Ainda estão presentes os registro das assustadoras pirâmides financeiras, que ocorreram no Brasil, há poucos anos, com perdas de bilhões de reais a milhões de pessoas que acreditaram em negócios que prometiam grandes retornos financeiros. Na época, para o Ministério Público, algumas empresas que diziam atuar com venda direta por meio de marketing de rede na verdade apenas serviram de disfarce para esconder um elaborado esquema de pirâmide financeira, o que é contra a lei. Os mais comentados foram a TelexFree (venda do VoIP de chamada de voz gratuita pela internet), Boi Gordo (aplicação em gado), Bbom (venda de rastreador de veículos), Avestruz Master (compra e venda de avestruzes).
Antes de prosseguir, cabe distinguir a pirâmide financeira do marketing de rede ou multinível (MMN). A pirâmide financeira depende basicamente do recrutamento progressivo de outras pessoas para o sistema, sem levar em consideração a real geração de vendas de produtos ou serviços. Os ganhos não vem dessas vendas, mas das taxas pagas por quem entra no sistema; quer dizer, os novos associados pagam os antigos. Quando, por alguma razão, não entram mais novos associados para a rede, o sistema simplesmente cai. Por isso, a Pirâmide é crime previsto em lei e sua prática configura crime contra a economia popular.
O Marketing de rede ou multinível, por sua vez, é um modelo de negócio legal em que o integrante da rede pode ter ganhos tanto em razão da venda de produtos ou serviços como através de recrutamento de outros vendedores. O sistema MMN não depende de novos associados para se sustentar, mas apenas da venda de seus produtos.
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Nos dias atuais, com a internet, de vez em quando, aparecem novas propostas, sob novas ou diferentes roupagens, às vezes não transparecendo, inicialmente, tratar-se de uma forma camuflada de pirâmide financeira. Uma dessas propostas se apresenta com o nome nada suspeito de “Mandala da prosperidade”, aparecendo ainda com outras denominações como “Tear dos Sonhos”, “Mandala Feminina” ou “Flor da Abundância”.
A Mandala da Prosperidade, com um discurso feminista – luta contra o patriarcado, a desvalorização da mulher e a ganância – usando conhecimentos de psicologia e práticas de espiritualidade, através de grupos virtuais propõe unir pessoas para se tornarem melhores e ajudar as demais por meio da solidariedade. O objetivo, aparentemente muito bonito, seria a cooperação entre mulheres em busca do empoderamento feminino e a realização de sonhos.
Na avaliação de mulheres que participaram desses grupos, o discurso convence totalmente. Uma delas contou que foi convidada por uma colega de faculdade que disse que o grupo estava lhe fazendo muito bem porque as mulheres realizam o sonho de outras por meio de uma economia solidária, crescendo emocional e espiritualmente.
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Outra mulher confessou que a ideia a encantou e ela começou a frequentar os encontros do grupo, por meio de um aplicativo que reúne as participantes de maneira virtual. Nessas reuniões virtuais, as pessoas se vêm, cantam, rezam e ouvem histórias comoventes. Lá pelas tantas, alguém do grupo dá o pulo do gato. Fala que essa é uma revolução silenciosa entre as mulheres e a chance de participar disso é dar um presente para a mulher que está no centro da mandala. Não fala em dinheiro, apenas cita o valor de R$ 5 mil como “presente”, o que caracteriza a pirâmide financeira, já que não existe nenhum produto ou serviço a ser vendido. Ela se sustenta apenas enquanto houver a adesão de novos participantes.
O convencimento é tão forte que, não tendo dinheiro, muitas pessoas fazem empréstimos porque acreditam na promessa de receber, multiplicado por oito, o valor dado a uma participantes do grupo. Como é natural que as pessoas fiquem na dúvida ou mesmo com medo de fazer a transferência bancária, são realizados vários rituais para vencer esses sentimentos. Num deles, a pessoa escreve numa folha de papel qual é o medo que sente em tomar a decisão de fazer a transferência bancária do “presente”; num dos próximos encontros, esse papel é queimado na chama de uma vela, significando a eliminação dos medos.
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Ao fazer a transferência do valor de R$ 5 mil para o nome da pessoa que está no meio da mandala, sem eventualmente nem conhecê-la, a participante passa a ser chamada de “mulher fogo”, que é a primeira fase até ela chegar ao centro do grupo e também receber R$ 40 mil. Na fase seguinte, essa “mulher fogo” precisa convidar outras mulheres – familiares, vizinhas, amigas, colegas, etc – para também participarem da mandala. Ela passa, então, a atuar como “mulher vento”, alguém que sopra oportunidades para outras mulheres. Se, até realizar a transferência, a mulher participante é apenas vítima, ao indicar e trazer pessoas próximas a participarem do esquema fraudulento ela pode também ser investigada criminalmente.
Muitas pessoas, até por intuição, percebem a armadilha logo que são convidadas, não aceitando a participar do grupo; outras, quando já estão integradas ao grupo, mas ainda não fizeram a transferência; algumas só se dão conta que entraram em fria quando já pagaram os R$ 5 mil; e tem aquelas que, mesmo sendo alertadas por pessoas próximas de que se trata de um golpe, não acreditam. É uma situação muito delicada porque a pessoa que desconfia ou tem certeza tratar-se de um esquema fraudulento, fica com receio de falar isso para a pessoa próxima e, pior ainda, de denunciar o caso às autoridades policiais.
De tempos em tempos, surgem “negócios da China”, alimentando a ilusão de pessoas de que poderão ganhar dinheiro fácil e rápido. Muitas não se dão conta de que, geralmente, “tudo o que vem fácil, vai fácil”. Assim, cabe às pessoas pensarem muito e procurarem se informar, não com aquela pessoa que já entrou no negócio, mas com especialistas do assunto ou até delegacias de polícia, onde já pode existir alguma denúncia sobre a atividade. Depois, se nada constar de desabono, procurar avaliar os riscos, a rentabilidade e, principalmente, se o retorno vai ao encontro dos sonhos e objetivos. Isso faz parte da educação financeira que, em suma, trata principalmente do comportamento das pessoas.
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