José Alberto Wenzel

José Alberto Wenzel: “Porões e sótãos”

Liderado por Eva, o estranho desfile de troncos decepados e criaturas machucadas concentra-se junto aos porões do antigo Sanatório de corredores e quartos abandonados. Lugares como esse guardam o registro dos que passaram por ali. Basta aquietar a pulsação da caminhada para se perceber que em cada canto há uma história que ainda não foi contada; mas está ali, pronta para se revelar. Todavia, é no sótão e no porão que o mistério das existências melhor se estabelece. Eva sinaliza que vai entrar no porão e que os demais aguardem sob o luar, que aos poucos declina.

Eva se agacha para entrar. Cautelosa, desce dois degraus e volta a se manter em pé. Aperta os olhos, para acostumá-los à escuridão. Às apalpadelas esgueira-se entre as fundações, formadas por blocos de arenito, revestidos pela umidade pegajosa.

José Alberto Wenzel: “Pedra encantada”

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Os mesmos blocos que sustentam o velho prédio abrigam um fragmento de rocha quase esquecido. Eva lembra das palavras do naturalista Cristian, que lhe dissera em tempos idos: “Não remova esta relíquia enquanto eu estiver vivo, mas, quando chegar a hora certa, busque o que ela indica. Uma menina vai te instruir.”

Ao som silencioso das palavras revividas, Eva quase escorrega. Firma-se contra a parede, a tempo de ouvir um risinho divertido. “O que foi isso?”, surpreende-se. “Não se assuste. Moro aqui. Está ali o que procuras.” Uma mãozinha juvenil conduz a mão de Eva para um oco entre dois blocos de rocha. “Aqui”, sussurra a menina.

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Mão com mão, encontram uma lasca de arenito hexagonal. As duas dirigem-se para a saída do porão. Tão logo surgem à frente do casarão, são abraçadas pelos que ali aguardam. Uma alegria imensa invade o coração de Eva, que convida: “Vamos junto?” A menina sorri lágrimas de orvalho, que só as madrugadas felizes proporcionam. “Antes precisamos ver que caminho seguir”, sugere Eva.

Sob o olhar curioso dos demais, Eva desliza seus dedos de artista sobre a face entalhada do arenito hexagonal. Dois alinhamentos sinuosos marcam a superfície da pedra. No encontro das linhas, desenha-se uma planta estranha, nunca vista por Eva.

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“Só existe esta”, disse a menina, ao ver o espanto de Eva, que ergue a lasca de arenito para que todos a vejam. Ao retornar os olhos para a menina, os desvia para duas cobras entre seus pés. Os mesmos que, há muito tempo, haviam sido lavados pelo médico naturalista. Um zumbido interrompe seus pensamentos.

Tudo fica claro para Eva. As duas linhas eram as cobras, talvez as mesmas que o médico naturalista costumava aninhar em seus bolsos. As abelhas deveriam ser as que, segundo alguns vizinhos da época, haviam se instalado na cabeça sofrida de seu marido Antônio. Quantas vezes Cristian lhe falara sobre um caminho que só as cobras conhecem pelo chão e as abelhas pelo ar? Lembrou da explicação sobre os alinhamentos de fraqueza do terreno e de sua junção. Seria este o local da planta desenhada na lasca hexagonal?

Um duplo sibilar a retira das memórias avivadas. As duas cobras se movem. Eva e os seus preparam-se para segui-las. Também o zumbido alado sugere partida. “Só um pouquinho. Já volto!”, se apressa em dizer a menina. “Claro, vou contigo”, se prontifica Eva.

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Ao invés de voltarem ao porão, alcançam o sótão. Se os porões silenciam, os sótãos rangem. Degraus de pedra costumam mergulhar na invisibilidade enquanto escadarias de madeira anunciam luminosidades. “Veja”, aconchega a menina, tomando em seus braços uma bonequinha de pano de olhos bordados, à semelhança dos ensinados por Eva aos hóspedes da casa de saúde. Embalando seu doce brinquedo, a menina e a senhora descem os degraus que, ao invés de ranger, festejam o encontro inesperado.

Quantos segredos e lacunas guardam os sótãos e os porões? Porém, não há tempo para maiores divagações. Em frente ao casarão, todos estão a postos. Hora de partir. Antes, Eva apalpa mais uma vez o hexágono. Durante o dia, com a claridade mais avançada, estudaria melhor aquela lasca, que ajeita no bolso esquerdo do vestido. Por sua vez, a menina beija a boneca. Afinal, quem é esta menina que conhece uma planta, única em sua raridade, e que ama uma boneca de pano de olhos bordados?

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Carina Weber

Carina Hörbe Weber, de 37 anos, é natural de Cachoeira do Sul. É formada em Jornalismo pela Universidade de Santa Cruz do Sul (Unisc) e mestre em Desenvolvimento Regional pela mesma instituição. Iniciou carreira profissional em Cachoeira do Sul com experiência em assessoria de comunicação em um clube da cidade e na produção e apresentação de programas em emissora de rádio local, durante a graduação. Após formada, se dedicou à Academia por dois anos em curso de Mestrado como bolsista da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). Teve a oportunidade de exercitar a docência em estágio proporcionado pelo curso. Após a conclusão do Mestrado retornou ao mercado de trabalho. Por dez anos atuou como assessora de comunicação em uma organização sindical. No ofício desempenhou várias funções, dentre elas: produção de textos, apresentação e produção de programa de rádio, produção de textos e alimentação de conteúdo de site institucional, protocolos e comunicação interna. Há dois anos trabalha como repórter multimídia na Gazeta Grupo de Comunicações, tendo a oportunidade de produzir e apresentar programa em vídeo diário.

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