A tradição de colher peras nas ruas de Santa Cruz do Sul está prejudicada neste ano. Isso porque a produção foi escassa e as frutas, em geral, não apresentaram muita qualidade. Os moradores que cultivam o hábito de utilizá-las em doces, compotas e geleias tiveram que se contentar com uma quantidade menor dos quitutes em 2022.
Uma das vias ladeadas pelas pereiras na cidade, a Rua Coronel Oscar Jost, no Bairro Santo Inácio, é lar de muitas histórias envolvendo as árvores e seus frutos. Mercedes Soder, de 78 anos, lembra que adquiriu a sua casa no local há mais de 40 anos e, na época da mudança, as plantas já se encontravam lá. Inclusive, no passado, havia muito mais árvores ao longo da rua – com o tempo, algumas foram cortadas ou substituídas por outras espécies. Ela lamenta que neste ano a maioria das peras esteja machucada ou com o interior escurecido. “Elas estão todas pretas por dentro. Quando são bonitas, eu colho e faço uma sobremesa, uma chimia, mas esse ano não deu para aproveitar quase nada”, afirma.
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O pé de pera na calçada da residência está com o tronco ressecado e em parte oco, mas ainda produz frutos, que são aproveitados. A moradora recolheu dois baldes no mês passado para produzir a sua famosa chimia. Em um fogão de campanha montado no exterior da casa, Mercedes passou uma tarde mexendo o doce, mesmo com o calor intenso, mas reclama que apenas meio balde pôde ser usado. Ela diz não se importar com os pedestres que colhem as frutas, mas não gosta quando eles quebram os galhos da árvore ou deixam as peras que foram descartadas na calçada.
Na vizinhança também fica a casa da família de Isaura Hippler, que existe há mais de 60 anos no local. Atualmente morando em Santa Maria, ela visita a mãe todos os meses e tem como tradição fazer doces com a pera-pau, que é sua preferida. “Você pode cozinhar e ela não passa do ponto. Já a pera-manteiga vira geleia.” Neste ano as pereiras da calçada tiveram poucas frutas, e algumas que parecem suculentas por fora, quando cortadas, estão feias por dentro. Isaura conta também que no ano passado a quantidade de frutas era maior, mas que mesmo assim colheu algumas e viu outros santa-cruzenses recolhendo as peras. “Tem gente que vem de longe, de carro, e apanha baldes cheios. Eu imagino que devem ser pessoas que fazem doces ou compotas, porque pegam muito.”
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Para a moradora da Rua Rio Branco Maria Helena Werner Geller, cuja família reside há mais de 50 anos no local, as frutas já foram uma tradição mais importante. Ela relata que antigamente a família costumava aproveitar mais as peras, utilizando-as em geleias e em calda. “Dá muito trabalho para fazer o doce e também tem a questão do açúcar, que a gente tenta evitar hoje em dia. Se cuidar vale a pena”, comenta. A rotina com as pereiras inclui a colheita apenas para consumo ao natural e a limpeza diária das calçadas durante o período em que as frutas estão maduras.
As más condições das peras em Santa Cruz do Sul não são causadas pelo período de estiagem. De acordo com o engenheiro agrônomo Assilo Martins Corrêa Júnior, chefe do escritório da Emater/RS-Ascar no município, apesar do calor e da falta de chuva terem impacto, o principal fator foi o inverno mais ameno no ano passado. Nos anos de inverno rigoroso, a produção é boa, mas quando há menos frio, a planta não atinge as horas necessárias de hibernação e a produção fica abaixo do esperado.
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“Culturas de clima temperado como a pera exigem uma quantidade de horas de frio hibernal, que é abaixo de 7 graus. Precisa de ainda mais tempo em relação a outras culturas, como o pêssego, por exemplo. Nisso temos uma limitação de horas de frio para elas aqui na região”, explica. Esse é o motivo pelo qual a maioria das peras vendidas em supermercados seja importada de países mais frios, como a Argentina. O engenheiro agrônomo destaca que existem estudos e trabalhos de pesquisa para cultivar plantas mais adaptadas ao clima da nossa região, mas ainda nada em nível comercial.
Outra causa, segundo Assilo, é a idade das árvores, que são mais antigas e não passam por nenhum tipo de manejo. Além do clima, a questão nutricional pode afetar a qualidade das frutas e o aparecimento de fungos, por estar plantada na calçada e com pavimentação no entorno, o que prejudica a reposição de nutrientes. Ele alerta que os moradores devem ficar atentos aos cuidados com essas árvores, que devem passar por tratamentos nos períodos recomendados para a cultura, exigindo podas e adubação.
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Além das peras, outras frutas comuns no período do início do ano estão disponíveis para compra nas feiras rurais. Conforme o presidente da Associação dos Feirantes de Santa Cruz do Sul (Assafe), Carlos Eduardo Waechter, as peras estão disponíveis nas feiras, mas há pouca produção.
“Agora começa a produção de caquis e no mês de março, a de goiabas. As frutas são do próprio município e colhidas praticamente no dia”, garante. Para Waechter, a estiagem diminui a oferta, mas não a qualidade dos produtos, já que as frutas estão mais doces em razão da incidência do sol.
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A fruta tem origem asiática, tendo surgido na China, e conta com cerca de 20 variedades cultivadas no mundo todo. Em Santa Cruz do Sul as mais comuns são a pera-manteiga (Pyrus communis) e a pera-pau, também conhecida como pera dura (Pyrus pyrifolia). A pera-manteiga, mais suculenta, é usada na culinária, na fabricação de geleias, compotas, sorvetes e outros doces. Já a pera-pau é mais utilizada em sobremesas, em calda, e pode ser consumida in natura, pois possui polpa crocante.
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