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“Foi a maior façanha”, diz autor de livro sobre a presença da FEB na Segunda Guerra Mundial

Foto: Bruno Pedry/Banco de Imagens

“Foi a maior façanha”, diz autor de livro sobre a presença da FEB na Segunda Guerra Mundial

O militar santa-cruzense Sirio Sebastião Fröhlich atualmente está radicado em Brasília

Com seu livro Vozes da guerra, o santa-cruzense Sirio Sebastião Fröhlich, 59 anos, deu uma das mais importantes contribuições para o resgate e a fixação da memória da participação da Força Expedicionária Brasileira (FEB) na luta contra a Alemanha nazista e os países do Eixo. Ao se dedicar a recolher depoimentos de ex-combatentes, que estiveram no teatro de operações, privilegiou o ponto de vista de quem efetivamente representou a nação brasileira no conflito. Não ficou apenas no relato histórico puro e simples, mas humanizou essa experiência.

Mais: também se preocupou em visitar a Itália e percorrer regiões nas quais os pracinhas brasileiros lutaram e onde 465 perderam a vida. Visitou 28 cidades e vilas por onde os integrantes da FEB cruzaram. E constatou, emocionado, que, por onde quer que eles tenham passado, deixaram uma lembrança viva de humanismo e de apoio e carinho para com a população italiana, duramente afetada pelo conflito, com suas casas e cidades arrasadas e por vezes passando fome e frio.

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Antes de Vozes de guerra, já havia se dedicado a pesquisar sobre a presença dos expedicionários brasileiros na Segunda Guerra Mundial para seu livro A longa jornada: com a FEB na Itália. Mais recentemente, em 2022, lançou Azul da paz – BRAENGCOY – Construindo a paz no Haiti, no qual tematiza a Missão de Paz empreendida na nação do Caribe (e que ele próprio integrou).

Nascido em Santa Cruz, mas de família estabelecida em Entre Rios, interior de Vera Cruz, Fröhlich reside em Brasília. Em sua formação, em 1987 concluiu o curso de Comunicações na Escola de Sargentos das Armas, e passou a atuar na área. Por ela, depois de passagens por diferentes regiões nacionais, chegou ao Gabinete do Comandante do Exército, na capital federal.

Entrevista – Sirio Sebastião Fröhlich | Militar, escritor e pesquisador

  • Gazeta do Sul – Passadas oito décadas desde a mobilização e a ida da Força Expedicionária Brasileira (FEB) à Itália, a sociedade atual tem presente a importância dessa ação? É o momento de salientar de novo a grandeza desse gesto? Não! A resposta à primeira questão é taxativa. Entretanto, não culpo a sociedade por não compreender a importância do tema; na verdade, ele nunca foi tratado com o justo destaque no ensino brasileiro. Frequentei salas de aula por 17 anos e nada ouvi sobre a FEB na minha formação civil. Acredito ser apropriado salientarmos a relevância do tema após 80 anos; a História é cíclica, e o povo que não aprende com os erros do passado está fadado a repeti-los. Talvez por ignorar ou ter esquecido esses ensinamentos, o mundo não está percebendo que alguns conflitos regionais podem desencadear outra guerra de dimensão global.
  • O que mais diretamente motivou o senhor a fazer essa série de entrevistas com ex-combatentes e a elaborar o livro com esse ponto de vista? Quando eu trabalhava em Santa Maria, entre as minhas funções estava a de buscar os veteranos em suas residências para que participassem dos desfiles militares. Durante um deles, ouvi um menino questionando quem eram aqueles velhinhos e por que estavam ali. Como eu havia me tornado amigo de vários deles, resolvi dar-lhes a oportunidade de contarem as suas histórias. Dessas entrevistas resultou Longa jornada: com a FEB na Itália, em 2010. Os 2 mil exemplares foram distribuídos gratuitamente a escolas, bibliotecas, pracinhas e alunos da região central do Rio Grande do Sul. Posteriormente, ouvi mais algumas dezenas de pracinhas pelo Brasil. Todos esses depoimentos estão em Vozes da guerra, publicado em 2015.
  • Por sinal, os combatentes são carinhosamente conhecidos como “pracinhas”. O que motivou tal alcunha? Soldados e demais graduados do Exército compõem o círculo das praças. Como a maior parte do efetivo da FEB era de praças, convencionou-se chamá-los afetuosamente de pracinhas, sobretudo os mais jovens. A FEB é tida como um divisor de águas no quesito relacionamento humano no Exército, posto que, na guerra, a vida de oficiais e graduados dependia diretamente dos soldados que combatiam ao seu lado. Esse vínculo tornou-se sólido a ponto de se sentirem integrantes de uma irmandade, com base na hierarquia e na disciplina e, sobretudo, no respeito mútuo; muitos oficiais não só aceitavam, mas também gostavam de ser chamados de pracinhas.
  • Sem que talvez muitos o saibam, Santa Cruz do Sul também teve participação nesse processo, não é? Como isso ocorreu? Sim! Por ocasião da transferência do 3º Batalhão do 7º Regimento de Infantaria de Santa Maria para Santa Cruz do Sul, nos primeiros anos da década de 1940, o efetivo acompanhou a unidade. Existem relatos bem interessantes dos soldados que ajudaram a construir o quartel onde hoje está o 7º BIB e que, na época, ficava nos limites do núcleo urbano. A relação de 66 militares que serviram em Santa Cruz e seguiram para os campos da Itália foi afixada em um memorial inaugurado em 2004, no então 8º BIMtz. Infelizmente, não conheço o número exato de santa-cruzenses que participaram da 2º GM.
  • Mais do que ouvir os relatos dos ex-pracinhas, o senhor foi à Itália. O que o motivou a fazer essa visita e como foi essa experiência? Nas entrevistas que embasaram Vozes da guerra, as palavras mais citadas foram “liberatori” e solidariedade. O termo “liberatori” me intrigava, porque libertadores é uma palavra muito forte e remete à restituição da liberdade. Para mim era importante compreender o sentido dessa palavra para os “libertados”. Na Itália, nos caminhos que nossos soldados percorreram, ao ouvir a voz embargada pela emoção e ver o brilho no olhar, ao saberem que eu integrava o exército daqueles soldados que lhes deram comida e solidariedade em 1944/45, compreendi o exato sentido da palavra italiana que eu tanto ouvira. Por tudo isso, a experiência foi especial, e ouvir a Canção do Expedicionário na voz de crianças italianas fechou com chave de ouro a viagem em busca do exato sentido da palavra “liberatori”.
  • Pode-se dizer que a FEB foi uma das maiores façanhas militares do Brasil? Por que segue e deve seguir nos orgulhando enquanto brasileiros? No século 20, foi a maior. Apesar de o Brasil ter participado da Primeira Guerra Mundial, pela magnitude do evento e do efetivo envolvido, a FEB e a Segunda Guerra tiveram mais destaque. Devemos nos orgulhar porque foi lá que o soldado brasileiro, superando as adversidades impostas pelo clima e por tropas adaptadas ao terreno e mais experientes, mostrou sua coragem e determinação. Dentre as ações, destaco as tomadas de Monte Castelo, Montese e Forvovo di Taro; na última, a FEB aprisionou uma divisão alemã com mais de 15 mil homens, feito único entre os Aliados. Também foi na Itália que surgiu a mística da solidariedade brasileira que faz a diferença em missões de paz da ONU pelo mundo. A FEB serviu de exemplo na questão racial: enquanto indígenas, brancos e negros lutavam lado a lado, na tropa dos EUA havia segregação explícita. Como exemplo, menciono a 92ª Divisão de Infantaria Americana, composta por negros, que podiam ocupar funções de comando até o nível intermediário; contudo, os postos de comando superiores eram ocupados por oficiais brancos. A evolução nessa conduta pôde ser observada a partir das guerras da Coreia e do Vietnã. Por fim, ressalto que uma tropa que desempenhou bem a sua função operacional e foi exemplo de solidariedade e de integração, e tem o reconhecimento e o respeito dos italianos, merece maior reconhecimento dos brasileiros.

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