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Justiça rejeita absolvição sumária dos 14 réus no Caso Pronaf

Foto: Divulgação/JFRS

Em mais um capítulo do Caso Pronaf, como ficou conhecido o esquema de desvio de recursos destinados ao custeio de pequenos agricultores no Vale do Rio Pardo, a 7ª Vara da Justiça Federal de Porto Alegre negou o pedido de absolvição sumária apresentado pelos 14 réus. A decisão foi publicada na última sexta-feira, 21, mas os envolvidos ainda poderão adotar medidas na tentativa de revertê-la.

Após analisar os argumentos dos réus, o juiz Guilherme Beltrami entendeu que não havia hipóteses que justificassem a absolvição sumária. Com isso, em uma fase seguinte, devem ter início etapa de instrução probatória com a análise de documentos trazidos no inquérito policial, as audiências nas quais poderão ocorrer novas manifestações, produção de provas periciais ou ainda a coleta de depoimentos de testemunhas. Diante da complexidade do caso, ainda não é possível ter uma previsão de quando pode ocorrer o julgamento.

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O escândalo do Pronaf veio à tona em outubro de 2014. Segundo a denúncia apresentada pelo Ministério Público Federal, as irregularidades teriam sido cometidas entre 2007 e 2013 por pessoas ligadas ao Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) juntamente com servidores do Banco do Brasil. Depoimentos, conversas telefônicas e a análise de operações bancárias, segundo o inquérito, apontaram que os acusados transferiram valores de empréstimos captados por meio do Programa Nacional da Agricultura Familiar (Pronaf) para a Associação dos Pequenos Agricultores Camponeses (Aspac), que atuava como braço jurídico do MPA.

As investigações revelaram que ao menos R$ 178 milhões referentes aos contratos de financiamento passaram pelas contas da entidade. Desse montante, R$ 10,2 milhões não retornaram aos pequenos agricultores e teriam ido parar na conta de integrantes da associação. Cerca de 5,7 mil pessoas foram lesadas no esquema, muitas delas moradoras do Vale do Rio Pardo.

Produtores lesados ainda podem buscar indenizações

Além da ação penal que tramita na Justiça Federal, seguem correndo os processos na esfera cível, onde as vítimas buscam indenização pelos prejuízos sofridos. Embora existam centenas de ações, as vítimas ainda podem buscar seus direitos até pelo menos 2024, explicam os advogados Ricardo Hermany e Henrique Hermany, que representam cerca de 200 produtores.

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Inclusive, recentemente começaram a ser pagas indenizações para produtores que foram lesados. Em um dos processos, o valor a que as vítimas tiveram direito superou a marca de R$ 1 milhão. Na maioria das ações cíveis, os agricultores têm recebido indenização por dano moral, além da devolução dos empréstimos com vícios na contratação e dos valores transferidos de suas contas para a Aspac, com atualização pelo IGP-M e juros. Segundo Ricardo Hermany, um dos casos é o dos agricultores Cláudio e Lisane Müller, de Cerro Alegre Alto, em Santa Cruz do Sul, que tiveram a indenização confirmada pela Justiça. Eles estão entre as centenas de agricultores atingidos pela fraude no Pronaf.

Geral Cláudio e Lisane Müller | Foto: Rafaelly Machado/Banco de Imagens

Juiz do caso determina que processo tenha continuidade

A reportagem da Gazeta do Sul teve acesso ao despacho do juiz federal Guilherme Beltrami publicado na página da Justiça Federal. Com isso, agora a ação penal terá prosseguimento com os interrogatórios e coleta de depoimentos das testemunhas.

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Após analisar todos os argumentos apresentados pelas defesas, ele ainda ressaltou que se as testemunhas “forem meramente abonatórias de conduta”, seus depoimentos poderão ser substituídos por declarações escritas. Um dos argumentos apresentados pedia a suspeição do juiz. A alegação do ex-vereador Wilson Luiz Rabuske, Vera Lúcia Lehmenn Rabuske, Marlise Teresinha Gularte e Perci Roberto Schuster foi de que o magistrado se manifestou nas investigações, deferindo medidas cautelares.

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“Por oportuno, saliento que as causas ensejadoras da suspeição, enumeradas no rol taxativo do artigo 254 do CPP, dizem respeito a um vínculo do julgador com uma das partes, o que, de qualquer sorte, não há. Manifestar-se nas investigações, quando provocado pelos órgãos de persecução penal, é atribuição do magistrado e não o torna suspeito para processar e julgar o feito. No mais, eventual omissão acerca de pedido da parte deve ser sanada pelos meios adequados, não havendo que se falar em suspeição”, escreveu Beltrami no despacho.

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Outra alegação dos réus foi quanto à inépcia da denúncia. Eles argumentaram que a peça acusatória é genérica, não descreve de forma pormenorizada os fatos criminosos e não individualiza as condutas de cada um dos denunciados. Segundo o juiz, a denúncia está de acordo com o artigo 41 do Código de Processo Penal (CPP), com a exposição do fato criminoso e todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a classificação do crime e, quando necessário, o rol das testemunhas.

“No caso, a denúncia narra detalhadamente fatos que ensejam a tipificação dos crimes de formação de quadrilha, gestão fraudulenta e violação de sigilo bancário, expondo o fato em todas as suas circunstâncias. Igualmente não se trata de denúncia genérica, que não individualiza as condutas de cada réu. Pelo contrário, a acusação é clara ao especificar os fatos, apontando cada um de seus supostos autores”, afirmou.

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Os réus

  • Wilson Luiz Rabuske, ex-coordenador do MPA
  • Vera Lúcia Lehmenn Rabuske, esposa de Wilson
  • Perci Roberto Schuster, ex-presidente da Aspac
  • Maikel Ismael Raenke, ex-integrante do MPA/Aspac
  • Marlise Teresinha Goulart, ex-integrante do MPA/Aspac em Sinimbu
  • Vania Emília Müller, ex-integrante do MPA/Aspac em Santa Cruz
  • João Carlos Hentschke, ex-gerente-geral do BB em S. Cruz
  • Wilson Luiz Bisognin, ex-gerente-geral do BB em Santa Cruz
  • Vladimir Barroso, ex-gerente-geral do BB em Sinimbu e Santa Cruz
  • Juliano Chedid Matte, ex-gerente-geral do BB em Sinimbu
  • Clóvis Kegler, ex-funcionário do BB em Santa Cruz
  • Sérgio Teixeira Silveira, ex-gerente de relacionamento do BB em S. Cruz
  • Rafael Cavalli, ex-gerente de relacionamento do BB em Sinimbu
  • Fabiana Beatriz Palhano, funcionária do BB em Sinimbu

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O processo não parou

Procurado pela Gazeta do Sul, o advogado Ricardo Hermany, que atua como assistente de acusação na ação penal, preferiu não comentar o teor da decisão do juiz. Explicou, contudo, que agora as partes terão prazo para as medidas judiciais cabíveis em relação à rejeição das alegações das defesas. Superado esse momento, as provas constantes na denúncia serão submetidas ao contraditório e a ampla defesa, essenciais ao devido processo legal. Ele também salientou que o processo seguiu seu fluxo sem qualquer interrupção, mesmo durante a pandemia. E ressaltou ainda que o juízo criminal adotou todas as medidas processuais prévias antes de se decidir quanto às respostas à acusação.
A assistência de acusação conta ainda com a atuação dos advogados Henrique Hermany, Cássio Alves e Camila Quadros.

O advogado Ricardo Hermany | Foto: Rafaelly Machado/Banco de Imagens

Entenda

O caso foi revelado por meio da Operação Colono, em outubro de 2014. À época, foi identificado que a Aspac intermediou 26,7 mil financiamentos para 6,3 mil agricultores. O esquema começava quando os funcionários da Aspac levavam os contratos aos produtores e os induziam a assinar uma autorização ou solicitação de transferência de valores dos financiamentos para contas bancárias da entidade.

O Banco do Brasil mantinha convênio com a Aspac desde 2003 para intermediação de financiamentos via Pronaf. A entidade identificava agricultores aptos a realizar operações, encaminhava as propostas e entregava a documentação para as agências. O banco, então, analisava as propostas e aprovava os financiamentos.

Em agosto de 2015, a Polícia Federal concluiu o inquérito conduzido pelo delegado Luciano Flores e encaminhou o caso ao Ministério Público Federal (MPF). A denúncia contra os 14 envolvidos foi apresentada em outubro de 2019.
Todos foram denunciados e viraram réus na ação movida pelo MPF, por meio do procurador José Alexandre Pinto Nunes. Depois veio a etapa da resposta à acusação, com a rejeição das alegações das defesas pelo juízo criminal na decisão mais recente.

Entre os argumentos apresentados pelas defesas estavam desde atipicidade de conduta, cerceamento de defesa, inépcia da denúncia até ilicitude de depoimentos apresentados por testemunhas e atipicidade das condutas.

Como se trata de uma decisão interlocutória, ou seja, no curso processual, foi expedida notificação eletrônica para os réus se manifestarem. Eles ainda poderão adotar uma série de medidas jurídicas na tentativa de reverter a decisão de prosseguimento da ação penal.

O advogado Marcos Morsch, que representa quatro dos réus, disse à Gazeta do Sul, na tarde de ontem, que ainda não teve acesso ao teor do despacho do juiz que cuida do caso. No entanto, afirmou que a rejeição da absolvição sumária é algo considerado comum em processos penais.

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