A greve do magistério é um movimento justo e legítimo. Trata-se de uma categoria historicamente injustiçada que atingiu o ápice da desvalorização por dois motivos históricos: o descaso de sucessivos governos diante dos reais problemas destes profissionais e a condução equivocada das negociações por parte das lideranças.
O movimento atual, insuflado por propostas com impactos em todas as categorias do funcionalismo público, é mais um dos inúmeros protestos paredistas. Já se perdeu o total de greves e o número de dias de paralisação. Isso já foi incorporado à rotina escolar, ou seja, tornou-se “normal”, o que enfraqueceu o conjunto das reivindicação.
A revolta de homens, mulheres e jovens que dentro da sala de aula forjam as novas gerações é latente, corroborada pela ausência crônica de interlocutores oficiais que tenham capacidade de negociação. Aliás, esta é uma carência “dos dois lados do balcão”. Mal o diálogo se inicia e a radicalização se instala, inviabilizando as negociações.
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Historicamente os governos argumentam que é imprescindível implementar mudanças no plano de carreira do magistério. Isto é um dogma. A mais tênue manifestação neste sentido rompe qualquer possibilidade de convivência entre as duas partes. Nota-se, também, repetida insensibilidade por parte da direção da entidade que reúne os professores. Já entre os representantes oficiais inexistem agentes para desfazer os mal-entendidos e encetar um diálogo minimamente civilizado.
Vivenciei “na pele” a mais longa greve da história do Rio Grande do Sul na assessoria de comunicação do então secretário de Educação Bernardo de Souza no governo de Pedro Simon. Foram 97 dias de braços cruzados do magistério. Diversos segmentos da comunidade gaúcha se mobilizaram para buscar uma solução, sem sucesso.
A saída do então titular da então SEC foi uma das condições inegociáveis. Diante da negativa de Simon, Bernardo de Souza voluntariamente deixou a pasta, passando para, à época, Secretaria da Justiça e Segurança. O movimento se manteve por alguns dias e em seguida tudo voltou à normalidade.
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Com experiência de 40 anos de jornalismo acredito que o pacote do governador Eduardo Leite carece de aperfeiçoamentos, embora – deixo claro – não tenha conhecimento profundo do teor dos projetos de lei e da proposta de emenda constitucional (PEC) que deverá ser apreciada pela Assembleia Legislativa. A experiência mostra, ainda, que os deputados são suscetíveis à pressão das ruas e das corporações, mas as redes sociais são vigilantes e não dormem.
O dado inédito deste 2019 envolve um Estado em flagrante insolvência, um quase esfarelamento. Não há mais truques na manga do colete, como os depósitos judiciais. O ressarcimento da Lei Kandir é um devaneio, as receitas extraordinárias inexistem e os empréstimos internacionais são miragens. O pacote, talvez, não contemple as medidas e estratégias ideais para estancar o agravamento, mas algo precisava ser feito.
O Legislativo tem, entre as suas prerrogativas, o poder de melhorar as matérias que aportam no plenário. Agora, os parlamentares precisam promover uma cirurgia profunda, arquivando alquimias e lenitivos. O momento é grave, exige coragem e postura. A situação insustentável do Magistério não é a única, mas é, sem dúvida, a mais urgente.
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