Dentro de uma semana será Natal. Mais um Natal em Santa Cruz do Sul. O título desta coluna é o mesmo de um conto do escritor Aldyr Garcia Schlee, publicado na antologia Nem te conto III, em 2014. No enredo, rememora passagem real, a visita que fez a Santa Cruz aos 9 anos, vindo de Jaguarão, na véspera do Natal de 1943. Infelizmente não virá mais à cidade. Schlee faleceu no dia 15 de novembro, em Pelotas, onde residia, aos 83 anos.
Ele não era santa-cruzense. Mas adorava Santa Cruz. Não deixou de salientar quanto as viagens na infância seguiam em seu imaginário. É o que faz no conto mencionado, também inserido em seu livro Memórias de o que já não será. A simpatia era marca de Aldyr. No olhar e no sorriso transparecia a ternura do menino que em 1943 veio a Santa Cruz “numa viagem inesquecível”, palavras suas. Primeiro, de avião até Porto Alegre; depois, de trem até Ramiz Galvão – e, por fim, num carro-de-linha Ford Modelo T “que varou a escuridão e o silêncio da noite sobre trilhos iluminados de vertiginosa magia, como para me deixar gloriosamente diante da árvore em torno da qual se cantava o Tannenbaum”.
O pinheirinho ficava na casa de sua avó Anna, na Avenida Independência, nº 100 – e ao lado da fábrica de balas. No conto, narra as peripécias que fizeram com que um dos ramos da família viesse se instalar em Santa Cruz. Ainda que tenha nascido em Jaguarão, na fronteira com o Uruguai, Santa Cruz estava para sempre no seu coração. Era para onde viajava na véspera do Natal.
Em 2012 Aldyr descobrira que tinha câncer de pele. No ano seguinte, foi patrono da Feira do Livro de Santa Cruz. Nos dias de sua agenda, ficou doente e não pôde vir. Mas viera em momentos anteriores, e sempre dava jeito de visitar a casa da Independência, nº 100. Mantínhamo-nos em contato regular ao longo dos anos. E seguia escrevendo. Em outubro lançou o livro O outro lado, que autografou no dia 3 de novembro na Feira do Livro de Porto Alegre. Embora eu estivesse na Capital, não consegui ir à atividade. Poucos dias depois, na véspera do último fim de semana do evento, veio a notícia de sua morte.
Pelas vias do destino, em 3 de dezembro, na livraria Nova Roma, fui informado: “Entrou livro do Schlee. Autografado.” Conferi de qual se tratava. Justamente de O outro lado. Exatamente um mês depois daquele lançamento, um exemplar autografado na ocasião (mas para outra pessoa) chegava a minhas mãos. E assim veio parar em Santa Cruz, a terra de que ele tanto gostava.
E que logo vai festejar mais um Natal. Ainda se canta o Tannenbaum? “O Tannenbaum, o Tannenbaum / dein Kleid will mich was lehren: / Die Hoffnung und Beständigkeit / gibt Trost und Kraft zu jeder Zeit”, entoava-se no século passado, e pode-se cantar ainda agora. “Ó Árvore Natalina, / Teu vestido quer me ensinar algo; / A esperança e a possibilidade, / há força e coragem para cada tempo”. Força e coragem. Mais do que nunca.
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