Os ministros Alexandre de Moraes e Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), votaram nesta terça-feira, 18, em Brasília, por abrir ação penal e tornar réus 100 denunciados pelos atos golpistas de 8 de janeiro deste ano, quando os prédios do Congresso Nacional, do Supremo e do Palácio do Planalto foram invadidos e depredados por vândalos.
Os primeiros 100 julgamentos relativos aos atos antidemocráticos tiveram início exatos 100 dias depois da quebradeira na Praça dos Três Poderes. Assim, as análises começaram à meia-noite desta terça-feira, 18, e estão previstas para durar até as 23h59 da próxima terça-feira, 24, no plenário virtual, modalidade em que os ministros depositam votos eletronicamente, sem deliberação presencial.
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Os inquéritos – de número 4921 e 4922 – são públicos, portanto podem ser acompanhados por qualquer pessoa, no portal do Supremo, sem necessidade de nenhum tipo de cadastro. A ministra Rosa Weber, presidente do STF, já marcou outra sessão virtual para começar na próxima terça-feira, 25, com mais uma leva de denunciados. Desse modo, a previsão é de que todas as denúncias sejam apreciadas dentro de três meses.
Ao todo, a PGR apresentou 1.390 denúncias até o momento, todas focadas nos executores e nas pessoas acusadas de incitar os atos. Segundo o STF, está sendo dada prioridade de julgamento a pessoas que continuam presas em decorrência dos atos golpistas. No momento, 86 mulheres e 208 homens seguem encarcerados no sistema penitenciário do Distrito Federal.
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Voto
Até o momento, o ministro Dias Toffoli foi o primeiro a acompanhar integralmente o relator, sem apresentar voto escrito em todos os casos, enquanto os demais ministros ainda não votaram. A expectativa no Supremo é de que as denúncias sejam todas aceitas, visto que as condutas tiveram caráter flagrantemente ilegal.
Em geral, Moraes apresentou dois tipos de voto, um contra 50 pessoas no inquérito contra os executores dos atos violentos, bem como outro contra mais 50 pessoas na investigação contra quem incitou a violência. Em ambos os textos, contudo, o ministro relator usou das mesmas palavras para frisar o caráter criminoso de quem atenta contra a democracia.
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Para o ministro, “são inconstitucionais as condutas e manifestações que tenham a nítida finalidade de controlar ou mesmo aniquilar a força do pensamento crítico, indispensável ao regime democrático, quanto aquelas que pretendam destruí-lo, juntamente com suas instituições republicanas, pregando a violência, o arbítrio, o desrespeito à separação de Poderes e aos direitos fundamentais, em suma, pleiteando a tirania, o arbítrio, a violência e a quebra dos princípios republicanos, como se verifica pelas manifestações criminosas ora imputadas ao denunciado”.
Moraes descreveu como “gravíssima” a conduta de todos os denunciados, uma vez que tinham como objetivo final abolir os Poderes de Estado. Tais condutas estão bem tipificadas no Código Penal brasileiro, ressaltou. “Não existirá um Estado Democrático de Direito sem que haja Poderes de Estado, independentes e harmônicos entre si, bem como previsão de direitos fundamentais e instrumentos que possibilitem a fiscalização e a perpetuidade desses requisitos; consequentemente, a conduta por parte do denunciado revela-se gravíssima e, ao menos nesta análise preliminar, corresponde aos preceitos primários estabelecidos nos indigitados artigos do nosso Código Penal”, escreveu o ministro.
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Acusação
Em um dos processos, que trata de pessoas presas no acampamento em frente ao Quartel-General do Exército, em Brasília, em 9 de janeiro, os denunciados foram acusados pela Procuradoria-Geral da República (PGR) dos crimes de incitação às Forças Armadas contra os poderes constitucionais e associação criminosa (art. 286. parágrafo único) e associação criminosa (art. 288), ambos do Código Penal.
Ademais, em outro processo, relativo aos executores dos atos golpistas, boa parte presa em flagrante no próprio 8 de janeiro, a PGR imputou os crimes de associação criminosa armada (art. 288, parágrafo único), abolição violenta do Estado Democrático de Direito (art. 359-L), golpe de Estado (art. 359-M), dano qualificado por violência e grave ameaça, com emprego de substância inflamável, contra o patrimônio da União e com considerável prejuízo para a vítima (art. 163, parágrafo único, I, II, III e IV), todos do Código Penal.
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Além disso, a estes últimos ainda foram imputados os crimes de deterioração do patrimônio tombado (Lei 9.605/1998, art. 62, I), com concurso material (art. 69, caput, do Código Penal) e concurso de pessoas (art. 29, caput, do Código Penal).
Há ainda outros dois inquéritos abertos no Supremo Tribunal Federal a respeito dos atos golpistas do 8 de janeiro. Um deles apura a responsabilidade dos financiadores de tais atos, o outro é sobre a suposta omissão de autoridades públicas no episódio. Contudo, nestes ainda não houve nenhuma denúncia apresentada pela PGR.
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Defesas
As defesas dos denunciados tiveram até as 23h59 dessa segunda-feira, 17, para enviar sustentação oral contra as acusações. Porém, em geral, os advogados levantaram diversas questões preliminares na tentativa de anular os processos. Uma das principais queixas foi a incompetência do Supremo para julgar pessoas sem prerrogativa de foro no tribunal. Os advogados e defensores públicos alegam que a primeira instância da Justiça Federal deve julgar seus clientes.
Moraes rejeitou o argumento afirmando que a conduta de todos os denunciados está associada a outras pessoas investigadas pelos atos antidemocráticos, incluindo deputados federais, o que atrai a competência do STF no caso, conforme previsto no Código de Processo Penal e pela jurisprudência do próprio tribunal.
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Defensores da União e advogados apontaram como principal violação dos direitos fundamentais dos denunciados o fato de a PGR ter apresentado denúncias com textos iguais, sem especificar a conduta de cada sujeito. Assim, isso por si só deveria ser suficiente para se concluir pela inépcia da denúncia, argumentaram. “Trata-se de denúncia genérica, em que é imputada a mesma conduta a mais de 1,4 mil investigados. Para que a denúncia fosse válida deveria existir a individualização da conduta de cada investigado”, disse a advogada Tanielli Telles de Camargo Padoan, por exemplo.
“A PGR descreve a mesma conduta, atribuindo a todos a mesma exposição dos supostos fatos criminosos, sendo mudados apenas o nome, o CPF (Cadastro de Pessoas Físicas) e o endereço”, argumentou.
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O relator também afastou o argumento, afirmando se tratar do que a doutrina chama de crimes multitudinários, em que muitas pessoas cometem as mesmas violações, o que em si é obstáculo para a individualização dos pormenores das condutas, ao menos no momento da apresentação da denúncia. “Em crimes dessa natureza, a individualização detalhada das condutas encontra barreiras intransponíveis pela própria característica coletiva da conduta, não restando dúvidas, contudo, que todos contribuem para o resultado, eis que se trata de uma ação conjunta, perpetrada por inúmeros agentes, direcionada ao mesmo fim”, escreveu o ministro.
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