Os guris do interior já ajudavam seus pais na lavoura. Se não estivessem na escola, os menores eram levados à roça para ajudar em trabalhos leves, até para evitar que ficassem sozinhos em casa. Nada difícil, mas que trouxe um legado excepcional para o futuro. Essa piazada aprendeu que trabalhar nunca fez mal a ninguém.
Não havia guri que não tivesse uma funda pendurada no pescoço. Entre os amigos, sempre tinha aquele que se sobressaía na sua confecção. Era o caso do Fernandão. A primeira tarefa era procurar uma forquilha com madeira resistente. A borracha mais comum usada pelo Fernandão era de câmara de bicicleta ou de automóvel, mais rara. Era difícil ter alguém motorizado na vila. O pedaço de couro se conseguia com o sapateiro.
Naquele tempo, as mulheres costuravam em casa. Aprendiam o ofício com as mais velhas. Essa habilidade era repassada na família. Era difícil uma família não ter uma máquina de costura Singer em alguma sala, de preferência perto de uma janela. Precisava-se claridade para enfiar a linha na agulha. Além dos remendos nas nossas roupas, feitos em casa, a mãe também confeccionava as sacolas. Uma para levar as pedras usadas no bodoque, que procurávamos no meio do cascalho do Plums e outra, maior, para colocar a caça. Esses apetrechos eram indispensáveis. Não havia guri que não os carregava consigo.
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No longo caminho a pé até a escola, poderia aparecer um pássaro maior ou mesmo uma pomba rola, um sabiá. Nem sempre se acertava no pássaro, mas a real intenção era matá-lo para comê-lo em casa, imposição da mãe. Matou, comeu. Essa era a regra.
Hoje confesso que jamais matei um bichinho. A dona Elzira, minha mãe, nunca permitiu. Na onda dos amigos, também arremessava as pedras contra os passarinhos. Na hora H, mirava um pouco para o lado a fim de não acertá-lo. Tinha que aguentar a gozação dos colegas.
Outro brinquedo indispensável era o jogo de bolitas ou clicas. Gostava de jogar na frente da casa do Divaro. O chão era parelho. Fazíamos isso todo o dia. Jogávamos “às brinca”, já que ambos não jogávamos lá essas coisas e os exímios jogadores nos “pelavam”, expressão que se usava quando se perdia no jogo.
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Toda vez que se jogava, aparecia o vizinho, um guri franzino, magrinho, inibido, que insistia em participar da brincadeira. Seu pedido era negado.
– Vai te criar, fedelho. Te manda daí! Vai plantar batata, guri!
Afinal, quem era esse guri? Nada mais, nada menos que o ex-prefeito do Vale do Sol, Clécio Halmenschlager!
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Quem sabe combinamos uma partida de bolita para hoje? Ora, ora, um futuro prefeito foi barrado em um simples jogo de clica! Que coisa!
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