Desde 2015, não se via um índice de inflação acima de 10%. Para quem viveu a época da hiperinflação, nas décadas de 1980 e 1990, isso pode não parecer muito. Mas, não é um número trivial. A inflação alta desorganiza toda a economia e, principalmente, empobrece a população. No dia a dia, a inflação alta afeta os investimentos, torna as tarifas mais caras, joga o valor do combustível nas alturas, aumenta os preços nos supermercados etc. Se servir de consolo, a inflação está subindo no mundo todo, tendo como fator comum para todos os países “a crise dos contêineres”, que causou interrupções nas entregas de mercadorias, aumentando o preço para o consumidor. Mas há outras causas, como a gigantesca quantidade de dinheiro injetada nas economias pelos respectivos bancos centrais, para enfrentar as consequências da paralisação de atividades, em 2020, ano de início da pandemia de coronavírus.
Uma das principais reclamações dos brasileiros é, justamente, com relação aos índices oficiais da inflação. Como a inflação do ano de 2021 foi de 10,06% se, no ano passado, alguns itens tiveram aumentos muito acima desse índice, conforme apurado pelo IBGE? O etanol, por exemplo, aumentou 62,23%, e ainda tem o café moído (50,24%), a mandioca (48,08%), o açúcar refinado (47,67%), a gasolina (47,49%), o óleo diesel (46,04%), o GNV (38,72%), o gás de cozinha (36,99%), a carne de gado (30,91%), o frango (29,85%) e opão de forma (16,84%).
A resposta para essa diferença entre o índice oficial e a inflação real que cada pessoa ou cada família sente no bolso é muito simples, embora questionável. O Índice de Preços ao Consumidor Ampliado (IPCA) avalia a variação de preços para as famílias de 1 até 40 salários mínimos, levando em conta o preço de 377 itens, divididos em nove grupos, com cada grupo tendo um peso no cálculo do índice geral. A forte alta de alguns produtos, principalmente de alimentação, não se manifestou no índice oficial porque houve quedas em outros itens da cesta que compõem o IPCA.
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O ponto importante é que esse encarecimento é percebido de forma diferente pelas famílias, dependendo da proporção do orçamento que cada uma destina para comprar diferentes produtos, com maior ou menor aumento. O problema é que os itens que sofreram altas exorbitantes são justamente os de alimentação, que representam os maiores gastos para as famílias mais pobres. Essas famílias usam por volta de 30% dos ganhos para alimentos.
O mercado de trabalho brasileiro já enfrentava tendência de aumento da informalidade e de vagas temporárias, com a perda de qualidade do emprego. Além disso, a combinação de desemprego elevado, atividade econômica morna e disparada da inflação, tornaram piores as condições para as negociações de reajuste salarial em 2021. No ano passado, os trabalhadores completaram três anos sem ganho real; alguns segmentos de funcionários públicos estão há cinco anos sem reajuste. A situação é pior ainda para os trabalhadores informais, que não tem salário fixo. Uma faxineira, por exemplo, que já há algum tempo cobrava um valor x pela diária, atualmente, mesmo com o aumento de preço dos gêneros de primeira necessidade não consegue repassar esse custo, quando não é obrigada a reduzir o valor do serviço sob pena de perder o cliente.
Cruel para a população em geral, mas mais ainda para os trabalhadores e desempregados, a inflação tem sido grande colaboradora do Tesouro Nacional e dos governos estaduais. Mesmo com os negócios em marcha lenta, o aumento de preços tem proporcionado o crescimento da arrecadação de impostos, numa demonstração de que a inflação dá lucro para os governos.
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O ano de 2022 começou com a inflação ainda em alta. A perspectiva é de que os preços continuem subindo, tendo o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, alertado de que o pior momento da inflação será entre abril e maio, quando haveria uma queda mais rápida. De qualquer maneira, conforme avaliação do economista Guilherme Moreira, da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), o cenário é preocupante. Ele observa que, em três anos, incluindo o de 2022, só a inflação oficial deve representar perda de 21% do poder de compra dos brasileiros.
Por vivermos no automático, simplesmente recebendo o salário ou a renda e pagando contas, esquecemos ou não nos preocupamos em rever nossos gastos. Não se trata de só pesquisar preços, anotar os valores gastos, mas de analisar como nos comportamos ao fazer as compras. É isso que pretende a educação financeira: ir além das finanças pessoais que se restringem a questões técnicas e começar a observar o comportamento. O que pode ser feito imediatamente para aumentar o poder de compra é examinar cada item dos gastos, identificando a inflação invisível que ele carrega e o que é desperdiçado em excessos de água, luz, mercado, roupas, sapatos etc. Uma das experiências propostas é passar um ano inteiro sem comprar ou gastar em nada que não seja essencial, como roupas, sapatos, bolsas. Muitas pessoas já fizeram isso e, no fim de um ano, constataram que só com o que tinham em casa – alguns itens ainda com a etiqueta de compra – conseguiram sobreviver tranquilamente.
Todo mundo gosta de comprar e pode cometer algum excesso, inclusive quem lida com educação financeira. Afinal, somos humanos e o ato de comprar pode ser acionado mais por motivos emocionais do que racionais. Alguns fazem da compra uma verdadeira terapia para se sentirem bem. Mas, se serviu para alguma coisa, a pandemia de coronavírus acendeu uma luz amarela. A maioria dos consumidores brasileiros – 88,4% – pretende comprar menos por impulso, pensando mais no que vai gastar. Aquela história de gastar por gastar parece que, pelo menos por enquanto, ficou no passado.
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