O bairro que dá início à colonização não para de crescer. E nem precisa ser morador para perceber que estão sendo instalados loteamentos, que a região ainda mistura características rurais com o meio urbano, e que, dessa forma, tem se tornado foco das atenções de empresários e de quem busca um lugar tranquilo para morar.
Muitos dos que têm residência na Linha Santa Cruz nasceram lá, tinham o alemão como primeiro idioma e enfrentaram dificuldades na caminhada da apropriação da língua portuguesa, principalmente com o bullying que sofriam, quando iam à cidade para avançar nos estudos. Eles viram o crescimento e a despedida de estabelecimentos comerciais, como a Cooperativa Agrícola Linha Santa Cruz e a venda e salão dos Frantz, a Escola Agrícola, que hoje sedia uma escola infantil; assim como percebem o bom desempenho que outros, dos mais diversos segmentos, têm obtido.
O bairro vive um misto de área produtiva com avanços tecnológicos, que tem atraído a atenção e o investimento, tanto público quanto privado, ao ponto de estar lá o modal de transporte que aproxima a capital para pessoas e cargas, o aeroporto. Com entidades fortes e pessoas apaixonadas pelo local onde moram, projeta-se como polo turístico e exemplo de união, e sonha com um futuro ainda mais desenvolvido, sempre baseado nas características
dos seus colonizadores: a persistência e o trabalho.
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Inicia em um ponto localizado no Arroio Lajeado, no limite norte da Zona Urbana, instituída pelo Plano Diretor, de onde segue no sentido leste e depois sul, sempre acompanhando o limite da Zona Urbana, até encontrar um ponto localizado no limite norte da faixa de domínio da rodovia RSC-287, seguindo no sentido oeste, acompanhando a referida faixa de domínio, até encontrar um ponto, localizado no prolongamento imaginário da divisa Leste da propriedade do Pinus Park Hotel, seguindo por este, no sentido Norte até o ponto localizado na divisa Norte da referida propriedade, seguindo por esta no sentido Oeste até encontrar o ponto localizado no Arroio Lajeado, de onde segue, no sentido Norte, em linha irregular, sempre acompanhando o arroio, até encontrar o ponto inicial.” – Trecho da Lei Ordinária 8714, de 14 de setembro de 2021.
O ano é 1849. Alemães deixam a sua terra tendo como destino uma área que prometia trabalho e desenvolvimento. Depois de cerca de quatro meses, em veleiros, eles chegam ao Rio de Janeiro, de onde são direcionados para a Província de São Pedro do Rio Grande do Sul. A eles são destinadas áreas às margens da Estrada de Cima da Serra, que fora aberta para ligar duas regiões de criação de gado: a Campanha Gaúcha e os Campos do Planalto, interligando Rio Pardo e Cruz Alta.
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Essa localidade, onde encontraram florestas e animais silvestres, passou a ser conhecida como Picada Velha, ou Alte Pikade. Integravam o grupo Augusto Wutke, o único casado da primeira leva de imigrantes; Frederico Thietze, Augusto Rafler, Augusto Mandler, João Gottlobo Pohl e Augusto Arnold, o mais idoso, que já chegou adoentado. Na sequência, muitas outras famílias germânicas foram assentadas a convite do governo Provincial. Todos, unidos, trabalharam e transformaram o ambiente
Fizeram mais. Possibilitaram o desenvolvimento para a formação da primeira colônia fundada e gerida pela Província de São Pedro do Rio Grande do Sul. O resultado é uma consequência de características peculiares dos primeiros moradores: persistência e abnegação ao trabalho. Atuaram de forma tão unida a ponto de, por exemplo, os Wutke cuidarem de Arnold, que, mais tarde, cedeu suas terras à família Kliemann. Com o princípio de ajuda mútua, fizeram crescer a Colônia de Santa Cruz.
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Praticamente tudo o que existe em Santa Cruz do Sul teve sua primeira versão no bairro. Na educação, a Escola Estadual Affonso Pedro Rabuske, com esse nome devido à atuação de um professor, foi fundada em 11 de junho de 1853. Segundo o integrante da coordenação das comemorações dos 170 e 172 anos da imigração alemã, Paulo Trinks, funcionava próximo ao prédio da cooperativa, onde atualmente é a subprefeitura. Em 1926, mudou-se para o endereço atual. Dividia espaço com uma igreja.
Diretora em sua segunda gestão, Carine Goerck morava em outro bairro e encantou-se pela forma unida como a comunidade vive. Mudou-se para Linha Santa Cruz. Administra a instituição, que conta com 345 estudantes, número que tem aumentado ano a ano. “Em 2019 eram 220”, afirma. Parte dessa ampliação dá-se pela implantação do Ensino Médio. No fim deste ano, será formada a primeira turma de 3o ano da escola.
Assim como aumentou o número de crianças e adolescentes, também foram ampliadas as instalações. A equipe conta com 35 profissionais, entre professores e demais funcionários. A primeira escola surge na primeira rua do município. O presidente da Associação dos Moradores de Linha Santa Cruz (Amorlisc), Ricardo Bringmann, inclui a via como uma das conquistas da entidade, que representa outros segmentos , como esportivos, religiosos, sociais e de interesse comunitário – são 16 grupos.
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O empenho comunitário possibilitou o retorno ao município da gestão de trecho da ERS-418. Ainda há outros projetos, como o caminhódromo, áreas de estacionamento e rotatória ou recuos nos acessos aos loteamentos. Bringmann reforça ainda a necessidade da instalação de um playground para as crianças na comunidade.
Pessoas de todo o Brasil vêm a Linha Santa Cruz para realizar o curso de pilotos promovido pelo Aeroclube Santa Cruz. Dali já saíram profissionais que atuam em todo o mundo. Claro que o caminho não é fácil. Os instrutores Pábulo Goldschmidt e Anderson Vieira Schneider salientam que é preciso fazer aulas teóricas, exames médicos e aulas práticas, para cada um dos objetivos. O inicial possibilita que voe, mas sem cunho profissional.
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“O Sul é polo formador de pilotos e o Aeroclube Santa Cruz é reconhecido como uma das melhores escolas do Brasil, pela graduação do curso e pelos custos”, frisa Goldschmidt. Schneider acrescenta que toda a estrutura da área, exceto o terminal de embarque do aeroporto e o asfalto da pista, foi construída pela instituição, que se instalou no atual local em 1961, depois que um temporal destruiu hangares e aeronaves no endereço antigo, atual Distrito Industrial.
A pista, em asfalto, tem 1.180 metros de comprimento por 18 de largura. Dela, regularmente, partem aviões com destino à Capital, e levam e trazem pessoas e cargas.
Paulo Trinks lembra que, no início da década de 1990, Linha Santa Cruz tinha 965 eleitores, em um universo de 1,5 mil moradores. O presidente da Amorlisc, Ricardo Bringmann, acredita que atualmente sejam 8 mil. A mudança faz com que estabelecimentos comerciais escolham o local para abrir unidades. É o caso da rede de supermercados Miller, que iniciou os trabalhos para a construção de uma filial.
O que era zona rural até 1974 passou a ter características urbanas. Hoje podem ser encontrados os mais diferentes tipos de comércios, assim como prestação de serviços. Tem posto policial, escolas, posto de saúde, ginásio esportivo, aeroclube, aeroporto, feira do produtor, subprefeitura e o Rotary Club Cidade Alta.
Essa capacidade de desenvolvimento fez com que fosse instalada, no bairro, a Linha Santa Cruz Imóveis. “É um bairro bom de se morar, devido à segurança que se sente. A qualquer hora do dia e da noite, as pessoas saem à rua com tranquilidade”, diz um dos sócios, Jair Adalberto Sehn. Bringmann, também sócio, acrescenta: “É o primeiro degrau da Serra, um local com muita qualidade de vida; voa uma brisa corrente aqui”.
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Outro exemplo de empreendimento de sucesso na região é a Dalmac Materiais de Construção. Em 1993, conta o sócio-proprietário Loreno Luiz Heck, era uma aposta, por perceber que outros bairros estavam com crescimento acelerado. “A tendência é que viria para cá. Na época, havia apenas um loteamento, e hoje está em pleno desenvolvimento”, enfatiza. Recorda que não tinha telefone para o estabelecimento. “Foi muita persistência, e trabalho”, explica. O empenho deu certo. A empresa foi acrescida de construtora, empregando 21 pessoas de forma direta.
Essas peculiaridades fazem com que pessoas de outros municípios procurem terrenos ou casas no bairro. Elas buscam o ambiente calmo, mas que não fica distante da área central. Quem precisar ir até o centro de Santa Cruz, pelo acesso Grasel, faz isso em minutos – em especial depois da conquista, por iniciativa da Amorlisc e de apoiadores, do viaduto na ERS-287, que dá tranquilidade para a passagem de veículos e pedestres.
O projeto está pronto, assim como a sugestão para captação de recursos destinados a sua concretização. A expectativa dos integrantes da Amorlisc e de comissão especial é para que seja concretizado o parque em homenagem aos imigrantes alemães. A estrutura será montada em área da Granja Municipal. “O município já tem o roteiro Caminhos da Imigração, o cemitério histórico. A área é pública, o que não demanda investimento. Então, estamos bem encaminhados”, diz Ricardo Bringmann.
Entende que esse é o momento de fomentar a atração turística, buscando recursos com a União, e parcerias público-privadas, além de verba própria do poder público municipal. “A ideia não é fazer algo para competir com outros locais, mas para chamar a atenção em esfera nacional”, frisa. E reforça que cerca de 30 pessoas desenvolvem a ideia, que já conta com a ciência e concordância da Prefeitura. Todo esse trabalho de desenvolvimento, menciona Bringmann, é feito de forma ordenada. Assim, a infraestrutura, em especial de serviços públicos, consegue acompanhar o crescimento local.
Doutora em Ciências Sociais pela universidade alemã Eberhard-Karls de Tübingen, Lissi Bender recorda do tempo em que poucas famílias moravam em Linha Santa Cruz, quando era possível a realização das quermesses sob as copas das árvores. “Meu lugar de viver me foi confiado pela minha família. Nele, cuido para que o lugar continue abrigo de vidas silvestres, tanto da fauna quanto da flora. Assim como diversos outros moradores, vivo entre o rural e o urbano”, ressalta.
Lissi entende que é uma relação possível, assim como a implantação do novo sem perder suas raízes históricas. “Somos abertos ao progresso, mas precisamos cuidar para que o novo se integre harmoniosamente. Precisamos zelar por um progresso que enaltece a história, o legado cultural, e não o suplante”, afirma.
Destaca que isso é possível com ações como a que impediu a instalação de um incinerador de lixo hospitalar no local.
Também defende a retomada da alameda de extremosas, a flor símbolo de Santa Cruz, assim como o plantio de mais carvalhos (Eichen, em alemão), uma árvore prenhe de simbologia e que era sagrada para os antigos germânicos. Com todas as inovações, sem suprimir os marcos históricos, ela acredita que seja possível manter a vocação que lhe deu origem: o acolhimento.
Um empreendimento que “harmoniza” com a característica da Alte Pikade, afirma Lissi Bender, é o Harz Wein, vinhos de Rogério Harz, que privilegia a língua alemã e mantém a tradição dos antepassados. “Meu pai, Erwin, produzia vinho para uso familiar. E também Milton Herberts, recém-falecido, produzia ótimos vinhos aqui”, recorda.
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Com olhar atento às obras do novo vizinho, a filial do Supermercados Miller, Adroaldo Pedro Assmann, de 71 anos, relembra do tempo em que as compras eram feitas na cooperativa, quase em frente de casa. Sua mãe, Ana Maria Acela Assmann, é bisneta de Augusto Wutke, integrante do grupo inicial de imigrantes. Ela não gostava muito de falar dos antepassados por entender que viviam em tempos muito difíceis. “Imagina ganhar uma leva de terra em um lugar só com mato e bichos”, justifica.
Adroaldo mantém a casa, mais do que centenária, que abrigou seus pais em um tempo no qual, segundo ele, existia calmaria e a possibilidade de brincar e praticar esportes com os amigos. Mudaram os costumes, as pessoas e as características do bairro, mas não mudou o sentimento dos descendentes de Wutke pelo local, nem a fé. “Os Wutke eram muito católicos. Ainda são de fé, não mais com tanta intensidade, mas continuam”, brinca.
Integrante da coordenação das comemorações dos 170 e 172 anos da imigração alemã, Paulo Afonso Trinks tem na memória uma série de fatos que viveu e outros que aprendeu com os antepassados sobre a história da localidade. São exemplos de que a atuação dos imigrantes era focada em pilares como educação, cooperação e religiosidade.
O prédio que abriga hoje a subprefeitura, a sala do Rotary Club e vai receber a feira do produtor faz parte da história de Linha Santa Cruz. Datado de 1913, poucos anos após o surgimento das primeiras cooperativas no País, transformou-se em ponto de referência comercial, com a instituição da Cooperativa Agrícola Linha Santa Cruz. “A cooperativa foi o fomento do desenvolvimento da comunidade, tanto na agilização da negociação da colheita quanto na geração de empregos”, recorda.
A empresa, que funcionou até o fim da década de 1980, era a responsável por secagem de grãos e beneficiamento de tabaco e posterior negociação, garantindo a venda do que era produzido pelos moradores locais. Além disso, virou destaque, porque oferecia todos os tipos de produtos em varejo. “Vendia de sal a roupa, mas roupa (tecido) em metro, porque não existiam modelos prontos”, afirma.
Com o princípio cooperativo adotado pelos moradores, Linha Santa Cruz evoluiu na implantação de novas técnicas e ideias, sem abrir mão dos seus princípios. A língua alemã era a primeira a ser aprendida pelas crianças, que tinham contato com o idioma oficial somente na escola, onde acessavam o aprendizado do português.
Hoje, o bairro mantém ambientes que fazem recordar a história, como o prédio da cooperativa, a estrutura da primeira escola, o cemitério onde estão sepultados dois dos primeiros colonizadores (Augusto Mandler e João Gottlobo Pohl). Ao mesmo tempo, transforma-se em referência no interior do Estado por sediar o Aeroclube Santa Cruz do Sul e o Aeroporto Luiz Beck da Silva, com voos regulares para Porto Alegre desde o dia 4 de agosto de 2021.
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