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O bem e o mal

Na edição último do fim de semana (página 23), a Gazeta do Sul trouxe a história do homem que, fantasiado como a morte, distribui mensagens positivas por Santa Cruz do Sul. A figura esquelética de manto negro e capuz e empunhando uma foice é facilmente reconhecida como a personificação daquilo que não queremos, mas que nos espera a todos em algum momento. 

Não sei quantas pessoas se incomodaram, ou mesmo se deram conta, de que ele escolheu justamente este personagem para entregar seus textos, poesias e frases. Por que optar pela morte para falar de positividade? Foi uma escolha aleatória ou encerra algum significado? Só o próprio “mensageiro da paz”, como é chamado, pode responder. Mas quando vi o texto, logo imaginei que poderia se tratar de uma tentativa de estabelecer alguma dualidade ou mesmo contradição entre o bem e o mal.

Penso que cada pessoa traz esses dois lados dentro de si. Culturalmente, influenciados em especial pelas religiões, procuramos posicionar o mal fora de nós, como algo que não nos pertence, que deve ser afastado e mesmo punido. Queremos nos apresentar como bons ou como quem, pelo menos, tenta ser. Mas portamos os dois lados, eles muito bem podem ser os resultados das várias forças que nos animam. Ver o mal além de nós, ou até mesmo no “além”, nunca nos ajudou a compreender o mundo; só criou motivos para nos punirmos ou punirmos os outros. Pelo menos, é como vejo.

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Em algum momento, ao longo de nossa civilização, a ideia de morte como um fato natural foi deixada de lado em proveito da noção, sem dúvida muito mais atraente, de que a vida é o mais importante e que tudo deve ser feito para preservá-la. Quer dizer, ganhamos uma boa noção de bem e mal. Mas com isso também vieram coisas ruins. O mal como algo externo a cada indivíduo pode estar na raiz de coisas que abominamos modernamente, como as várias formas de preconceito e de julgamento público. Não vejo tradução melhor desses comportamentos do que apontar o que deve ser repelido como aquilo do qual não fazemos parte. Convencidos disso, basta encontrar pessoas ou situações em que possamos colar o rótulo do que achamos não ser adequado.

Essas reflexões não significam que afasto a ideia de nos tornarmos melhores. Apenas acho sem sentido nossas tentativas de sermos bons a partir de comportamentos que privilegiam só um lado da nossa personalidade – por coincidência, o mais agradável. Ou de maneira mais simples, apenas nossas “boas intenções”. É preciso reconhecer e aceitar tudo, o que é bom e o que é ruim. Se é para mudar, passar a fazer o bem, o mais importante é compreendermos que também somos – todos – um bocado maus.

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