Passei boa parte da minha vida sem álcool. E não foi por convicção. Foi por susto, após uma experiência traumática no meu primeiro emprego. Em uma abafada tarde de dezembro, aceitei o convite dos colegas da redação para uma esticadinha ao final do dia. Faceira como foca entre os experientes, derrubei uns quatro chopes meio que de “gutiguti”. Um feito impensável para quem, por puro medo, costumava ser comedida. Quando levantei da cadeira para ir embora, ainda rindo da última piada contada à mesa, o mundo desapareceu. Sumiu. Apagou. Relatos posteriores asseguram que desabei inerte e desacordada no chão do bar. Para só voltar ao mundo dos lúcidos horas depois, já na minha cama, sem saber ao certo como havia chegado em casa. E com uma vergonha inesquecível.
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Foi o início e o fim da minha carreira etílica. Não bastassem as piadas que ouvi nos dias seguintes, coincidência ou não, o fato é que desde então passei a ter terríveis enxaquecas toda vez que tentava beber. Um gole e a cabeça disparava. Pior, sem álcool também me tornei refém da cefaleia. Um mal que me acompanhou por décadas e se tornou conhecido como “A enxaqueca da Rose”.
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De uns anos pra cá, isso começou a mudar. Primeiro, as crises diárias foram se espaçando. Depois, ficaram mais leves e, finalmente, raríssimas. E no combo “Rose sem dor de cabeça” veio incluído o direito de beber. Moderadamente. Mas beber. Uma latinha de cerveja inteira, uma taça de vinho tinto. Agora, que não sou mais a jovem que fui, posso aproveitar algo tão comum quanto sentar com as amigas para um drinque. E, acredite, isso é ótimo.
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Conto minha resumida vida alcoólica para dizer que algumas coisas podem melhorar com o tempo. E não falo apenas das enxaquecas e do vinho. Embora para mim essas sejam duas mudanças divinas.
Depois da tal “certa idade”, é permitido, por exemplo, ser menos vaidoso. E o contrário também vale. Há inclusive quem subverta a lógica e, ao invés de ter um avatar, se transforme em seu avatar: rosto hiperliso, lábios carnudos e um certo beicinho, maçãs proeminentes. Zero rugas. Tem quem não goste, que ache artificial, e isso e aquilo. Que nada. Ignoremos os críticos. Se você gosta, se a Madonna pode e você também quer, faça.
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Outras situações igualmente franqueadas. Dizer o que se pensa daquele parente-mala que estraga o Natal de todos. Anunciar que em 2023 você não vai custear o veraneio da família porque vai para outro lugar com o neto e a turma dele. E se for com um namorado ou namorada 30 anos mais jovem? Pode, claro.
Enfim, você já entendeu o espírito da coisa. O ano está terminando, foi difícil para todos os brasileiros, sobrevivemos e aqui estamos. Uso a frase enviada em um grupo de amigos no zap, dias atrás, para sintetizar com humor esta última coluna de 2022: “Aos jovens, eu digo: te cuida e não faz bobagem. Aos da nossa idade, eu digo: te cuida e faz bobagem.”
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