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FOTOS: o navio de Darwin está sob o comando do professor Jair Putzke

Professor construiu no interior de Vera Cruz uma réplica idêntica do barco utilizado pelo cientista britânico em sua expedição à América do Sul e às Ilhas Galápagos

O que faz um navio do século 19, com aproximadamente quatro metros de altura, em uma propriedade de Linha Número 1, interior de Vera Cruz? Trata-se de uma réplica fidedigna do HMS Beagle, embarcação em que o biólogo Charles Robert Darwin viajou durante cinco anos. O conhecimento científico adquirido na circum-navegação resultou no desenvolvimento da teoria da evolução das espécies, que modificou totalmente o entendimento do homem sobre a natureza.

A proeza é responsabilidade do professor Jair Putzke, entusiasta da educação ambiental. O principal objetivo da iniciativa é atrair a juventude para mostrar a importância da pesquisa científica e como as descobertas podem alterar proposições até então consideradas definitivas. A iniciativa foi viabilizada pelo projeto Rede de Saberes Articulando Ciência, Criatividade e Imaginação (Sacci), da Universidade Federal do Pampa (Unipampa). Putzke espera que o sonho realizado possa inspirar os estudantes, mostrando que cada um pode correr atrás e conseguir o que almeja.

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A réplica do HMS Beagle é uma forma de levar uma perspectiva diferente às escolas, para mostrar como os resultados da pesquisa científica demoram para ser obtidos e como existiam dificuldades que permanecem até hoje – como a obtenção de financiamento e estrutura logística. Além de ser um expoente científico, Charles Darwin dá um ar de proximidade, pelo fato de ter desenvolvido uma teoria revolucionária com base em observações feitas na América do Sul, incluindo o Brasil. “Além da atualização cartográfica, que era o objetivo principal, as primeiras previsões do tempo foram feitas a bordo do navio”, sublinha. A ciência atual revisa os conhecimentos acumulados e pavimenta a exploração de novos campos de pesquisa.

A embarcação, construída totalmente em madeira, conta com todos os compartimentos de acordo com a planta original. Putzke acredita que é necessário voltar a usar mais madeira, que retém gás carbônico, responsável pela maior parte da poluição atmosférica. A produção do metal aplicado na indústria exige a queima de muito desse material. “A madeira equivalente ao navio precisa ser queimada para produzir uma cadeira de metal”.

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Antes de chegar ao navio, os visitantes são convidados a passar por um labirinto em meio aos galpões da propriedade onde Putzke montou uma exposição com um pouco da história da evolução dos seres vivos. A mostra está há oito anos no espaço atual. De forma lúdica, as crianças podem ter contato, por exemplo, com reproduções de dinossauros. É uma viagem desde os primórdios do planeta Terra até os dias atuais. “As crianças podem interagir. Conseguem escavar para encontrar fósseis e podem pintar desenhos. A ideia é que aprendam utilizando todos os sentidos. Queremos estimular a curiosidade”.

Para Putzke, a educação ambiental deve ser trabalhada no sentido de deixar as crianças maravilhadas, para que possam esquecer, ao menos durante um tempo, todo o aparato tecnológico que as circunda.

A viagem de Darwin a bordo do HMS Beagle

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O jovem cientista britânico Charles Darwin, com 22 anos e recém-formado na Universidade de Cambridge, embarcou no brigue HMS Beagle em dezembro de 1831, no porto de Plymouth. Comandada por Robert Fitz Roy, a expedição tinha o objetivo de mapear a costa da América do Sul para atualizar as cartas náuticas britânicas.

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No Brasil, o navio aportou na Bahia e no Rio de Janeiro. Darwin observou uma mosca injetar os ovos em uma lagarta viva para que as larvas se alimentassem das entranhas. Ele questionou como um Deus bom poderia ter feito uma criatura tão cruel. O jovem também ficou chocado com o comércio de escravos, abolido na Inglaterra em 1808, ano em que a família real portuguesa fugiu para o Brasil, acossada pelo ataque de Napoleão Bonaparte.

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Na Patagônia, Charles Darwin percebeu um tipo de ema gigante ao norte e outro muito menor, ao Sul. Ele deduziu, pela semelhança, que uma espécie originou a outra e ambas tinham um ancestral em comum. Já nas Ilhas Galápagos, na região equatorial, Darwin encontrou pássaros com bicos diferentes, um para se alimentar de sementes e outro para comer cactos.

Observações moldaram a teoria das espécies

A aventura de Charles Darwin levou o jovem cientista a conclusões revolucionárias. A ideia de evolução gradual já era discutida na época, em contraponto às explicações criacionistas. Contudo, Darwin desvendou de que forma a evolução acontece. O cientista percebeu que, ao longo de gerações, as espécies sofreram mutações que se tornaram vantajosas de acordo com o meio em que viviam. Já os animais que não passaram por mutações e não se adaptaram ao meio deixaram de existir. Com a transmissão dos traços genéticos aos descendentes, houve uma evolução das espécies para se adaptar da melhor forma ao ambiente onde estão inseridas.

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A jornada terminou em outubro de 1836, após uma passagem pela Austrália. Darwin ainda mantinha a fé criacionista. Inclusive, ele chegou a estudar para se tornar padre. A percepção do cientista começou a mudar quando ele analisou ossos, carcaças, pedras e plantas coletadas na Oceania, com o auxílio de outros especialistas. A conclusão de que todas as espécies passaram por processos de adaptação durante milhares de anos deu origem ao livro A origem das espécies, publicado em 1859, que imortalizou o conceito de seleção natural. No ano anterior, o naturalista Alfred Russel Wallace havia escrito um ensaio com uma proposta bastante semelhante. A recepção foi controversa, com membros do clero ultrajados com a ideia de o homem e os macacos terem um ancestral comum. A partir de 1861, as ideias de Darwin sobre mutação, seleção natural e adaptação ao ambiente começaram a ser aceitas.

O HMS Beagle

Quem é o professor Jair Putzke?

Jair Putzke é vera-cruzense e tem 52 anos. O início dos estudos foi na Escola Municipal de Ensino Fundamental São Sebastião, em Linha Andréas. Ele lembra com carinho da primeira professora, Maria Olívia Kern, que lecionou durante 34 anos na escola.

Filho de pais agricultores, ele precisou ajudar na roça durante a infância e adolescência. Com o desejo de se tornar cientista, Jair teve de arrumar emprego para custear a faculdade. A formatura da graduação em Ciências Biológicas pela Unisc ocorreu em 1990. Ao mesmo tempo, o jovem pensava em ser piloto de avião. Um professor o alertou. “Para ser piloto, tu podes fazer um curso a qualquer momento. Para ser cientista, precisarás se dedicar e estudar muito.”

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Jair seguiu o conselho. Tornou-se mestre em 1994 pela Universidade Federal de Pernambuco ao estudar as plantas criptógamas, que se reproduzem por meio de esporos. O título de doutor em Botânica veio em 2003, pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Ele ainda pensa em fazer o pós-doutorado no exterior.

Após 25 anos como professor da Unisc, Jair é titular da Universidade Federal do Pampa, no campus de São Gabriel. Desde o início, sempre conciliou a docência com a pesquisa. Em 2017, quando se tornou concursado na Unipampa, passou a estruturar o setor de pesquisas biológicas na universidade. O sonho de se tornar piloto de avião virou realidade. Atualmente, Putzke guia ultraleves construídos por ele mesmo e decola de uma pista feita na propriedade em Vera Cruz.

O professor Jair junto ao timão do Beagle | Foto: Alencar da Rosa

Carreira dedicada aos fungos

Jair Putzke mantém uma linha de pesquisa na área de fungos, juntamente com a esposa Marisa e o ex-colega de Unisc, Andreas Köhler. “Minha trajetória como pesquisador é como micólogo, com foco em cogumelos, que podem ser utilizados para alimentação, produção de biomassa, papel e substâncias farmacêuticas”, explica. Cursos sobre fungos já foram ministrados por ele em países como Colômbia, Angola e Congo.

Outro perfil da pesquisa na área é a exigência de alguns países da ausência de fungos em determinados produtos, como o tabaco. Um laboratório na Unisc, sob responsabilidade técnica da professora Adriana Düpont Schneider, auxilia o SindiTabaco e Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) para manter a segurança do tabaco. “Esse trabalho, feito desde 1992, ajuda a garantir a exportação de US$ 1,5 bilhão”, ressalta Putzke.

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As pesquisas com cogumelos estão espalhadas pelo Brasil. Há acordos até na Universidade Federal de Viçosa, em Minas Gerais. Em fevereiro, Jair viaja para Goiás com o intuito de seguir um trabalho iniciado no Estado. Também existem estudos na Amazônia. No Rio Grande do Sul, muitos cogumelos encontrados no campo, de grande porte, são comestíveis. Todo mês de maio, cursos são ministrados em Gramado e Canela para a identificação de cogumelos. O Brasil, segundo Putzke, tem grande potencial de exportação, principalmente das variedades encontradas em matas de pinus e eucaliptos, livres de insetos, diferentemente do que ocorre na Europa. “É o trabalho de extensão acadêmica. As pessoas podem absorver o conhecimento e aplicar. Consumir 200 gramas de cogumelo seco por dia é o suficiente para alimentar um humano de 70 quilos diariamente.”

Uma das publicações do pesquisador

Trajetória de pesquisas na Antártida

A Antártida foi descoberta em 1820, em um período de diversas expedições que buscavam o domínio do continente gelado. Um estudo bastante recente aponta que o povo indígena maori, da Nova Zelândia, pode ter chegado ao local ainda no século 7. No início do século 19, os exploradores faziam uso da caça, principalmente de focas, leões-marinhos e baleias. Atualmente, além do degelo, a Antártida sofre com o acúmulo de lixo.

Desde 1961, o território de 14 milhões de quilômetros quadrados é administrado por um acordo internacional, que prevê uso compartilhado para fins científicos sem reivindicações territoriais – o que na prática não acontece, já que sete países buscam se apropriar de determinadas áreas. Ao todo, 29 países mantêm bases na Antártida. O Brasil conta com a Estação Científica Comandante Ferraz, reinaugurada em 14 de janeiro de 2020, com 4,5 mil metros quadrados e capacidade para 65 pesquisadores. Após um incêndio em 2012, a reconstrução custou quase 100 milhões de dólares, financiada pelos chineses.

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O professor Jair Putzke viaja desde 1986 para a Antártida. Já foram 1.175 dias por lá. Os principais estudos são os efeitos das mudanças climáticas. Ele experimenta a reação das plantas e de solos em relação ao clima extremamente frio e como é o desenvolvimento de determinadas espécies longe da interferência humana. É necessário fazer um treinamento de sobrevivência para passar uma temporada no continente. O entendimento da influência climática da Antártida no planeta teve a concepção no HMS Beagle, principalmente pelas correntes de vento e mudanças de temperatura.

Neste ano, Jair não embarcou com o grupo de pesquisa para o continente antártico, em viagem iniciada na semana retrasada. Ele preferiu não fazer parte da nova expedição pelo longo período de estadia, o que iria interferir nas responsabilidades dele junto à Unipampa. Com base nas pesquisas atuais, Putzke afirma que o mar antártico já está ao menos três graus mais quente.

Putzke durante uma de suas expedições ao continente antártico: pesquisador estuda os efeitos das mudanças climáticas no ambiente

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