A onipresença de cães e gatos, situação modernamente resumida pelo termo “pet”, é um fenômeno recente. Costumo dizer que nasci “no interior do interior”, na colônia, uma localidade do Vale do Taquari, de colonização alemã. Nossa casa ficava a dois quilômetros do perímetro urbano. À exceção de feijão e arroz, todos os demais ingredientes da alimentação eram produzidos pela minha família ou por vizinhos. Naquela época, início da década de 60, praticávamos escambo, através da troca de víveres de acordo com a necessidade de cada um.
No pátio da nossa casa – com muitas árvores frutíferas – circulavam gatos, cachorros, passarinhos de várias espécies – inclusive papagaios e caturritas –, além de coelhos, vacas e bois. Cobras também eram vistas com frequência, principalmente no verão. Os bichos mais chegados – gatos e cachorros – respeitavam o limite de casa: nenhum deles ousava entrar. Outra característica era a alimentação da bicharada, toda feita com restos de comida. A ração era restrita ao gado, especialmente devido ao custo.
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A recente pandemia turbinou o comércio de animais domésticos. Depois de dois anos, o fim desse período coincidiu com a proliferação de animais abandonados. E isso não aconteceu apenas nos grandes centros urbanos. Para combater a solidão e evitar a depressão, muita gente adotou um mascote no auge da crise sanitária, mas na hora das férias ou das viagens, quando o confinamento terminou, o custo de uma creche ou de um hotelzinho aumentou o contingente de animais órfãos.
O flagelo das enchentes – que no Vale do Taquari teve três ocorrências graves, a partir de setembro e novembro de 2023 e agora, em maio – fez com que até hoje, seis meses depois, ainda tenhamos centenas de animais domésticos em abrigos ou na casa de pessoas abnegadas pela causa dos pets. Muita gente aproveitou a tragédia das cheias para se livrar de seu cachorrinho, outrora de estimação.
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Minha filha, que não resiste a um animal abandonado, adotou Café, um simpático vira-latas preto, flagelado de Alvorada, na região metropolitana. O pobrezinho chegou com a pata quebrada, o que obrigou a um gasto significativo para a realização de uma cirurgia de colocação de uma placa. Apesar da tentativa, o bonitão continua mancando, resquício do tempo que vagou pelas ruas agravando a lesão.
As férias de verão batem à porta. Lembro da entrevista de um patrulheiro da Polícia Rodoviária Federal. Revelou que não é raro flagrar motoristas que estacionam no acostamento da BR-290, a nossa freeway, e abandonam seus bichinhos, sem mais nem menos, no caminho da praia É muito ódio no coração para agir assim, mas o ser humano é realmente imprevisível.
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