Não é novidade que entre homens e mulheres existem desigualdades nas mais diferentes áreas. Na literatura, não é diferente. Em Um teto todo seu, de 1929, a escritora inglesa Virginia Woolf indica dois pilares que demonstram essa lógica. Para poder escrever, a mulher precisa de recursos e de um “teto todo seu”, que nada mais é do que o seu próprio espaço, levando-se em conta todos os papéis que desempenha.
Além disso, no século 19, uma mulher que tivesse atividade intelectual era considerada transgressora. E há que se ressaltar a falta de respaldo dos leitores e do mercado editorial para a publicação das obras. Para vencer esses entraves, as irmãs Brontë, por exemplo, usaram a estratégia de escrever sob o pseudônimo masculino de irmãos Bell. O mesmo ocorreu com Mary Ann Evans, que se valeu do pseudônimo de George Eliot, e igualmente com outras escritoras.
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Há nem tanto tempo assim, nos anos 1990, a autora de Harry Potter, a britânica J.K. Rowling, limitou-se a usar as iniciais do nome como estratégia editorial para que a obra também fosse lida por homens. Ainda assim, embora as mulheres tenham menos respaldo na literatura, não se pode deixar de mencionar que há muitas grandes autoras lidas e reconhecidas. O registro da primeira mulher a conquistar o Nobel de Literatura data de 1909. Depois disso, outras foram agraciadas. Neste ano, a francesa Annie Ernaux foi a vencedora.
E é justamente no abismo entre a desigualdade das mulheres em relação aos homens na produção literária e a restrição ainda existente no mercado editorial que, em 2014, a escritora Joanna Walsh lançou o projeto #readwomen2014. O movimento político virtual nasceu com o intuito de promover a leitura de obras escritas por mulheres.
Um ano depois, em São Paulo, três mulheres transformaram a ideia de Joanna em um grupo de leitura presencial. A semente do Leia Mulheres se espalhou por muitos estados do Brasil, que abraçaram a ideia. Cinco anos depois, a iniciativa chegou a Santa Cruz do Sul.
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Tudo começou numa disciplina de estudos feministas do Programa de Pós-Graduação em Letras (PPGL) da Unisc. Foi quando Ana Martins, Luana Ciecelski e Rosiana Kist, colegas de curso, decidiram dar vida à proposta do Leia Mulheres em Santa Cruz. “Já éramos envolvidas com literatura e feminismo de alguma maneira”, lembra Luana. A literatura produzida por mulheres é tema de pesquisa de Rosiana desde o mestrado. Já Ana, professora, propaga a temática nas escolas. Luana é mestre em Letras, jornalista e apaixonada por literatura, e participa de outros clubes de leitura.
O clube nasceu em março de 2020. Os encontros iniciaram virtuais, na pandemia, e depois passaram a presenciais, no Pranna Bistrô. Para cada encontro, é escolhida uma obra. O número de participantes costuma oscilar. “A poesia é para poucos. A literatura também”, reflete Ana. A ideia do clube é ser um espaço democrático para o debate sobre as obras, e não está associada à Academia. A participação é gratuita e o clube não tem fins lucrativos.
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O critério de escolha das obras não segue roteiro. Pode ser alguma efeméride, uma data, um evento, obras esquecidas pela crítica ou obras de autoras premiadas e não aclamadas, autoras de várias regiões, entre outros. Entretanto, leva-se em conta a procura por livros que sejam acessíveis. O grupo se comunica pelo Instagram (@leia_mulheres_scs) e por um grupo no WhatsApp, onde indicam a obra escolhida. Os encontros são mensais, quase sempre no último sábado do mês, no Pranna Bistrô.
As mulheres estão no comando do clube, voltado a obras escritas por outras mulheres. Homens podem participar dos encontros como leitores. Até o momento, 30 livros foram contemplados, entre poemas, cordel e até quadrinhos. Um destaque foi Vasto mundo, de Maria Valéria Rezende, autora que participou do encontro para debater a própria publicação. A obra do último encontro foi Sal, de Leticia Wierzchowski.
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O cenário é este: as mulheres escrevem muito, mas há muitos desafios no mercado editorial. O entrave ainda é a publicação, além do pouco reconhecimento. “Tem abertura para a mulher, mas em paralelo ela enfrenta a questão de ter muito menos tempo e espaço”, pontua Rosiana. Há muito material publicado de forma independente. “Primeiro, há uma importância humana, porque a literatura amplia as visões de mundo; e, em segundo, pelas próprias escritoras e pelas mulheres, que têm um apagamento muito grande na história”, analisa Ana. Santa Cruz do Sul tem muitas escritoras que, aos poucos, estão sendo trazidas ao clube. “A divulgação das obras ajuda muito essas autoras”, frisa Luana. Entre os planos para o futuro do clube, está não fixar os encontros em apenas um lugar.
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