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ROSE ROMERO

Nós, os que preferem a paz

Pertenço ao grupo dos atrapalhados. O que significa perder coisas, trocar datas e endereços e pessoas, sair com o carrinho alheio pelo supermercado e, claro, dizer o que não deve na hora errada. Durante anos, tive um chefe que gostava de me passar trotes. Escolhia algum funcionário que deveria me ligar se passando por leitor. Geralmente reclamando de alguma notícia que eu havia deixado publicar. 

Certa feita, atendo o telefone e do outro lado da linha uma voz feminina e um tanto abafada me diz: “É a pessoa que escreve o Panorama? Aqui é a Delícia”. Imediatamente pensei: é a Célia, a mando do chefe, que liga para brincar comigo. E respondo:

– Delícia? Hummmmmmm. Hahahaha. Nessa eu não caio, pode inventar um nome melhor.
E o silêncio no outro lado da linha me fez gelar. Era realmente uma senhora chamada Delícia. E queria falar com a editora. Senti um repentino desejo de desaparecer e deixar o telefone flutuando no ar. Pedi desculpas várias vezes. Mas não havia o que fazer. Meu excesso de espontaneidade, mais uma vez, me colocara em uma saia justa.

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Hoje, lembrando minhas confusões, elas soam engraçadas. A idade tende a suavizar essas coisas. Nós, os maduros, aprendemos a ter menos pressa, inclusive na hora de falar. É uma das vantagens do tempo. Tempo de vida e tempo disponível, o que pode ser um luxo. 

Semana passada, a caminho do aeroporto, agradecemos pelo percurso ser breve. Mal subimos no táxi na Rodoviária de Porto Alegre e o motorista, um senhor de uns 50 anos, português irrepreensível e discurso pra lá de estruturado, puxou conversa. Iniciou aparentemente doce e, à medida que avançávamos pela BR-290, foi destilando ódio.

Maurício no banco da frente adotou o tom conciliatório-enigmático: “pois é”, “bah”, “então”… e assim foi. (Os homens, quando querem, são hábeis em falar e dizer absolutamente nada.) Eu no banco de trás, muda. Não havia complexos seres humanos e suas consequências na análise do nosso taxista. Apenas bons – que coincidentemente pensavam como ele – e maus. Que, por sua vez, eram os responsáveis por tudo que existe de ruim no Brasil. E claramente identificados com um dos candidatos à presidência. Sério? 

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Saímos meio cambaleantes do táxi e respiramos de alívio com os pés no Salgado Filho. Fossem outros tempos eu, que acredito na importância da política e confio mais na dúvida do que na convicção, teria tentado bater papo. Mas de longe farejei a encrenca que seria questionar as ideias de alguém tão enfático, tão cheio de certezas. Uma pena. O exercício da política passa justamente pelo enfrentamento civilizado das diferenças. Atualmente, isso anda impossível. 

Às vésperas de uma eleição explosiva, ouvir mais do que falar pode ser a distância entre uma amizade de décadas e uma briga irreversível. Sei que do ponto de vista civilizatório, debater educa mais que silenciar. Mas fazer o quê? Sempre fomos um povo ignorante e belicoso e eu só descobri isso agora?

Para muitos de nós, inclusive uma falante animada como eu, a saída tem sido fazer cara de paisagem e ficar quieto. Porque ter ódio do candidato A ou do B, propagar todo tipo de agressão, compartilhar “Fulano fdp” na rede social não vai resolver nossos problemas, só nos afastar. Tratar a política como algo pessoal e intestino não nos leva a lugar algum. Só ao atraso. Um lugar de onde teimamos não sair.

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