O professor Arno, nosso pai, foi apicultor. A mãe, Natália, e todos nós também. Antes, os avós maternos e paternos o foram. Carlos Alberto Schneider, pai de Natália, ao final das refeições, dava um jeito de levar seu pratinho de sobremesa para junto do apiário, instalado nos fundos do terreno onde residiam. Moradia multifuncional e de todos. Tanto dos que necessitavam de registro cartorial, pois Carlos Alberto era escrivão, como dos que chegavam de longe, entre eles padres, freiras, parentes, amigos, desconhecidos e adoentados que vinham ao centro de Cerro Largo buscar atendimento médico ou simplesmente fazer uma visita. Todos eram bem-vindos. Nunca faltou a mão de dona Maria Flach, mãe de Natália, no preparo de uma fornada de pães, cucas e batatas assadas. Você já experimentou batata com mel?
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Já em Santa Cruz do Sul, seguimos com as abelhas. Aos poucos, o terreno onde morávamos, à Rua Flores da Cunha, ficou pequeno para as 40 colmeias. Destas para centenas foi um passo que exigiu a instalação de apiários em diferentes lugares. Tudo começou nas terras do casal Jorge e Camila Frohlich e de João Manoel Ávila Raimundo, propriedades situadas no Capão da Cruz. O acerto era por porcentagem. Dez por cento da produção de mel ficava para o proprietário da terra. Foi assim que conheci a Vera, minha esposa, filha do Sr. Jorge e dona Camila. Ela nos trazia, por ocasião dos trabalhos nos apiários, alguma fruta ou um lanche, quando não um vinho de laranja, uma raridade.
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Ao aumento do número de colmeias se fez necessário maior conhecimento. Assim, em 1970, o apicultor Arno foi à Argentina participar de um congresso sobre apicultura. Voltou entusiasmado, a ponto de substituir as colmeias do tipo Shenk pelas Langstroth, conhecidas como “americanas”. Não deu muito certo. Pouco tardou para que se retornasse ao sistema alemão, mais apropriado para as mudanças de estação.
Nesse meio-tempo, o professor Arno, apaixonado pelas abelhas, concebeu um projeto. Pretendia expandir a apicultura nas escolas, especialmente as rurais, onde os estudantes desenvolvessem o conhecimento apícola e sua importância na polinização. Com o que ele aproveitava toda oportunidade para, a seu modo e tempo, incentivar alunos e quem mais se interessasse pela apicultura.
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Na virada do milênio, a família já trabalhava com mais de 500 colmeias, distribuídas daqui às margens do Camaquã, rio que a Vera quer revisitar no que melhorar do câncer que insiste em acometê-la. Lá, ainda remanescem antigos angicos que prodigalizam flores, plenas em néctar. Néctar que nos permite um brinde em homenagem a todos que vibram com as abelhas de todos os lugares. Como são leves as asas daqueles que visitam flores!
Também foi em 1970 que uma equipe liderada pela arqueóloga Niède Guidon iniciou suas pesquisas na Serra da Capivara, no sudeste do Piauí. Era preciso encontrar um jeito de preservar aqueles sítios arqueológicos. Assim, disponibilizando cursos de formação, logística, cooperação e apoio financeiro, Niède Guidon desenvolveu um projeto de apicultura que contribuísse na preservação da Unidade de Conservação. Conseguiu que muitos dos que destruíam o bioma entendessem que para ter mel e, assim, ganho financeiro, era preciso manter a vegetação em pé.
E se assumíssemos um programa de desenvolvimento de meliponíneos no entorno do Cinturão Verde? O Parque Nacional Serra da Capivara abriga criaturas e belezas naturais da caatinga, inscrições rupestres, relevos impressionantes e transmite paz. Nosso Cinturão guarda a biodiversidade da Mata Atlântica, abriga uma paleotoca, garante estabilidade geotécnica e saúde mental.
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