Uma reivindicação antiga da cadeia produtiva do tabaco pode estar mais perto de se tornar realidade. Em entrevista exclusiva à Gazeta do Sul, a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, disse que está em discussão no órgão a possibilidade de acabar com o impedimento de fumicultores de fazerem financiamentos via Programa Nacional de Desenvolvimento da Agricultura Familiar (Pronaf).
Atualmente, para que possam acessar as linhas de crédito do programa, os produtores precisam comprovar que ao menos 25% de suas receitas são oriundas de outras culturas, que não o tabaco. A medida foi imposta como forma de estimular a diversificação nas propriedades, mas sempre foi considerada um tratamento desigual com o setor de tabaco e, na prática, dificulta que as famílias que têm no produto a principal fonte de renda obtenham recursos para investimentos. Em 2016, o Conselho Monetário Nacional (CMN) chegou a editar uma resolução prevendo aumento gradativo no percentual de comprovação, o que elevaria o índice para 50% na atual safra. Por pressão do setor, no entanto, os prazos acabaram postergados.
No cargo desde 1º de janeiro, Tereza Cristina já havia acenado com a flexibilização em conversas com dirigentes do setor. Na entrevista concedida por e-mail, ela reconheceu a importância da cadeia e defendeu que o governo dê apoio tanto para o produtor que optar por trocar de cultura quanto o que desejar permanecer no cultivo de tabaco.
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O assunto pode repercutir no lançamento da Expoagro Afubra 2019, que ocorre nesta sexta-feira, em Rio Pardo e contará com uma palestra do secretário nacional da Agricultura Familiar, Fernando Schwanke.
ENTREVISTA
Gazeta – A produção de tabaco sempre enfrentou resistências nos sucessivos governos por conta da pressão de movimentos antitabagistas. Qual a posição do atual governo em relação a essa cadeia?
Tereza Cristina – O cultivo de tabaco é legítimo e nossa pasta trata do assunto, desde 2003, na Câmara Setorial da Cadeia Produtiva do Tabaco, dando espaço para que os principais representantes de todos os elos se manifestem e proponham políticas. O tabaco ocupa 302 mil hectares e é o principal sustento de mais de 100 mil agricultores familiares.
Gazeta – É possível equilibrar as políticas públicas de combate ao consumo de cigarros com a manutenção da cadeia produtiva?
Tereza Cristina – É preciso separar uma coisa da outra. Uma coisa são as campanhas antitabagismo, outra é a produção de tabaco. É fato que o consumo mundial vem diminuindo e o próprio setor está se adequando e se antecipando a isso. Basta ver que metade das propriedades diversificam a produção e alcançam, com isso, rendimento 60% maior. Os fumicultores são muito bem organizados, como demonstra o fato de possuírem, inclusive, um sistema de seguro próprio.
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Gazeta – Nas últimas décadas, os governos levaram a cabo uma política de preço mínimo e tributação pesada sobre os cigarros, o que prejudica a cadeia. O que a senhora pensa sobre essa política?
Tereza Cristina – Precisamos olhar a cadeia toda, é claro. Mas nosso foco é o fumicultor. Como eu disse, a produção de tabaco está acompanhando a demanda. Apoiamos o fumicultor nessa atividade, se for de sua vontade, ou para que mude. Hoje, os produtores estão impedidos de acessar as linhas de crédito do Pronaf para o cultivo e esse é um assunto que está em discussão.
Gazeta – O contrabando de cigarros cresce assustadoramente no Brasil. O que falta para conter o mercado ilegal?
Tereza Cristina – O importante é enfrentarmos o comércio ilegal no País, que atinge não somente esse setor, mas outras atividades industriais também. Acho que uma medida muito importante que está entre as reformas prioritárias propostas por esta gestão é a tributária, que deverá contribuir para minimizar essa atividade que prejudica os brasileiros. Além, é claro, de reforçar o controle de nossas fronteiras. Não só perdem, com o comércio ilegal, os empresários ao enfrentar a competição desleal, como também os consumidores, que adquirem produtos sem qualidade, além da perda de arrecadação por parte dos governos federal e estadual, com impostos que deveriam ser revertidos em benefício da sociedade.
“Passaríamos a ser tratados como qualquer outra cadeia”
Segundo o presidente da Associação dos Fumicultores do Brasil (Afubra), Benício Werner, caso seja confirmada, a medida pode facilitar que produtores de tabaco façam investimentos importantes em suas propriedades, como em sistemas de irrigação – que protegem a produção em períodos de estiagem e reduzem o custo para o cultivo. Para ele, a liberação seria “um alento” para a cadeia. “Não é justo que o produtor não possa fazer financiamento para a atividade que é a sua principal”, disse. Werner alertou, no entanto, que a decisão pode depender de outros setores do governo além da Agricultura, como a área econômica.
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Já o presidente do Sindicato dos Trabalhadores Agricultores Familiares, Renato Goerck, observa que, embora existam hoje outras linhas de crédito que podem ser acessadas pelos fumicultores, as taxas de juros costumam ser bem mais altas que as praticadas no Pronaf, o que praticamente inviabiliza os financiamentos. Para Goerck, a flexibilização seria “uma grande vitória” para o setor e viabilizaria principalmente investimentos em tecnologia para as lavouras – como aquisição de geradores, por exemplo, em um cenário de carências no fornecimento de energia elétrica na zona rural . “Passaríamos a ser tratados como qualquer outra cadeia”, avaliou.
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