Imagine que a sua vida se passa dentro de um grande enredo de ficção, uma tragicomédia em que todos ao redor mentem constantemente e nada – nem mesmo a paisagem cotidiana – é real. E que não, você não perdeu as suas faculdades mentais. Não é muito difícil pressupor algo do tipo hoje em dia, com reality shows de toda espécie nas mídias e experiências cada vez mais extravagantes de simulação da realidade.
Mas em 1998, quando O Show de Truman estreou nos cinemas, essas ideias ainda não estavam na ordem do dia. Jim Carrey é Truman Burbank, alguém que nasceu e cresceu em um reality exibido 24 horas na televisão. O nascimento foi transmitido ao vivo, todos os os familiares e amigos são atores contratados. As pessoas que ele vê e cumprimenta diariamente são figurantes; e a pacata Seahaven, onde vive desde sempre, não passa de uma cidade cenográfica – uma “bolha”, literalmente.
E todos sabem disso, menos, é claro, Truman (“true man”, ou “homem de verdade”). Ele acredita que aquela é a sua vida, a única realidade (nunca conheceu outra), e essa é a graça do programa. O público assiste e se pergunta: quando ele vai acordar? Quando vai se dar conta? Ao mesmo tempo, produção, elenco e demais envolvidos vigiam cada passo de Truman – um cada vez mais insatisfeito Truman, entediado com a vida insossa de corretor de seguros em uma cidade insípida, que sonha em conhecer o mundo além de Seahaven.
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Sonho difícil de realizar, porque algo sempre impede que ele saia da cidade, como barreiras de trânsito que não permitem passagem e ônibus que jamais funcionam. A única agência de turismo de Seahaven nunca tem viagens disponíveis. Tudo conspira para que o inquieto Truman renda-se à falsidade generalizada e à falta de perspectivas, torne-se um prisioneiro.
Revendo O Show de Truman quase 25 anos após o lançamento, mais do que considerações sobre a “sociedade do espetáculo”, é fácil perceber a atualidade do conflito: entre o indivíduo e um ambiente forjado que contribui para sufocar aspirações, confiná-lo a alguns metros quadrados de mundo e reduzi-lo a um fantoche sorridente. Com um preço de etiqueta abaixo do seu valor. Até a bolha estourar.
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