Em clima natalino, um relato da região do aniversariante, extraído de meu livro Mar incógnito.
Cruzei o deserto de Negev em direção ao Mar Morto, conhecido pelos judeus como Mar de Sal. Sinais na estrada indicam a altitude e, a partir de Arad, inicia-se uma abrupta descida até o ponto mais profundo da superfície terrestre, 400 metros abaixo do nível do mar. Como o nome sugere, não há vida perceptível nestas águas, devido à altíssima concentração de sal causada pelo calor intenso e pela baixa altitude. Microscopicamente, contudo, existe vida naquele caldo salgado, com alta concentração de arqueias, microrganismo unicelular que, de tempos em tempos, tinge tudo de vermelho.
O Mar Morto é, na verdade, um lago com 65 quilômetros de comprimento por até 18 quilômetros de largura, onde a única fonte de água é o Rio Jordão, e a única saída, a evaporação. A sede de israelenses, palestinos e jordanianos vem diminuindo o fluxo que chega até o lago, provocando uma redução média de um metro por ano no nível da água, ritmo que o levará à extinção em menos de 30 anos.
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As águas densas, viscosas e límpidas do Mar Morto são medicinais e terapêuticas. Seu sabor amargo, que descobri por acidente em uma manobra aquática mal executada, é bastante desagradável. Seguindo o conselho dos locais, não me barbeei naquele dia, para evitar que cortes, ainda que imperceptíveis, tivessem sua dor intensificada pelas águas supersalgadas. Com 10% mais oxigênio do que ao nível do mar, as águas propiciam um benefício explorado por dezenas de hotéis no local, sempre repletos de hóspedes em busca de cura e alívio para problemas de pele, artrite, inflamações nas articulações e outros males. Por outro lado, o clima desértico causa desidratação rápida, e beber água (doce!) o tempo todo é imprescindível. Flutuei na praia de Ein Bokek, atestando que é impossível afundar e pode-se quase sentar sobre a água.
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Da costa do lago, me dirigi às ruínas de Massada, um símbolo da luta israelense pela Terra Prometida. A história de martírio que a fortaleza presenciou invoca emoções conflitantes, de tragédia e triunfo. Concluída pelo Rei Herodes no ano 40 depois de Cristo, a cidade ficava a 450 metros de altura, cercada por 610 metros de muralhas e planejada para ser autossuficiente em água, comida, vinho e mantimentos essenciais. Com a destruição do Segundo Templo pelos romanos e a revolta dos judeus em Jerusalém em 66 depois de Cristo, os Zelotes se refugiaram em Massada, contando com mais de oito anos de suprimentos. Na ocasião, aquele era o último reduto dos hebreus em Israel.
Novecentos e sessenta e sete refugiados, entre homens, mulheres e crianças, resistiram por cinco meses a milhares de legionários romanos que os cercavam. Os soldados de César, frustrados nas tentativas de tomar a fortaleza, chamaram seus melhores engenheiros, que concluíram que a melhor solução seria construir uma rampa até o topo da montanha. Para evitar que os construtores fossem mortos pelos defensores de Massada, os romanos forçaram escravos judeus a construir a rampa de pedras e areia. Quando estavam quase no topo, uma torre de madeira foi levada até o cume e erguida durante a madrugada. O acesso à fortaleza estava pronto para a invasão.
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Na manhã seguinte, os romanos entraram na cidade e encontraram silêncio sepulcral. Durante a noite, os residentes, certos da derrota iminente e determinados a não se tornar escravos, queimaram todos os seus pertences, encheram a praça central de Massada com trigo e água, para mostrar que não teriam morrido de fome e sede, e se uniram em um suicídio coletivo. Os únicos sobreviventes, duas mulheres e cinco crianças, ficaram para contar a história dos mártires de Massada, também registrada pelo General romano Josephus Flavius, como um exemplo de escolha entre escravidão e morte.
As ruínas só foram descobertas recentemente, em 1963, e revelaram os depósitos de suprimentos, os palácios de Herodes, as enormes cisternas, as piscinas rituais e uma sinagoga. É hoje o local onde os soldados israelenses prestam seu juramento: “Massada não cairá novamente”. A história dos Zelotes permanece como símbolo de coragem ou covardia, dependendo de quem a interpreta.
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