Quem já não se deparou com situação assim: quer dizer algo, usar uma palavra, mas ela não vem, insiste em não se dobrar. Alguém socorre, sugere, mas ainda assim não cai o vocábulo preciso. No poema “O lutador”, Carlos Drummond de Andrade escreve: “Lutar com palavras / é a luta mais vã. / Entanto lutamos / mal rompe a manhã. / São muitas, eu pouco.”
Um dos meus encantos no estudo das línguas é a palavra. Buscar a sua origem, experimentar o seu sabor, conhecer o seu coração é um exercício fascinante. Há um tempo nos deparamos com puérpera. A palavra vem do latim puer (criança) que se une a parere (dar à luz, parir). Puérperas são as mulheres que tiveram filho há pouco tempo. Muitos certamente não a conheciam. Em decorrência, os meios de comunicação infelizmente desistiram, passando a usar somente “mulheres que tiveram filhos recentemente”. Perdeu-se uma oportunidade de ensinar.
A propósito, é dar à luz uma criança, e não a uma criança. Dar à luz significa trazer para a luz e, então, a mãe traz para a luz uma criança, e não a uma criança. Luísa deu à luz um menino, Fernanda deu à luz uma menina.
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Não faz muito, escutava a narração de um jogo de time local. Era uma tarde de calor escaldante. Já próximo o final da partida, o repórter de campo dizia que os jogadores estavam extasiados. O narrador: de fato, estão extenuados. O repórter insistiu: é verdade, estão extasiados. Ao se deparar com palavra desconhecida, não passe adiante. Vá procurar o seu sentido. Dicionários são fontes das quais jorram preciosidades.
Relendo A rebelião das massas, do filósofo espanhol José Ortega y Gasset, me deparei com uma explicação para a palavra esnobe. Falando do homem-massa, o autor esclarece que se trata de pessoa despojada de sua história, pronta para fingir ser qualquer coisa. Seria um homem sem nobreza; em latim, sine nobilitate (abreviado para s. nob). Esclarece que na Inglaterra as listas de residências indicavam junto ao nome o ofício e a classe da pessoa. Ao lado dos destituídos, aparecia s. nob, sem nobreza. Daí snob, esnobe. Em público fingiam ser qualquer coisa, esnobavam. Quantas vezes já usamos ou ouvimos “fica se esnobando”, isto é, mostrando o que não é ou não tem!
Minha língua materna é o alemão. Falava tudo, no entanto nunca havia estudado, nunca havia escrito. Quando comecei a estudar, a ver como se escreviam as palavras, a desvendar seus sentidos, fiquei simplesmente maravilhado. O desconhecido tesouro que estava comigo virou puro encantamento. Nunca me passara pela cabeça, por exemplo, que Geburtstag era um composto de dia do nascimento, portanto de aniversário.
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Com o sábio professor Edgar Hoffmann, excepcional latinista e helenista, aprendi ainda mais a valorizar e saborear a beleza da palavra. Do latim panis, evoluído para pão, permanece a raiz em panificadora, panifício, e também em apaniguar, que significa dar proteção, dar o pão, sustentar, favorecer. Fulano é um apaniguado do prefeito.
Há ciências cujo ensino poderia ou deveria começar pela aprendizagem das palavras. Biologia, por exemplo, é uma mina de radicais gregos que, se aprendidos, levam facilmente à compreensão dos conceitos. Quantas palavras derivam de bios (vida)! Micróbio, macróbio, anfíbio, tantas mais. Enfim, o reino das palavras é encantado.
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