Livre do compromisso escolar de fazer a lição de casa, a minha mãe me liberava para visitar meus amigos e colegas de aula Miguel e Jerônimo Giehl, que moravam no início da Linha Bernardino, logo depois do moinho da família Rademann, que aproveitava as águas do arroio para movimentar a enorme roda d’água. Para chegar a sua moradia, precisava atravessar uma ponte de arame sobre o arroio Plumbs.
Gostava muito dos pais dos meus amigos, que eram filhos únicos. Pessoas simples e bondosas. Nada melhor do que aquela fatia de pão de milho recheada com uma camada de melado fabricado pela família e um gostoso kesschmier. Para acompanhar, não poderia faltar um pedaço generoso de linguiça ou kriba (torresmo). Essa mistura do doce com o salgado é um costume importante na alimentação alemã.
Nem todas as famílias tinham uma prensa de cana-de-açúcar em sua propriedade. A família Giehl era especialista na fabricação de melado.
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A máquina de moer a cana estava instalada perto de um grande galpão. Precisava de muito espaço ao seu redor. A prensa era movida pela força de uma junta de animais da propriedade, que poderia ser de bois ou cavalos. Os equinos eram os preferidos, por serem mais rápidos. Eram atrelados a um pau de madeira que se sobressaía da máquina e, com sua força, movimentavam as engrenagens da prensa que extraía o caldo de cana.
Para mim se tornava prazeroso auxiliar meus colegas nessas lidas. Os meus amigos ajudavam a alcançar a cana, que já vinha cortada em cunha para facilitar a introdução no prensador. A garapa corria para um balde, que depois de coalhado em um pano, era despejado num enorme tacho. Trabalho para os adultos.
O tacho de cobre e bronze era encaixado sob uma enorme argola de ferro e sustentado por um tripé, que ficava a uma razoável altura do chão, a fim de que se pudesse colocar fogo embaixo. Esse processo era complicado.
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Uma pessoa deveria ficar mexendo a garapa de maneira constante para que não queimasse no fundo da panela. A pá de madeira usada era parecida com um remo de barco. Imaginem que tarefa difícil ter de aguentar aquele calor do fogo.
À medida que a garapa fervia, formava uma crosta de espuma, removida com uma grande espumadeira. Esse processo do preparo do melado levava muitas horas de fervura com fogo brando.
Depois de pronto, era retirado do fogo e as mulheres batiam o melado quente até esfriar. Quanto mais batido, mais claro ficava o produto.
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A família Giehl era famosa na localidade pela qualidade do melado que fabricava. Para que fosse considerado um produto de primeira, não poderia ser açucarado e sua cor deveria ser amarela clara. Precisava ser viscoso e fácil de passar no pão. Era um produto que não podia faltar na mesa dos descendentes de alemães da região.
No fim, depois do melado pronto ser acondicionado em diversas latas grandes, cada criança já levava sua colher, pois o melhor de tudo, além de parar de vez em quando para tomar uma garapa, era rapar o tacho. Que delícia!
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