Em 1826 o ex-militar e inventor francês Joseph Nicéphore Niépce (1765-1833) conseguiu um feito que entrou para a história das comunicações. Após anos e anos de pesquisas, desenvolveu uma câmera escura de madeira, com um orifício pelo qual a luz exterior projetava-se sobre uma placa de cobre embebida em produtos químicos, instalada dentro da engenhoca. Niépce então posicionou seu caixote em uma janela e, após oito horas de exposição, obteve a reprodução do cenário exterior sobre a chapa de cobre. Batizada de Vista da Janela em Le Gras, a imagem existe até hoje e, com uma dose de boa vontade, é possível reconhecer entre seus borrões os contornos do quintal de Niépce, espremido entre as construções vizinhas.
O resultado do experimento, que o inventor chamou de heliografia, é considerado hoje a primeira fotografia permanente feita no mundo – pois as tentativas anteriores não tiveram a mesma durabilidade. A partir dela, a arte da fotografia se desenvolveu rápido – pelo menos, para os padrões do século 19 – e em 1888 surgiu a câmera Kodak, produzida e comercializada em escala industrial. A primeira Kodak, uma caixa de metal equipada com um rolo de filme de cem poses, era oferecida em anúncios de jornal com o slogan “aperte o botão, nós fazemos o resto”. Quando o filme acabava, o cliente remetia o caixote à fábrica, que ampliava as fotos, recarregava a câmera e a devolvia ao freguês. E, de lá para cá, todos sabemos o quanto as câmeras fotográficas evoluíram e no que se tornaram.
A fotografia está, ao meu ver, entre as mais incríveis e maravilhosas descobertas do homem. Não só pelo que possibilitou no universo das comunicações, mas também por servir como adendo a nossa memória. A foto nos permite recuperar cenas e fatos que nosso cérebro, por conta do excessivo volume de informações com as quais precisa lidar, já havia despachado para o arquivo morto. Equivale a dizer que a foto nos ajuda a recordar de bons momentos que, por força do tempo e da rotina, esquecemos. E quem tem filhos sabe o quanto recordar é benéfico.
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Dias atrás reencontrei, nos recôncavos do HD de meu computador, fotos de família tiradas há uns cinco anos. No mundo adulto, meia década é um período curto, contudo, para as crianças é uma eternidade, mensurável pelo quanto elas crescem e desenvolvem-se nesse meio-tempo. São mudanças que, no que têm de gradativas, passam-nos despercebidas na rotina do dia a dia. Contudo, quando escancaradas pela fotografia, são chocantes.
Em uma dessas fotos, Yasmin e Ágatha dividem uma cuia de mate doce diante de uma lareira acesa. Ágatha, então com 2 aninhos, era, obviamente, beeeem menor do que hoje. Mas o que mais me impressionou na fotografia foram seus cabelos, que recém chegavam na altura das orelhas e que, de tão cacheados, renderam-lhe, à época, o apelido de Cabelo-de-Mola. Lembrei-me então do quanto ela gostava desse apelido, orgulhosa de seus cachinhos, que foram crescendo e alisando-se ao natural com o passar do tempo. E o que dizer dos dois mais velhos, a Isadora e o Júnior, que de crianças transformaram-se em adolescentes/jovens no período e, hoje, rivalizam comigo e com a Patrícia no quesito de altura.
E, enquanto eu olhava as fotos, uma ruidosa plateia formou-se ao meu redor. Eram as crianças, que a cada foto, teciam comentários do tipo:
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– Que olhos arregalados, Isa… se assustou com a câmera?
– E olha a pose da Yasmin… se achando uma modelo…
– Olha que legal… já tinha esquecido desse passeio…
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– O que é aquilo atrás da gente? Um alienígena?
Até que surgiu uma foto um pouco mais antiga, de um recém-nascido, e Ágatha quis saber:
– Quem é esse carecão?
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Patrícia, então, viu a foto e a identificou:
– És tu mesma, Ágatha.
– Mas não se parece nada comigo… – retrucou a caçula, desconfiada. – Como pode ter tanta certeza de que sou eu, e não uma das outras gurias?
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– Ora… porque sou mãe, e mães sempre sabem essas coisas – foi a resposta, evidente, incontestável e suficiente para convencê-la.
O mais chocante, ao ver essas fotos e outras mais antigas, é verificar como o tempo passa rápido e, com ele, a infância das crianças, que crescem em um estalar de dedos. Ver essas fotos faz-nos sentir como aqueles tios e tias que, por distâncias ou outros fatores, demoram a rever seus sobrinhos e, quando o fazem, já quase não os reconhecem, de tanto que cresceram. É surpreendente.
De experiências como essa tiro, ao menos, dois ensinamentos.
O primeiro é que devemos curtir ao máximo essa fase da vida das crianças, e deixar que elas a curtam, pois passa muito rápido.
O segundo é que vale a pena fotografar nossos filhos o máximo possível, em suas mais diferentes brincadeiras e traquinagens. É uma forma de preservar boas recordações que nosso cérebro, sempre muito atarefado, pode acabar engavetando. Vale muito a pena, principalmente nos dias de hoje, quando já não é necessário despachar a câmera para a Kodak revelar.
Enfim… aposto que, se o diligente Joseph Niépce ainda estivesse entre nós, certamente nos daria esse conselho:
– Fotografem, mes amis, fotografem!
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