Artista, de fios e linhas, Maria desenvolve suas peças em Ouro Preto, capital mineira antes de Belo Horizonte e depois de Mariana. Perguntada sobre a tragédia de Mariana, ela assegura que “a palavra é tristeza. Não tem outra coisa para se dizer. Viramos um queijo suíço. Nossa região toda é de mineração. Por aqui tudo está furado”. Após estender seus olhos pela feira de artefatos de “pedra-sabão”, segue: “Eu mesma tenho uma colega que perdeu o genro. Ele estava num trator e usava tapa-ouvidos. Achamos que não escutou nada e ficou lá mesmo”.
Pergunta semelhante fora dirigida, no início da tarde, para um formando em engenharia metalúrgica. Adelar, o nome do jovem, entende que “mesmo com os cuidados técnicos e as medidas de segurança adequadas, não tem como garantir que Mariana e Brumadinho não venham se repetir”. Paulo, professor na mesma Escola de Minas, acrescentou que “tudo foi uma convulsão. Mas aí vêm outros acontecimentos, a luta diária pela vida, e as pessoas, mesmo sem esquecer, preferem não falar muito das tragédias”. Na mesma linha, Heloísa, balconista de uma loja de cristais de rocha, opina que “um desastre tapa outro”. Por sua vez, o catador Zé Geraldo considera que “fazem de conta que vão indenizar… só conversa e migalha… dizem que não vai mais acontecer. Aqui todo mundo sabe que o chão é de moledo. É só descuidar e vem tudo abaixo”.
Sem dúvida, paira um lamento receoso no ar. Temor comungado por Maria da Conceição, ainda à espera do ônibus que a levará para casa, à Rua Santa Efigênia. “Tudo é incerto, tenho pena dos que estão chegando. Mas não se pode desanimar. É preciso muita, mas muita perseverança”, ensina a senhora de 77 anos de idade. Chega o transporte público. Maria embarca. Um pouco tensa, sem perder o sorriso acolhedor, leva consigo muito das Minas Gerais. Talvez lembre das 80 famílias do “Taquaral”, cujas casas foram condenadas. Quiçá associe as moradias sob risco ao casarão histórico que tombou, em função de deslizamentos, junto à Rua dos Inconfidentes, imortalizados na figura de Tiradentes. Quem sabe guarde nos olhos o brilho do quartzo, do ouro e dos diamantes da Serra do Espinhaço. Porventura tenha feito uma prece ao ver o Pico do Itacolomi, apontando suas rochas para altitudes nem sequer alcançadas pelas torres das igrejas barrocas. Igrejas e monumentos que sempre trarão à mente as obras geniais de Aleijadinho, mestre Ataíde e tantos mais. Arte que se estende à contemporaneidade no Parque do Inhotim, em flagrante contraponto com a placa, não oficial, cravada num resto de entulho, junto à entrada de Brumadinho: “Poluição visual e química”.
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Adiante, pela ladeira entardecida, segue Maria da Conceição. Como cada de um nós, carrega suas evidências e fragmentos, esperanças e esquecimentos.
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