Reza a lenda que o Brasil é o país do futuro. E brasileiros andam dados a acreditar em lendas. O Brasil definitivamente não é o país do futuro. Antes, tem mostrado ser o país do passado. E é passadista, tem o passado pela frente, em especial na política. Somos, simplesmente, reféns do que passou. E o que passou, o espectro do passado, permanece porque nós o queremos. Logo, o Brasil é o país do passado porque nós, enquanto sociedade, insistimos em mantê-lo assim. Essa é a nossa marca. O Brasil é refém de nossa teimosia de escolha. E é graças a essa teimosia coletiva que permanece onde permanece.
Tome-se o caso do depoimento de Lula para o juiz Sérgio Moro. Tudo ali é remoer o passado com olhar fixo em 2018, esse futuro que, no entanto, ameaça ser puro passado, o passado que nós próprios, enquanto coletividade, forjamos. Lula é a solução para o espectro do passado? É como convocar o fantasma a resolver a questão do fantasma.
Lula, preso ao passado, já não tem qualquer laivo de solução. Uma vez que vem do passado, até é, isto sim, o problema, parte do problema. Porque é a persistência do problema. Mas muitos dentre nós seguem em procissão pelas ruas implorando pelo passado, porque se negariam, ao se olhar no espelho, que o verdadeiro problema está ali, diante deles: a sua miopia. Na teimosia em não admitir que se falhou, que erros grotescos foram cometidos, a reação mais conivente é persistir no erro.
Daí a constatação. Se for culpado, Lula não é o único. Culpados, óbvio, são os que o colocaram lá, são os que o ovacionam e, mais ainda, o querem de volta. Até eu sou culpado, tenho de admitir. Votei em Lula em 2002. Engajei-me no entusiasmo coletivo por uma promessa. Constrangido, dou-me conta do terrível equívoco. Lula não pensou em nada que não fosse Lula e seu projeto de poder. Incorrer no voto do passado? Não nesta vida.
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Ano que vem teremos eleição. Todo o passado estará uma vez mais diante de nós. Ele (o passado) não larga o osso (nós), e o curioso é que o osso (nós, os mordidos) parece que não larga dele. O que tem de gente atrás de Lula (e Sarney, Collor, Aécio, FHC, Dilma) dizendo: “O senhor é meu cão pastor, logo me morderá!” Quando Lula brada que é melhor prendê-lo já, pois em 2018 pode vir a ser ele a “mandar prender”, o recado está dado. O que difere, nessa bravata, em relação à fala de um ditador ou de um Bolsonaro? Nada.
Aliás, um detalhe: brasileiro não elege presidente; elege vice. Quando venceu Tancredo, assumiu Sarney. Elegemos Collor; assumiu Itamar. Elegemos Dilma; assumiu Temer. FHC e Lula são exceções à regra mas escaparam por um triz, sobreviventes de seus governos à deriva. Portanto, cumpre prestar atenção. Se Lula diz que é candidato em 2018, repare em quem será candidato a vice. Talvez seja este o eleito. Ali pode estar a silhueta do “fantasma”, na roda viva do passado. Para cada candidato, a tarefa é reparar no vice.
E lembre-se. Exercer a cidadania plena por vezes é dizer: não! Ficar de cabeça erguida, não de joelhos. Pois enquanto a maioria das nações se esforça para dar a volta por cima, o Brasil até nisso é diferente: persiste em dar a volta por baixo. A cada novo ciclo, porém, um pouco mais fundo.
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