No recém encerrado mês de julho, o percentual de famílias brasileiras com dívidas atingiu 67,4%, maior nível da série histórica, conforme Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic), realizada com 18 mil consumidores e divulgada pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC). O crescimento se deve ao aumento do endividamento das famílias com renda de até 10 salários mínimos que chegou ao recorde de 69%. O grupo de famílias com renda superior aos 10 salários mínimos teve uma redução do endividamento, chegando a 59,1%. Nessas dívidas estão incluídos, mesmo que estejam em dia, o cheque pré-datado, cartão de crédito, cheque especial, carnês de loja, crédito consignado, empréstimo pessoal, prestação de carro, moto e casa.
De acordo com a mesma pesquisa, cresceram também, entre as famílias de menor renda, as dívidas ou contas em atraso, atingindo 26,3% no geral, o maior percentual desde setembro de 2017. De cada três famílias endividadas, uma está inadimplente, quer dizer, não consegue pagar suas contas.
Em nossa cultura, o termo dívidas geralmente remete a várias conotações. Tem pessoas que acham negativo, vergonhoso, estressante, provocando noites mal dormidas e até doenças. Ouras, não se importam ou até convivem bem com essa situação. Independente desses enfoques, a dívida é essencial para a economia dos países; ela faz a roda girar. Se isso é bom ou ruim, é discutível, mas parece indiscutível que sem dívidas de países, empresas e, principalmente, de pessoas a economia, independente se de livre mercado ou centralizada por governos, entraria em colapso. Para as pessoas físicas, o problema está no tipo de dívida que se faz. Robert Kiyosaki, autor da série de livros Pai Rico Pai Pobre, diz que pobres e a classe média usam dívidas geralmente para comprar passivos, como um carro ou viagens, enquanto os ricos usam dívidas para aumentar seu patrimônio, o que ele chama de dívida boa. Kyiosaki não considera a compra da casa própria, por exemplo, como um ativo porque ela tira dinheiro do bolso.
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Já o mentor da DSOP Educação Financeira e autor de livros, Reinaldo Domingos, classifica as dividas em dívida de valor e dívida sem valor. Dívida de valor é aquela que agrega valor, como a compra de uma casa, um carro, um curso. A dívida sem valor, por sua vez, não agrega nada, se muito dá uma sensação de realização e status, como a compra de uma roupa especial, uma bolsa de grife, etc.
Por que fazemos uma dívida? Porque estamos praticando aquele milenar escambo, isto é, trocando um produto, um serviço, etc. que queremos hoje por uma dívida. Quando compramos qualquer coisa financiada, estamos dando em troca o compromisso de pagar em data futura, assumindo uma dívida.
Quem está endividado ou até inadimplente (não consegue mais pagar suas dívidas) precisa, em primeiro lugar, fazer um diagnóstico de sua situação financeira para apurar o quanto pode dispor, substituir, diminuir ou até cortar de suas despesas. Ao mesmo tempo, fazer um levantamento das dívidas: relacionar os credores, o valor das dívidas, o vencimento de cada uma, os juros que carregam, as implicações em não pagar. Com esses dados em mãos, procurar os credores e propor negociação de valores e prazos de pagamento.
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Nessa fase de negociação, pesquisar também outras instituições financeiras que talvez cobrem juros menores e ofereçam outras vantagens, propondo a portabilidade de suas dívidas. Geralmente, as pessoas não procuram esse recurso por desconhecerem a possibilidade, por preguiça, por acreditarem não conseguir ou por acharem que o valor da economia não vale o esforço dispendido.
Quando faltar dinheiro, uma das dúvidas que a pessoa geralmente tem é o que pagar primeiro? Cabe classificar as despesas em essenciais – comida, luz, gás, plano de saúde, aluguel, condomínio – e não essenciais (carnes de crediários, mensalidades de clubes e outras). Levar em conta, também, as dívidas com bens em garantia e com juros mais altos, cuja inadimplência pode gerar consequências piores.
Antes de efetuar uma nova compra ou assumir um novo compromisso financeiro, principalmente se já estiver endividado, o consumidor precisa verificar sua disponibilidade financeira, apurando o valor de seu ganho que já está comprometido com as despesas normais e dívidas/prestações já assumidas. Os bancos, por exemplo, limitam o comprometimento do ganho em 30% para deferir um novo crédito. Depois, fazer-se algumas perguntas sugeridas pela DSOP – Educação Financeira, o que tornará a compra mais consciente e sustentável:
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- preciso e/ou necessito disso? Vai me ajudar em alguma coisa?
- é meu sonho e/ou propósito?
- tenho dinheiro para comprar à vista?
- tenho dinheiro para pagar a prestação dessa dívida?
- esse dinheiro não fará falta para outras finalidades?
- se eu deixar de comprar, o que estaria perdendo e/ou deixando de realizar?
- essa compra pode trazer um custo adicional mensal?
- se eu deixasse para o dia seguinte, será que ainda teria vontade comprar?
- fiz pesquisa e cotei o valor da compra?
- em caso de compras para outra pessoa, eu sei se ela precisa ou gosta desse produto?
Por fim, não adianta remarmos contra a maré que, em nosso país, é a cultura dos financiamentos de curto, médio, longo e longuíssimos prazos. Financiar bens que se deseja ter, como um simples aparelho de celular, é muitas vezes o atalho pelo qual a maioria das pessoas busca realizar seus sonhos materiais. O problema é saber se esse financiamento cabe no orçamento. Para isso, a Educação Financeira é uma grande aliada.