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FALANDO EM DINHEIRO

Francisco Teloeken: falta de dinheiro pode prejudicar decisões financeiras

De acordo com pesquisa realizada pelo Datafolha, nos dias 22 e 23 de junho deste ano, 63% das 2.556 pessoas entrevistadas, em 181 cidades, declararam não ganhar o necessário e ter problemas financeiros. Desse contingente, 37% disseram que o dinheiro da família não é suficiente; outros 26% afirmaram que ganham muito pouco. O dado mais cruel é que a quantidade de brasileiros que passam fome disparou nos últimos dois anos, atingindo cerca de 15% da população, o que corresponde a 33 milhões de brasileiros de barrigas vazias.

Em contrapartida, há poucos dias, o IBGE informou que a taxa de desemprego caiu para 9,8% no trimestre encerrado em maio, mas, mesmo assim, ainda são mais de 11 milhões de desempregados. Apesar do dado positivo – a volta de empregos -, a situação econômica continua difícil, principalmente para quem não tem renda nenhuma ou tem renda familiar de até dois salários mínimos. Além disso, do lado dos empregos, a média de salários está 7,2% menor em relação há um ano, e, do lado do consumo, principalmente dos itens básicos – alimentação, energia, transporte e combustível – a inflação está corroendo grande parte dos ganhos das pessoas.

Mas, como diz um ditado popular, “Nada é tão ruim que não possa piorar”. Com o orçamento apertado e já com dívidas, pode surgir um gasto inesperado com problema elétrico ou hidráulico no imóvel, a geladeira queimada ou o motor do carro fundido. As possibilidades são muitas. Nessas situações, o cérebro começa a pensar numa saída para enfrentar a despesa extra: tentar negociar um prazo de pagamento com o prestador de serviço, pagar o mínimo da próxima fatura do cartão de crédito, recorrer a algum parente para obter um empréstimo etc.

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Independente do que for fazer ou até não fazer nada, é fato que a preocupação e os esforços dispendidos para se livrar de apuros financeiros agem na mente das pessoas. É algo que os autores do livro Escassez – Uma nova Forma de Pensar a Falta de Recursos na Vida das Pessoas e nas Organizações, o cientista comportamental Eldar Shafir e o economista Sendhil Mallainathan, examinam na obra. Os escritores usam a expressão “banda larga mental” para ilustrar a capacidade cerebral em situações de sufoco financeiro ou outro qualquer.

Numa analogia com o computador que, com vários programas abertos, vai apresentar problemas de processamento, lentidão ou até travar, uma cabeça cheia de dificuldades ficará sobrecarregada e poderá tomar decisões ruins. Diz um dos autores, Shafir, que “a banda larga mental é muito limitada. Muitas vezes a pessoa precisa focar na urgência e, com competência, resolve o problema. Mas, se esse movimento ocorrer o tempo inteiro nunca será suficiente. Vai negligenciar outras áreas da sua vida”.

A inteligência prejudicada pode ser decisiva na tomada de decisões e, conforme os autores citados anteriormente, atinge mais as pessoas com menos recursos, com pouca margem para cometer erros. Pobreza e dívidas são geralmente atribuídas à falta de responsabilidade financeira e disciplina para poupar. Até o ministro da Economia do Brasil, Paulo Guedes, disse, numa entrevista, que “os ricos capitalizam seus recursos. Os pobres consomem tudo”. 

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Esta afirmação não se sustenta quando uma pesquisa recente do Serasa mostrou que 70% dos endividados com o cartão de crédito, maior segmento de dívidas, usaram essa forma de pagamento para comprar comida no supermercado. É claro que a Educação Financeira pode ser importante para melhor conduzir as finanças pessoais e familiares, mas a maior parte das pessoas ficou com o nome sujo para garantir necessidades básicas do dia a dia.

De acordo com Shafir, da Princeton, “de uma certa forma, nossa vida seria mais fácil se fosse verdade que os pobres merecem ser pobres porque não se esforçam o suficiente ou não tem capacidade. Mas não: pensando que há pessoas que acabam na pobreza mesmo que tenham mérito, capacidade e inteligência, a vida parece injusta”.  

Como diz Flávia Ávila, do InBehaviour Lab, “a pobreza afeta a sociedade como um todo: influencia questões econômicas, climáticas e até temas menos palpáveis. Está bem amadurecida a ideia de que a desigualdade social é prejudicial a sociedades que prosperam”. Por fim, o psicólogo Shafir acredita que “políticas públicas possam fazer diferença, com ações na educação, transporte ou mesmo uma renda mínima”. Ou seja, a garantia de padrões mínimos de vida pode aliviar a sobrecarga em cima da “banda larga mental” das pessoas mais pobres.

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São necessários – e ninguém pode ser contra – os auxílios concedidos a pessoas em risco até de sobrevivência, mas, como programas de governo, e não como tentativa escancarada e ilegal de “compra de votos”, na boca da urna, como, por exemplo, o pacote social, costurado às pressas e aprovado por Proposta de Emenda à Constituição (PEC) pelo Senado, na noite dessa quinta-feira, 30. O próprio ministro da economia, o ”liberal” Paulo Guedes, em tempos atrás apelidou a proposta de “bondades” do governo de “PEC Kamikaze”, devido aos riscos para as conta públicas.

Para driblar a legislação, que proíbe a criação ou ampliação de benefícios sociais em ano eleitoral, o relator da matéria propôs o reconhecimento do estado de emergência. Só agora, a três meses das eleições, o governo e os políticos foram se sensibilizar com as necessidades de alguns segmentos da população? Como dizia o falecido Marco Maciel, o problema é que “as consequências vêm depois”.

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