Uma das mais importantes inovações em infraestrutura urbana em Santa Cruz do Sul, que mudou por completo a rotina local, completa 140 anos de concretização. Foi ao final de 1880, como menciona o historiador Hardy Elmiro Martin, em uma de suas crônicas do livro Recortes do passado de Santa Cruz, organizado e atualizado por Olgário Paulo Vogt e Ana Carla Wünsch, em edição da Edunisc, de 1999, que o ainda pacato núcleo urbano passou a ser iluminado por “românticos lampiões a querosene”. A conquista da iluminação pública, como era de compreender, transformou a ambientação local, permitindo que cidadãos se deslocassem mais à vontade à noite, e a vida social agregasse novo status.
Afinal, na época, 30 anos após a chegada dos primeiros imigrantes alemães, e apenas dois anos após a autonomia política em relação a Rio Pardo, e cujos 142 anos de emancipação foram comemorados em 28 de setembro, Santa Cruz já se tornava “moderna”. Essa iluminação pública foi ampliada e expandida ao longo de 1881, como refere o jornalista José Augusto Borowsky, da Gazeta do Sul, que assina a seção “Memória” nas edições de segunda-feira. Em fevereiro de 2015, Borowsky dedicou sua coluna a rememorar os famosos e charmosos lampiões na rua principal de Santa Cruz. “Em 1881, o conselho de vereadores autorizou uma grande melhoria na Vila de Santa Cruz: a colocação de dez lampiões de querosene na rua principal, a Silveira Martins, hoje Rua Marechal Floriano)”, citou Borowsky.
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Como frisou, os primeiros lampiões foram instalados nas esquinas, por Mathias Melchior. Com o sucesso da iniciativa, pouco a pouco foram sendo levados a outros pontos. E moradores até adquiriam o equipamento para que fosse colocado em frente de suas casas, como também enfatizou Hardy Elmiro Martin. Nascido em Ferraz, no interior de Vera Cruz, em 22 de setembro de 1927, Martin foi professor e diretor geral do Colégio Mauá, e foi colaborador da Gazeta do Sul, na qual publicou colunas a partir de 1968 e até seu falecimento, em 5 de julho de 1996.
A tarefa de acender os lampiões instalados na rua central de Santa Cruz a partir de 1880 e em 1881, salienta Martin, cabia a determinada pessoa que arrematara esse serviço junto à Câmara Municipal. E o contrato era bastante específico, e rigoroso, prevendo algumas regras curiosas, como cita Martin. Por exemplo: “Não haverá iluminação nas cinco noites antes de lua cheia, nem na noite de lua cheia, como também não na noite seguinte; haverá meia iluminação nas duas noites seguintes. Nas outras noites do mês, haverá iluminação inteira”.
Ou ainda: “Cada lampião dos dez existentes na Rua Silveira Martins (atual Marechal Floriano) levará, para cada noite, meia garrafa de querosene nas noites de iluminação inteira e um quarto de garrafa nas noites de meia iluminação”. Quando terminava o “combustível”, imperava a escuridão da noite e o silêncio era total, pois ainda era costume repousar no mínimo oito horas por noite. Apesar da inovação tão festejada, os postes eram baixos, com pouco mais de dois metros, e a luz se espalhava por espaço bastante limitado.
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O arrematante trabalhava no início do contrato dois meses para receber o primeiro ordenado, pois o correspondente ao primeiro mês ficava em depósito na Câmara. E havia ainda uma multa de dez mil réis por noite, uma soma de vulto para a época, por algum descumprimento eventual do que determinava o contrato.
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REGRAS CLARAS
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Algumas outras regras de contrato do responsável pela iluminação pública através de lampiões a querosene em Santa Cruz:
* O arrematante fornecerá todos os materiais, isto é, querosene, pavios, cilindros etc., e conservará em perfeito estado os lampiões pertencentes à Câmara Municipal e entregará os mesmos lampiões no estado em que os recebeu, no fim de seu contrato.
* Nas noites de iluminação, os lampiões deverão se achar acesos um quarto de hora depois da entrada do sol.
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* Servirá como fiscal da iluminação o fiscal da Vila, cujas ordens deverá cumprir o arrematante da iluminação.
* Como fiança da iluminação, ficará em depósito a importância que o arrematante tiver de receber do cofre municipal no primeiro mês do seu contrato. Esta quantia servirá para a satisfação das seguintes multas: a) o arrematante pagará a multa de dez mil réis por noite que não acender um ou mais lampiões; b) perderá o arrematante toda a quantia depositada se por negligência ou não cumprimento dos seus deveres assim o julgar a Câmara Municipal.
* A Câmara Municipal tem o direito de rescindir o contrato se o julgar favorável aos interesses da Municipalidade.
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* Os pagamentos serão feitos mensalmente à vista do atestado passado pelo fiscal, rubricado pelo Presidente da Câmara.
Fonte: Recortes do passado de Santa Cruz, de Hardy Elmiro Martin
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A chegada da eletricidade
O sistema de iluminação por lampiões a querosene, comenta Hardy Elmiro Martin, funcionou bastante a contento, tendo vigorado por mais de um quarto de século, entre 1880 e até 1906, quando, além das melhorias nessa infraestrutura, chegava a tão almejada e fulgurante iluminação elétrica, com a construção da primeira usina de luz elétrica. O cidadão Henrique Melchiors requereu o privilégio de fornecimento de luz e força motriz elétrica. Finalmente, no dia 11 de agosto de 1906, um sábado, às 18 horas, era inaugurada a usina na atual Rua Sete de Setembro. Além do acionamento, pela primeira vez, da usina de energia elétrica, que serviu a Santa Cruz pelo período de quase 30 anos, houve bailes na Aliança e na Câmara, menciona Martin, para festejar a conquista.
O jornal Kolonie, que Martin cita, detalhava a infraestrutura implantada: foram empregados na iluminação elétrica inicialmente 19.450 metros de fio de cobre, de diversas “bitolas”, pesando o total de 2.349 quilos, com 144 postes de sustentação, e 45 lâmpadas públicas. A primeira máquina geradora a vapor foi construída e instalada pelo próprio Melchiors: dois cilindros, 25 cavalos, o que permitia iluminação com cerca de 400 lâmpadas. Assim, passaram a descansar em definitivo os antigos e simpáticos lampiões a querosene, ao menos na parte central da cidade.
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