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O tempo, o vento, a Feira…

A minha mãe, a Dona Marísia, espera o ano inteiro por este momento, o da Feira do Livro de Porto Alegre. Ela mora lá, não muito distante da Praça da Alfândega, mas não gosta de ir sozinha: fica sempre na expectativa de que os filhos a levem – e transforma o passeio num baita acontecimento.

Uma semana antes já começa a se arrumar.

Muito me alegra ver seus olhinhos brilharem de orgulho quando passeia por entre as bancas, cabeça erguida, passinhos miúdos, de braço dado com o neto mais velho, o Luan, que por acaso é meu filho. De quebra, ele sempre sai “premiado”, com os títulos lá, de sua preferência. Não se trata de uma exploração de velhinha, mas a vó dele adora dar livros de presente e hoje em dia já quase nada compra para si, na Feira, mas para os netos, filhos, irmãs e tal.

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Minha mãe é assim: uma apaixonada pelos seus e pelos livros. O grau de prioridade dessa paixão talvez até esteja invertido. Desconfio que o correto seja: pelos livros e pelos seus. E, graças a Deus, eu herdei isso dela!

Nas palestras e oficinas que ministro por aí, sempre digo que minha primeira memória remete à imagem de minha mãe com um livro nas mãos, confortavelmente instalada na sua poltrona preferida, barras de chocolate ao lado… Ou, então, aquela coisa meio idílica, tipo cena de filme, dela, na cama, sob a luz do abajur, recostada na cabeceira e lendo alguma coisa. 

Meu pai, na sala, com o seu inseparável Correio do Povo…

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Minha infância foi assim, pontuada por essas lembranças. Guri de apartamento, morando no centro de São Leopoldo, e filho único na primeira década de vida, eu tinha a mãe como companhia e os livros, claro, de sua vasta biblioteca. O pai trabalhava o dia inteiro e chegava à noite, com os gibis! 

Tão grande minha curiosidade para saber o que tanto minha progenitora via naqueles objetos quadrados cheios de letrinhas que, dizem, eu aprendi a ler sozinho – ou melhor, com o auxílio dela, naturalmente, e de um dos tios, o Tio Luís, meu padrinho, irmão de meu pai, que achava bacana um guri de cinco, seis anos, já saber ler, escrever e tal. 

Eu não sabia pronunciar meu sobrenome corretamente, mas escrevia ele direitinho, para o aplauso dos parentes.

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De minha mãe para mim, de mim para o meu filho, com o reforço importante, claro, da mãe dele, a Josiane, que também ama os livros. Ele foi até a Praça da Alfândega com um objetivo bem claro em mente: O tempo e o vento, do Erico Verissimo, uma lacuna imperdoável em nossa biblioteca. Ex-lacuna! E pela cara dos livreiros, algo entre o fantástico e o surreal um adolescente em busca da saga escrita pelo pai do Luis Fernando, no século passado:

– Ah, é para trabalho de aula, né?
– Não, é para mim, mesmo.
– Mas… Por quê?
– Ué, tipo assim, porque eu quero ler. Só isso.

Eu e a vó dele, peito estufado de orgulho!

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