Houve um tempo que foi moda ir a Porto Seguro. E eu, que nem de praia gosto, acabei por lá. Axé o dia todo, flanar pela cidade, jantares fartos. E o mar, evidentemente. Numa dessas, encaramos um roteiro de barco.

Saímos de manhã, parando aqui e ali, até chegarmos a uma ilhota. Minúscula. Mal havíamos começado a caminhar e o tempo fechou. O céu escureceu, a brisa virou vendaval formando ondas na areia que entrava pela boca e pelos olhos. Nos encolhemos junto a um tronco, mãos protegendo a cabeça. Em minutos, a tempestade deu lugar à chuva. Levantei decidida a correr para a escuna quando percebi que um homem ao meu lado – uns 50 anos, alto e forte – não conseguia sair do lugar. O corpo percorrido por tremores, em pânico.

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Foi preciso paciência para levar o relutante de volta. À noite, um tanto constrangido, nos relatou que sentira um pavor enorme, um medo inexplicável.

Em janeiro, fui à Patagônia. A viagem não me pegou no melhor momento. Vinha insegura quanto ao futuro e por isso não me sentia muito bem. Mas estava marcado, pago, eu teria que ir. Busquei motivações no meu já conhecido gosto por aventuras, fiz a mala e me toquei ao fim do mundo.

Na chegada em Ushuaia, um imprevisto. O avião sobrevoava aquela pontinha da cordilheira e, de repente, começou a dançar como que descontrolado. Pra lá e pra cá, pra lá e pra cá, seguido de uma brusca queda de altitude. Foi aterrorizante. Gritos, crianças chorando, a sensação de que íamos cair para, logo a seguir, pousarmos no aeroporto. Assustados, mas inteiros.

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Eu já havia enfrentado turbulências fortes. Nenhuma assim. Talvez por isso, e por outras pequenas e grandes coisas, o susto estragou meu passeio. Foi como se o horror daqueles segundos tivesse ficado em mim. E mesmo sem pensar no avião, fui tomada pela angústia.

O resultado é que estive na Patagônia contando as horas para retornar. Mais de uma vez, desisti da programação e fiquei no hotel. Em meio à paisagem deslumbrante, eu só via desolação e abandono. O deserto sem fim, a terra cinza e árida. Um vento que não para nunca.

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Assumido ou disfarçado, trabalhado ou ignorado, o medo nos acompanha. Pode mostrar a cara, irracional e absurda, em um momento qualquer. E virar um cataclisma dentro da gente. Maior que qualquer bom-senso.

Voltei e, por alguns dias, o assombro ante a inevitabilidade da morte ainda esteve comigo. Como não ser dominado por ele? Para mim, pensar que todos temos medos foi reconfortante nesses dias difíceis. É como não estar sozinha. E quer saber? Não estar sozinha, de verdade, é capaz de fazer todos os temores desaparecerem.

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Guilherme Bica

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