Marquei uma consulta de rotina e descobri que minha médica havia mudado de endereço. Quando me informei sobre a atual localização da clínica, o coração ficou na mão. Era lá que minha mãe fazia quimioterapia. Há duas semanas, ao chegar no espaço onde encontraria a profissional para fazer o check up, foi preciso atravessar o corredor. O mesmo que atravessei com a dona Fátima em fevereiro de 2014, na manhã em que ia receber a primeira dose da químio. Naquele dia, quando a entrada foi liberada, peguei ela pelo braço e, juntas, seguimos o caminho rumo à sala, perdidas em pensamentos. Eu ainda não acreditava que minha mãe estava com câncer. Ela só queria sentir menos dor. Se livrar da tosse. Acordar e perceber que tudo não passava de um sonho. Mas não foi.
Depois de receber as orientações da enfermeira, minha mãezinha olhou pela janela. E eu tentei distraí-la. Puxei alguns assuntos da infância, lembrei da viagem para as águas termais que ela planejava fazer com o pai assim que o tratamento acabasse, falei da torta que iríamos comer na Iluminura naquela semana. Tentei fazer aquele momento um pouco menos dolorido. O olhar vazio dela, entretanto, me fez entender que a dor, naquele momento, era necessária. Ela precisava de silêncio. E a falta de conversa me fez chorar no banheiro. Ela provavelmente queria me dizer tantas coisas. Mas só conseguiu verbalizar, depois de algum tempo, o temor dos futuros enjoos e a angústia de raspar os cabelos em breve.
No dia em que a cabeleireira que também era nossa vizinha de porta passou a máquina zero em sua cabeça, a mamis me esperou em casa já de lenço. Vaidosa que era, tinha encontrado mais um motivo para arrasar no look. Ou minimizar a tristeza de perder os fios loiros que tanto adorava. “Esse lenço combina com essa roupa, mana?” “Acho melhor o outro, mãe.” E assim ela ficava algum tempo no espelho, se olhando, encontrando o nó mais estiloso. Tão graciosa.
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E o cheiro dos lenços? Três meses após ela partir, quando tomei coragem de arrumar seu guarda-roupas, abri a gaveta onde aquela coleção de panos coloridos estava guardada. E na hora fui tomada pelo cheirinho de mãe. Quando senti a fragrância, a sensação que eu tive era de que ela só havia saído por algumas horas e logo estava voltando. Sentei e chorei. Mas o choro foi sereno. De alguma forma, mesmo que só aproximando os lenços do meu rosto, me reconectei com a dona Fátima. E lembrei de toda a fortaleza que naquele período ela me transmitiu. Mesmo fraquinha. Mesmo doente.
Em cerca de 15 dias tem Dia das Mães. E fico feliz por lembrar desses episódios não mais com tristeza, mas com leveza. É porque durante 21 anos de minha vida tive a oportunidade de conviver com uma mulher incrível que, até mesmo em seus dias mais frágeis, me fez entender uma lição preciosa: se a vontade é aproveitar o que temos por aqui, a força supera a fraqueza. Que saudades, mãe!
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