Em meados do século 19, Rio Pardo era uma das mais importantes cidades de todo o Sul do Brasil. Viajantes e autoridades que se dirigiam para a Província de São Pedro do Rio Grande do Sul tinham como destinos a Capital, Porto Alegre, e mais algumas povoações relevantes no comércio e até na ainda incipiente cultura, como Rio Grande, Pelotas e, claro, Rio Pardo.
E foi para essa cidade, às margens dos rios Jacuí e Pardo, que se encaminhou igualmente um estrangeiro, um alemão, Herrmann Rudolf Wendroth. Chegara ao Estado em 1851, na condição de mercenário, integrante da Legião Alemã contratada pelo governo imperial para lutar pelo Brasil na Guerra contra Rosas. Tão logo se desincumbiu dessa tarefa, foi a Porto Alegre. Ali passou a explorar suas habilidades como artista plástico, pintando paisagens e situações do cotidiano da capital, com seus 25 mil habitantes.
E então visitou Rio Pardo, aproveitando para também pintar essa cidade, a partir de um ponto à margem direita do Jacuí (a imagem que ilustra esta capa). Em primeiro plano está o Jacuí, pelo qual singram dois barcos, e uma fornalha erguida sobre a barranca. Do outro lado do rio, os casarios espraiam-se sobre a elevação, enquanto à esquerda sobe o braço do Rio Pardo, que dá nome à cidade, e que levaria à colônia de Santa Cruz, via Rio Pardinho, então recém-instalada. Sobre esse trecho há chuva. Ou seja, é praticamente essa a povoação com a qual se defrontaram os imigrantes alemães que vieram para Santa Cruz em 1849.
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Hoje, 170 anos após a sua elaboração, a gravura é uma janela aberta para o passado regional. E tudo graças à destreza artística de um viajante controvertido: os integrantes da Legião eram chamados de Brummers, o que, em tradução, significa resmungador, reclamão. Os Brummers, por serem mercenários, costumavam sempre estar insatisfeitos, e manifestá-lo.
Sobre Wendroth há poucas informações. Há apontamentos de que chegou ao Estado via Rio Grande, e de lá seguiu para Pelotas. Ali se envolveu em arruaças e foi preso, inclusive tendo registrado em desenho o ambiente no qual esteve confinado. Em Porto Alegre, elaborou aquarelas e desenhos belíssimos, que deixaram registro raro da paisagem da época, quase sempre fazendo-o a céu aberto. E esteve ainda no litoral norte, onde pintou Torres, e em Lavras do Sul, onde teria explorado ouro.
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Teria percorrido a região por quase uma década, e a hipótese é de que tenha falecido por volta de 1860 em Porto Alegre, ou em Buenos Aires, onde também teria andado, sem clareza sobre a sua idade. Após sua morte, seus desenhos teriam sido confiscados pelo exército e acabaram parando nas mãos de um certo F.A. Buhlmann, de Buenos Aires. Este ofereceu as peças a Dom Pedro II, apresentando-as como suas. Mas a autoria foi reconhecida por pessoas que foram pintadas por Wendroth, e ainda pela assinatura, cotejada com o contrato assinado como Brummer. Junto ao governo imperial, seus desenhos foram muito valorizados, pela qualidade, e incorporados ao Museu Nacional.
Só mais recentemente Wendroth teve seu nome e obra recuperados. Em 1982, a Rio Grande Companhia de Celulose do Sul (Riocell) patrocinou o volume Obras de Hermann Rudolf Wendroth – 1852, para oferecê-lo como presente de final de ano. A partir desse livro, em 1983, o folclorista Barbosa Lessa, quando era secretário estadual de Cultura, promoveu uma exposição de desenhos de Wendroth em Porto Alegre, e ainda uma edição do conjunto integral das obras, O Rio Grande do Sul em 1852: aquarelas de Hermann Rudolf Wendroth, com as lâminas, mais de uma centena, sendo impressas em formato maior, 40 x 50 cm. Entre elas, claro, está a imagem rara da paisagem de Rio Pardo em 1852.
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