Eleito com o compromisso de estancar a corrupção endêmica e colocar a economia em ordem após cinco anos de recessão, o presidente Jair Bolsonaro encerra o primeiro ano com um saldo controverso. De um lado, indicativos econômicos positivos e vitórias importantes no Congresso Nacional (sobretudo a reforma da aposentadoria e o pacote anticrime, embora desidratado em relação à versão original). De outro, uma sucessão de desgastes causados por trapalhadas e excessos verbais, a incerteza sobre o futuro de outras reformas estruturantes prometidas (como a tributária), o encolhimento de sua base aliada e o fato de ainda não haver uma melhora econômica que seja sentida pela população.
LEIA MAIS:
Telmo Kirst: um legado em jogo e uma sucessão em vista
Eduardo Leite: Pacote fiscal é a missão número 1
A aprovação da nova Previdência é, de longe, a maior conquista de Bolsonaro até agora, já que vai representar uma economia de R$ 800 bilhões em dez anos e, com isso, reduzir o déficit fiscal da União. Embora o País ainda conte com 11,9 milhões de desempregados, o governo encerrará o ano com números que indicam uma leve melhora: a taxa de desemprego caiu 0,4 pontos em novembro em comparação ao mesmo período do ano passado, ficando em 11,2%. Somam-se a isso as projeções otimistas da maioria dos setores produtivos para o próximo ciclo.
Publicidade
Bolsonaro, porém, também viu a agenda pública ser dominada durante boa parte do ano por polêmicas. O presidente foi acusado de despreparo após declarações explosivas suas e de seus filhos, manteve-se em conflito permanente com a maior parte da classe artística e intelectual, enfrentou duras críticas por sua política ambiental e pauta de costumes e trocou farpas com líderes mundiais, como o presidente da França, Emmanuel Macron, e a chanceler da Alemanha, Angela Merkel. No Congresso, viu se tornarem inimigos alguns de seus principais fiadores (como os deputados Joice Hasselman e Alexandre Frota), deixou o PSL e iniciou mobilização para criar um novo partido, o Aliança pelo Brasil. Durante todo o ano, perseguiram o governo as denúncias contra seu filho mais velho, o senador Flávio Bolsonaro, alvo de investigação por irregularidades na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro.
Fisiologismo no caminho
Embora mantenha o apoio de um terço da população brasileira, de acordo com pesquisas, Bolsonaro precisará, em 2020, apresentar resultados concretos na economia e, sobretudo, avançar em medidas anticorrupção e seguir enfrentando o tema da segurança pública. Essa é a visão da socióloga, cientista política e diretora do Instituto Pesquisas de Opinião (IPO), Elis Radmann. “Um outro tema muito caro para a população é a saúde pública, que está em primeiro lugar na fila de anseios dos brasileiros, e que o presidente terá que dedicar atenção em algum momento do próximo ano”, ressalta.
Publicidade
Conforme a pesquisadora, a eleição de Bolsonaro foi motivada principalmente pela expectativa por moralidade na política e pelo combate à corrupção. Seu apoio hoje, segundo Elis, é dividido em três grupos: os ideológicos (que acreditam em princípios de liberalismo político, consideram-se mais à direita e, eminentemente, são anti-PT), os racionais (que acreditam que apoiar o presidente é o melhor “custo-benefício”) e os que se conectam com Bolsonaro por sua narrativa e vão seguilo independente do partido.
Para a analista, um dos principais desafios do governo em 2020 será lidar com o fisiologismo do Congresso para aprovar pautas como a da reforma tributária. Com a proximidade das eleições municipais, a pressão por cargos e emendas – que já foi grande durante a discussão da Previdência – tende a se acentuar. “Em ano eleitoral, as negociações literalmente se ampliam. Tal cenário entra em choque com o perfil do presidente, que é avesso às articulações e negociações que fazem parte da política brasileira. Teremos uma conjuntura de muitas emoções políticas”, complementa Elis.
O filho
Publicidade
Já para o cientista político e professor de Relações Internacionais e Jornalismo da Unisinos, Bruno Lima Rocha, que discorda das afirmações de que há sinais de melhora na economia, o maior desafio de Bolsonaro hoje é permanecer no cargo. Na sua opinião, o aprofundamento da polarização ideológica e fatores como o clima de enfrentamento com a grande imprensa podem ameaçar a estabilidade da gestão.
Um dos fatores que contribuíram para esse risco, segundo ele, é justamente a situação envolvendo seu filho. “Com a exposição de Flávio Bolsonaro e o papel permanente de Carlos Bolsonaro como operador das redes sociais do presidente, as possibilidades de que sua imagem fique ainda mais frágil só aumentam”, entende.
Na mesma linha, Elis avalia que o assunto é sensível para Bolsonaro, pois afeta a imagem que tentou construir de combatente da corrupção. “Os seus apoiadores esperam uma conduta exemplar do presidente, exigindo o esclarecimento dos fatos e até a punição dos culpados, se for esse o caso.” Por outro lado, também persiste na opinião pública uma impressão de politização na justiça. Com isso, denúncias de um lado e outro costumam ser relativizadas.
Publicidade
This website uses cookies.