A Câmara Federal está a um passo de aprovar uma transformação na forma como vereadores e deputados são eleitos no Brasil. Cresce no Congresso a tendência pela aprovação do chamado distritão – modelo pelo qual se elegem apenas os candidatos mais votados, diferente do que ocorre hoje. Concebida para acabar com distorções em nosso sistema político, a regra vem sendo cada vez mais questionada.
Após ter sido rejeitado pela Câmara em 2015, o distritão passou a ganhar força entre os parlamentares este ano. Na quarta-feira, uma emenda prevendo a implantação foi aprovada por uma comissão especial junto com o texto-base da reforma política. Agora, o assunto segue para o plenário, onde precisa ser votado em dois turnos até a primeira semana de outubro para poder valer na eleição de 2018.
Um dos principais argumentos de quem defende o distritão é que acabaria com o “efeito Tiririca” – situações em que um candidato com expressiva votação acaba elegendo, por tabela, outros com votação baixa, como aconteceu com o deputado federal Tiririca (PR-SP) em 2010. Além disso, tornaria o sistema mais justo, já que seriam eleitas as pessoas escolhidas pelo maior número de pessoas.
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O movimento, porém, é visto com muito receio por analistas, já que deve enfraquecer os partidos e estimular que mais figuras populares (como atletas e artistas) migrem para a política. Segundo o cientista político Rudá Ricci, o modelo vai aumentar as negociatas por votos no Congresso, já que os parlamentares, eleitos individualmente, tendem a ser mais associados a pautas locais e regionais e menos a agendas gerais. “Os eleitos hoje mandam e desmandam sem consulta ao eleitor. Fazem leilão de seus votos. Com o distritão, radicalizaremos essa situação e criaremos uma casta política”, observa.
NA BALANÇA
VANTAGENS
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1 Sistema se tornaria mais simples para eleitor entender. Hoje, as regras da eleição proporcional não são claras para a maioria do eleitorado.
2 Evitaria distorções, como candidatos com altas votações que não se elegem e candidatos com baixas votações que se elegem.
3 Aproximaria o eleitor do votado, já que os eleitos seriam, de fato, as pessoas que foram escolhidas pela maioria dos eleitores.
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DESVANTAGENS
1Enfraqueceria os partidos políticos, que são importantes para o regime democrático.
2 Favoreceria o ingresso de figuras populares na política, já que seriam necessários muitos votos para se eleger.
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3 Estimularia a eleição de políticos mais identificados com questões locais e regionais e menos com pautas estaduais e nacionais.
PARA ENTENDER
Como é a regra atual?
Hoje, a eleição para vereadores, deputados estaduais e deputados federais é proporcional. Por esse sistema, a quantidade de votos nem sempre garante a eleição. As vagas são preenchidas de acordo com a votação obtida pelo partido ou coligação. Assim, independente da votação do candidato, a sua eleição depende de a sigla ou coligação obter um número mínimo de votos (o chamado quociente eleitoral).
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Como é a regra do distritão?
A eleição passa a ser majoritária. Pela regra, elegem-se os mais votados. Assim, se existem 17 vagas para vereador, por exemplo, serão eleitas as 17 pessoas que tiveram mais votos.
Quais serão os efeitos?
Um dos prováveis efeitos será a redução no número de candidatos. Além disso, as legendas menores terão mais dificuldades para eleger representantes. O modelo também acabará com os “puxadores de votos” (candidatos com expressiva votação, que ampliam o quociente eleitoral e “puxam” candidatos com votações). Tudo indica que a mudança também vai tornar as campanhas mais caras.
Haverá outro modelo?
Sim. O texto da reforma política prevê que, em 2022, adote-se o sistema conhecido como distrital misto, que é uma combinação entre voto proporcional e majoritário. Pelo modelo, o eleitor vota duas vezes: uma para candidatos de sua região e outra em uma lista preordenada de candidatos apresentada pelos partidos.
COMO FICARIA
A reportagem fez um exercício para verificar o que mudaria na composição da Câmara de Vereadores de Santa Cruz, na Assembleia Legislativa e na bancada gaúcha da Câmara dos Deputados se o distritão já estivesse em vigor nas eleições de 2014 e 2015:
CÂMARA DE SANTA CRUZ – Dois dos atuais vereadores, Gerson Trevisan (PSDB) e Bruno Faller (PDT), não seriam eleitos. Em seu lugar, entrariam Solange Finger (SD – que ficou como suplente, mas acabou assumindo porque um dos titulares da sigla se licenciou para ser secretário) – e Zé Abreu (PTB). Com isso, o PTB aumentaria de 6 para 7 cadeiras, o SD aumentaria de duas para 3, o PSDB passaria de duas para uma e o PDT ficaria sem representatividade no Legislativo.
ASSEMBLEIA LEGISLATIVA – Seis deputados eleitos em 2014 não entrariam: Liziane Bayer (PSB), Miki Breier (PSB), Any Ortiz (PPS), Juliano Roso (PCdoB), Bombeiro Bianchini (PPL) e João Reinei (PV). O caso de Reinei é emblemático, pois ele foi apenas o 167º candidato mais votado, com apenas 9 mil votos. No lugar deles, seriam eleitos como titulares: José Sperotto (PTB), Marcel Van Hattem (PP), Jurandir Maciel (PTB), Juliana Brizola (PDT), Juvir Costella (PMDB) e Marcos Daneluz (PT).
CÂMARA FEDERAL – Três deputados eleitos em 2014 não entrariam: José Otávio Germano (PP), Ronaldo Nogueira (PTB) e José Stedile (PSB). No lugar, entrariam como titulares: José Fogaça (PMDB), Fernando Marroni (PT) e Ronaldo Zulke (PT).
NOSSOS DEPUTADOS
Sérgio Moraes (PTB) – A favor
Para Moraes, a eleição majoritária aos parlamentos é a regra “mais justa”, já que garante que os eleitos sejam os mais votados pela população. “Hoje tem candidatos a deputado federal que ficam de fora com 150 mil votos, enquanto outros entram com 40 mil”, alegou. O petebista disse ainda que não vê com maus olhos o enfraquecimento dos partidos. “Os políticos não podem mais se esconder atrás de partidos”, alegou.
Heitor Schuch (PSB) – Contra
Para Schuch, o distritão vai estimular a “individualização e personalização” da política em detrimento de um espírito coletivo. “Vai ser cada um por si e Deus por ninguém”, argumentou. Na sua visão, a tendência é reduzir o número de candidatos, o que limitaria as opções para a população, e favorecer os políticos tradicionais e figuras populares. “Vai ser muito bom para uma figura como Romário, por exemplo. Para esses, que estão sempre na mídia, vai ser muito fácil”, observou.
Luis Carlos Heinze (PP) – A favor
Embora afirme não estar muito envolvido na discussão, Heinze diz que, em princípio, não vê problemas no distritão e deve seguir a orientação do partido, que é favorável à medida. Para ele, um dos aspectos positivos seria a redução no número de partidos, que hoje considera excessivo.