O novo Ensino Médio começa a ser implementado nas escolas públicas e privadas do País a partir do ano que vem. Com carga horária maior e diferentes possibilidades de formação, as mudanças serão iniciadas de forma gradual, com as primeiras séries do Ensino Médio. Em 2023, com as primeiras e segundas séries, completando o ciclo de implementação nas três séries em 2024.
A partir da Base Nacional Comum Curricular serão ofertadas escolhas aos alunos. Por isso, as mudanças são positivas, na opinião do titular da 6ª Coordenadoria Regional de Educação (CRE), Luiz Ricardo Pinho de Moura. “Essa escolha tem a ver com o que o aluno realmente se identifica. Todo trabalho de reestruturação está contemplado nas habilidades e competências. O novo Ensino Médio reforça a necessidade de desenvolver no nosso jovem: protagonismo, autonomia e responsabilidade.”
Na região, dez escolas-piloto já trabalham com o novo currículo desde 2018, mas a pandemia acabou atrasando o processo. Para o coordenador, os itinerários – como são chamadas as diferentes linhas de formação – foram muito bem estruturados por profissionais que estão na sala de aula e conhecem a realidade. “Também considero positiva a modernização e atualização da matriz curricular. Nossos itinerários estão estruturados em assuntos relacionados ao mundo em que vivemos”, afirma. Entre os temas ofertados pelas escolas-piloto na 6ª CRE estão Empreendedorismo, Expressão Corporal, Tecnologia, Sustentabilidade, Expressão Cultural, Cidadania e Gênero, Educação Financeira, Profissões e Saúde.
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O Sindicato do Ensino Privado no Estado (Sinepe/RS) também avalia as alterações como benéficas. Conforme a assessora pedagógica e de legislação educacional da entidade, Naime Pigatto, o estudante fará escolhas construindo seu projeto de vida e participando ativamente das aulas. “Além disso, a escola precisará rever a forma de trabalhar o conteúdo, que agora está conectado com habilidades relacionadas ao contexto em que vivemos.”
As escolas particulares de Santa Cruz do Sul estão em fase final do planejamento para atender a lei do novo Ensino Médio no começo do ano que vem. “E isso tem demandado muitas reuniões para a elaboração de uma nova Proposta Pedagógica, Regimento Escolar e Plano Curricular, formação continuada dos professores e adequações do espaço físico”, explica Naime. Ela assegura que tudo estará pronto até o final de 2021, para iniciar a oferta no próximo ano letivo.
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Para a assessora pedagógica do Sinepe/RS, o momento é de resiliência, criatividade e proatividade. As mudanças, segundo ela, são uma forma de aproximar o jovem brasileiro da realidade, com uma escola que sai do foco conteudista para trabalhar o contexto. Isso requer engajamento dos professores, estudantes e famílias que terão as possibilidades de EAD e parcerias da escola com outras instituições.
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Pesquisador acredita que reforma não terá sucesso
O professor e pesquisador no Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade de Santa Cruz do Sul (Unisc), Éder da Silva Silveira, não acredita que a reforma do Ensino Médio será uma política educacional de sucesso ou de relevância social. “A Lei 13.415/2017 centraliza como problema principal do Ensino Médio o seu currículo, sem considerar os problemas relativos à formação e valorização dos professores, à infraestrutura das escolas e à realidade das juventudes”, explica Éder, que é doutor em História pela Unisinos e mestre em Educação pela PUC-RS.
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A justificava para as mudanças é que elas seriam necessárias para aumentar o desempenho dos estudantes nas avaliações de larga escala, com currículo composto por uma parte de formação geral e uma parte diversificada. “O problema maior da reforma é que ela limita a carga horária da formação geral básica em até 1,8 mil horas, ao passo que antes do novo Ensino Médio nós tínhamos 3 mil horas para isso no Estado”, comenta.
Para o pesquisador, que atualmente realiza pós-doutorado em Educação junto ao Observatório do Ensino Médio, no Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal do Paraná, o acesso ao Ensino Médio está relacionado com a distribuição social do conhecimento e isso é um problema que a reforma atual acentua. Segundo ele, a formação básica geral perde espaço no novo currículo, e disciplinas como Física, Biologia, Educação Física, Sociologia e Química são reduzidas a um único período semanal de aula no primeiro e segundo anos.
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Durante a década de 1970, já houve uma tentativa de reforma e se experimentou um currículo com ênfases formáticas. Mas, conforme o professor, essa experiência aumentou a distorção idade/série e gerou uma elitização do acesso ao ensino superior. Para Éder os beneficiados pela mudança seriam empresas, institutos ou organizações sociais do setor privado, mas não as escolas públicas.
Silveira aponta, ainda, que as escolas não estão prontas para as mudanças e, mesmo com bons professores, os gestores das escolas e as coordenadorias regionais quase não têm autonomia nesse processo. “A reforma é uma política de currículo com profundos descompassos em relação às políticas de formação e valorização de professores e de financiamento da educação pública.”
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Alterações
O novo Ensino Médio traz uma nova organização curricular e a ampliação da carga horária mínima das atuais 800 horas para mil horas anuais. O Ministério da Educação preparou um Programa de Fomento à Implementação dos Itinerários Formativos, para dar apoio técnico e financeiro às escolas.
O modelo poderá ofertar até cinco itinerários formativos, que possibilitarão ao estudante escolher em qual área quer aprofundar seus conhecimentos ao longo do Ensino Médio. Eles podem variar conforme o contexto no qual a escola está inserida e de acordo com as necessidades e interesses dos estudantes. As redes de ensino terão autonomia para definir os itinerários ofertados. Os itinerários são: Linguagens e suas tecnologias, Matemática e suas tecnologias, Ciências da natureza e suas tecnologias, Ciências humanas e sociais aplicadas e formação técnica e profissional.
De acordo com o professor Éder Silveira, um dos pontos negativos é a fragilidade do Ensino Médio como formação básica, sem aprofundamento dos conhecimentos científicos e com currículo fragmentado. “Como aspecto positivo, percebo que a reforma mobiliza-nos novamente a pensar sobre qual projeto temos para a sociedade e qual Ensino Médio interessa para este fim e para as juventudes.”
Cpers é contra
Para a diretora do 18º Núcleo do Cpers/Sindicato, Cira Kaufmann, o novo Ensino Médio empobrece a proposta de uma educação básica para todos. “Isso porque a maior mudança está na flexibilização do currículo: 60% da grade curricular será composta por disciplinas obrigatórias e 40% será optativa. Ou seja, no meio do curso, o estudante terá que escolher entre cinco itinerários para se especializar”, disse. Para ela, os alunos de escolas públicas seriam prejudicados, pois terão menos opções à disposição.
Conforme Cira, as escolas privadas, que têm mais recursos, estão ofertando para seus estudantes todos os itinerários, o que torna a diferença entre o ensino público e o privado ainda maior. “Outra preocupação é que esse novo Ensino Médio poderá ser ofertado parcialmente através de educação a distância. Temos entendimento de que a EAD também contribui para reduzir a qualidade da educação.”
Vindo do período da pandemia, que obrigou escolas, professores e alunos a migrarem do ensino presencial para o remoto, a prioridade seria manter a permanência dos estudantes na escola. Segundo a diretora, será um desafio ainda maior neste contexto implementar o novo Ensino Médio, já que a pandemia também impôs sobrecarga de trabalho aos educadores.
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