Aos 32 anos, o jornalista santa-cruzense Pedro Garcia já é um tarimbado profissional das comunicações sociais. Formado em Jornalismo pela Unisc, em 2011, e mestre em Letras – Leitura e Cognição, em 2018, pela mesma instituição, atua há 12 anos na imprensa diária, todos junto à Gazeta do Sul, atualmente como editor de política. Neste sábado, vivenciará a experiência de sua estreia na publicação em livro autoral, com a obra A vida é uma só: memórias de Guido Hoff, pela Editora Gazeta.
A elaboração da biografia, com as pesquisas e inúmeras entrevistas, ocorreu ao longo de quase um ano. Foi uma experiência reveladora para um jornalista que, por conta de sua profissão, acostumou-se a ler os registros de vida de outros personagens.
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“Gosto em especial de biografias escritas por jornalistas, porque nelas há uma preocupação em igual medida com a forma e o conteúdo”, frisa. “Combinam apurações rigorosas e exaustivas com textos não herméticos e organizados de forma atraente, diferente da maioria dos trabalhos acadêmicos”. Essas pesquisas, salienta, não raro acabam por ressignificar e fazer justiça com personagens históricos. “Um exemplo é Padre Cicero, do Lira Neto, que é a minha grande referência”, menciona.
Garcia refere que, além da pesquisa agora concretizada em livro, vem se dedicando a uma outra investigação desde 2019. Nesse caso, ele se ocupa da trajetória de Ruben Malikovski, um venâncio-airense que participou da luta armada no Uruguai nas décadas de 60 e 70 como integrante do movimento Tupamaros e esteve preso no país vizinho por mais de uma década.
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Pedro já foi ao Uruguai para levantar informações sobre o personagem, em pesquisa que interrompeu para se dedicar à biografia de seu Guido. Mas pretende retomá-la na sequência, a fim de concretizar esse conteúdo em livro, cujo título provisório é Guará: a história esquecida do tupamaro brasileiro. Sua expectativa é concluir esse trabalho ainda em 2023.
Magazine – Após a pesquisa, as entrevistas e a elaboração do livro, que aspectos mais lhe chamaram a atenção na trajetória de seu Guido, ou que pontos da sua biografia destacarias?
Pedro Garcia – O aspecto que mais me chama a atenção na trajetória de Guido é a capacidade que ele demonstrou de se reinventar. Basta pensar no quanto o mundo mudou entre a primeira eleição dele, em 1963, e a última, em 2016. Não são todos os políticos que conseguem sustentar uma carreira por quase 60 anos e, embora essa caminhada não tenha sido apenas de glórias, penso que ele soube fazer leituras corretas de cada contexto. Em 2016, por exemplo, ele já tinha mais de 70 anos, vinha de duas derrotas consecutivas e enfrentava três candidatos mais jovens. Havia toda uma nova geração de eleitores que não tinha a memória dos seus mandatos anteriores e ele conseguiu chegar nessas pessoas aprendendo a usar as ferramentas da atualidade e adotando um discurso de moralização que estava em ascensão. Com isso, conseguiu vencer. Essa capacidade também foi colocada à prova em 2004, quando ele estava fora da Prefeitura havia 15 anos e o grupo político no qual fora criado estava rachado. Naquele ano, ele foi às urnas aliado com o PT, partido pelo qual nunca teve muita simpatia, mas que vivia um momento muito bom nacionalmente. E venceu.
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Seu Guido foi importante liderança, séria e visionária, sem abrir mão de bom humor e leveza. Em que sentido essas duas formas de ser se complementavam?
O carisma foi muito importante na história do Guido, tanto na relação com os eleitores quanto nas relações políticas que construiu e que foram fundamentais para o êxito de suas gestões, sobretudo as duas primeiras. Quando Guido estava como prefeito pela segunda vez, o governador do Estado era Jair Soares, padrinho do seu filho mais novo. Imagine ter um compadre sentado na cadeira de governador! Num período em que o Estado cumpria um papel central nos investimentos que aconteciam nos municípios, o prefeito de uma cidade de menos de 20 mil habitantes tinha acesso livre ao gabinete no Palácio Piratini. E não foi assim apenas na época do Jair Soares. Guido estabeleceu pontes com os governadores anteriores e os grandes figurões da política gaúcha daquele tempo. Foi Sinval Guazzelli, por exemplo, quem o apelidou de Alemão, pelo qual ficou conhecido no meio político Rio Grande do Sul afora. Como o livro mostra, essas relações, construídas graças à desenvoltura que ele teve desde a infância, garantiram muitas coisas importantes para Vera Cruz.
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O que seu Guido deixa como exemplo e modelo para as gerações atuais de líderes e políticos?
Definitivamente, Guido nunca foi preguiçoso ou acomodado. Pelo contrário, sempre agiu com muita persistência. Não tinha qualquer constrangimento em pedir e cobrar de quem quer que fosse. Em certa ocasião, ele desligou o telefone na cara do presidente do Banco do Brasil, que era um cacique do Nordeste, porque um pedido de financiamento havia sido indeferido. Em outra ocasião, quando ele foi ao Piratini pedir dinheiro para construir um estádio, o Jair Soares entregou a ele uma tabela com tudo o que o Estado já havia repassado para Vera Cruz. Era muito mais do que qualquer outro município do mesmo porte havia recebido. E o Guido olhou para ele e disse: “Se já deu tudo isso, pode dar mais um pouco”. Ele realmente não desistia e penso que isso é um bom exemplo.
O que mais lhe surpreendeu ou impressionou nesse personagem?
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São várias histórias interessantes. Gosto muito do episódio que garantiu a Vera Cruz a conquista do Colégio Polivalente, ainda no primeiro mandato. Guido convidou o então secretário estadual de Educação para o que seria apenas uma visita comum, mas na verdade preparou uma grande cena na praça central da cidade, reunindo 2 mil estudantes, que foram trazidos de ônibus de todos os cantos do município. A intenção era provar ao secretário que o município tinha estudantes em número suficiente para receber uma escola de grande porte. E deu certo. O secretário se emocionou ao ver a multidão e anunciou ali, na hora, que Vera Cruz teria o Polivalente. E mais um detalhe interessante nessa história: para conseguir a aprovação final do projeto, a Prefeitura se propôs a financiar o transporte de estudantes da zona rural até a cidade. Ocorre que, até então, isso ainda não existia enquanto política pública, o que significa que, de alguma forma, Vera Cruz foi uma espécie de embrião do transporte escolar no Brasil.
Por que ler biografias? Por que ler a de seu Guido?
Primeiro, porque boas histórias merecem ser contadas. Segundo, porque, como disse o Ruy Castro em uma frase que utilizei como epígrafe do livro, o conhecimento do passado sempre pode ajudar a fazer um presente e futuro melhores. E, principalmente, porque a história de uma pessoa nunca é só a história de uma pessoa. Sempre aprendemos muito mais ao mergulhar na vida de alguém. Ao refazer os passos do Guido, por exemplo, descobrimos desde a forma como viviam descendentes de imigrantes alemães no “interior do interior” na primeira metade do século passado até os bastidores do poder.
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