Após o recuo das águas, moradores de Rio Pardo voltaram às residências no início desta semana. Foi a primeira vez que conseguiram acessar os imóveis para verificar o que restou. Mas, em muitos casos, havia pouco o que salvar. Na casa do pedreiro Mauro Machado, 60 anos, foi possível recuperar apenas algumas fotos – uma delas da sua infância – e a imagem de São Francisco. “Foi o que restou. Minha casa virou um grande nada”, lamentou.
Ele e a mãe Délcia Porto, 93, moravam há seis décadas no final da Praça da Ponte. Os quartos eram separados por um armário, completamente destruído pela força das águas. “Não vamos mais voltar”, disse enquanto olhava para um cômodo onde restos de mobília se aglomeraram. Logo, eles seriam atirados para uma enorme pilha de entulhos na frente da residência.
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O acúmulo de escombros era uma imagem recorrente nos pontos mais afetados. Na Rua Artur Segundo Resende, Bairro Bom Fim, os restos se espalharam pela via, dificultando o tráfego de veículos. Da esquina com a Rua Nicolau Matte Pessoa de Brum, a proprietária do Minimercado Reis, Ana Cristina Reis, observa a situação de amigos e clientes. “É desanimador”, lamentou. Embora tenha conseguido retirar móveis e mercadorias do estabelecimento antes de a água chegar, Ana tem certeza de que o recomeço não será fácil. “Estamos numa situação de calamidade, não vai ser como era antes.” A estimativa da Defesa Civil é de que 15.543 moradores saíram de suas casas. Há 551 desabrigados, encaminhados para os abrigos da Prefeitura.
Águas não levaram apenas bens materiais
Para a maioria dos rio-pardenses, as águas não destruíram apenas bens materiais. Elas levaram uma parte da vida e dos sonhos, deixando apenas dor, medo e incerteza. Com a lama e os entulhos dominando o interior das habitações, muitos não tinham mais o sentimento de possuir um lar. Jorgete Correia Paes, 50, vive há quase três décadas na Rua Nelson Franco Goulart, Bairro Bom Fim. A construção de dois pavimentos nunca havia sido atingida. Porém, após 27 anos, a água chegou ao segundo piso. Todos precisaram sair durante a madrugada, resgatados por um morador de barco após a filha, Keitlin Chagas, 26 anos, gritar por socorro da sacada.
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Retornar para casa após 11 dias não foi fácil. Móveis arrastados pela força da água ficaram em frente à porta de entrada. Um colchão foi parar no banheiro. Pela janela da cozinha avistou, no telhado do primeiro andar, um botijão de gás e uma galinha morta em meio aos destroços. Entretanto, nenhuma cena foi mais triste do que os danos provocados no lar que tanto lutou para construir. “Não são apenas bens materiais. Isso a gente recupera. Mas há uma história que se perdeu”, afirmou.
Temendo que enchentes como essa voltem a acontecer, Keitlin, que morava no primeiro andar da construção, decidiu que irá se mudar. Jorgete vai ficar. “Eu não tenho para onde ir, vou ter que ficar aqui. Foram muitos anos de luta e trabalho. Não sei quando, mas vou ter que voltar”, concluiu.
Foi perda total
Somado ao cenário catastrófico, as casas alagadas ficaram impregnadas pelo forte odor do esgoto e barro. Nem mesmo o uso de lava-jato e produtos de limpeza parecem eliminar o cheiro desagradável.
Morador da Rua Luciano Raul Panatieri, no Bairro Higino Leitão, o autônomo Cleo Santos, 57 anos, não vai mais voltar para sua residência com a esposa e três filhos. “Vou desmanchar e ver o que dá para aproveitar”, afirmou.
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Santos vive no endereço há 56 anos e jamais imaginava que seria afetado dessa maneira por uma cheia. Da antiga morada, salvaram apenas uma televisão, ventilador e roupas para as crianças. “Foi perda total”, exclamou.
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A poucos metros de onde mora, possui um imóvel de dois andares, que ficou totalmente submerso. Passou a tarde dessa terça limpando os cômodos do espaço, que será a nova casa da família. No segundo piso, que estava alugado, manchas nas paredes revelam o nível da água, que chegou até o teto. De lá, tirou somente uma mala, panelas e alguns objetos do inquilino.
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Ajuda de todo o país
Apesar da sensação de incerteza e impotência, os moradores de Rio Pardo não estão sozinhos. Doações de todo o País chegam diariamente ao centro de recebimento e distribuição. Já foram distribuídas 8.062 cestas básicas à população afetada e 31.540 refeições. Também foram entregues 209.571 litros de água.
Além do material, há 553 voluntários trabalhando no município. Parte deles veio de outras cidades para ajudar. Junto com eles, está um grupo de militares do 7o Batalhão de Infantaria Blindado (7º BIB).
Conforme o coordenador-geral da Defesa Civil municipal, tenente Dimas Gottardo, a expectativa é de que o nível dos rios continue baixando. O fornecimento de energia elétrica foi normalizado na área urbana, mas parte do interior continua desabastecida. Já a água está retornando gradualmente. A parte alta do Centro e dos bairros Ramiz Galvão e Boa Vista seguiam desabastecidas.
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