precisa chegar à maturidade. Se tiver tempo para isso, é claro.
O mesmo livro Filhos de sangue traz outro conto, O livro de Martha. Na história, Deus surge para a incrédula Martha e lhe dá a missão de salvar a humanidade – nas palavras d’Ele, ajudá-la a “encontrar formas menos destrutivas, mais pacíficas e sustentáveis de viver”. Para isso, vai emprestar um pouco de Seu poder à protagonista e ela que faça o que achar melhor.
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Após imaginar e descartar vários projetos de reforma social, Martha conclui que a solução está nos sonhos – não os metafóricos, mas os que vêm com o sono. Para ela, sonhos deveriam oferecer satisfação plena, um “paraíso particular” todas as noites. Que as pessoas tenham o máximo de felicidade enquanto dormirem, portanto.
Mas depois, ao acordar, que elas “estejam muito mais despertas e conscientes, muito menos suscetíveis a mentiras, à pressão do grupo e à autoilusão.”
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Sonhar, sim, e acordar para a maturidade.
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