Já passavam das 20h30 do último dia 27 de junho. William Mateus Timm, de 21 anos, assistia a um filme na casa da sogra, em Linha Fundinho, Rincão da Serra, interior de Vera Cruz, junto à namorada Teyla e ao primo dela, Henrique, quando ouviu o chamado do pai, Gilson Celmar Timm, de 43 anos. A tensão tomou conta do ambiente dentro da residência. Cautelosamente, o jovem saiu para fora. O relato do que teria acontecido a seguir é do próprio William, que falou com exclusividade à Gazeta do Sul.
“Eu ia acabar morrendo naquela noite nas mãos do meu pai, pois jamais ia ter coragem de tirar a arma dele e matá-lo. Se não fosse ele a morrer aquele dia, com certeza seria eu ou a minha mãe.”
– William Mateus, filho de Gilson Celmar Timm
O relato
William conta que, naquela noite de 27 de junho, logo percebeu que o pai estava alterado. Pensou que talvez fosse pelas horas que ele teria passado bebendo cerveja em frente a um posto de gasolina, no Centro, na mesma tarde – fato flagrado pelo rapaz. Na rua, William se aproximou de Gilson, que baixou o vidro da porta de seu carro vermelho para conversar.
Publicidade
Conforme o relato de William, o pai teria, então, lhe pedido que retirasse uma queixa registrada contra ele na polícia, em 7 de junho deste ano. Naquele dia, Gilson havia disparado tiros de revólver contra a mesma casa na qual ambos agora conversavam, devido a um desentendimento familiar. Na ocasião, a arma que ele utilizou, com número de série raspado, foi apreendida. O empresário foi preso em flagrante e encaminhado ao Presídio Regional de Santa Cruz do Sul, sendo liberado apenas no dia 12 de junho.
Gilson teria argumentado que gastaria muito com advogados durante o processo. Também questionou os motivos que levaram William a denunciá-lo e arrematou que não aceitava isso do próprio filho. O jovem de 21 anos assustou-se quando o pai desceu do veículo e passou a gritar, a bater no próprio carro e a caminhar, em idas e vindas, rumo a um terreno baldio – cena presenciada por um vizinho.
Por fim, Gilson afirmou ao filho que não poderia estar ali, devido à medida protetiva emitida após a ocorrência do dia 7, e iria esperá-lo na fábrica de barcos da qual era dono, em Linha Ferraz, em até dez minutos. De acordo com o relato do jovem, ele teria ameaçado: se o filho não comparecesse, mataria a mãe de William, Angela Terezinha Freese, de 40 anos. Logo depois, em disparada, foi embora no carro vermelho.
Publicidade
OUÇA: PODCAST: os mistérios que rondam a morte de um empresário de Vera Cruz
William lembra que, desnorteado pela situação, entrou na casa da sogra e contou o ocorrido. Sem saber o que fazer, disse que iria até a fábrica onde o pai estaria à sua espera. Foi quando o primo da namorada Teyla, Henrique, de 19 anos, afirmou que iria junto.
Na picape Saveiro de William, a dupla se deslocou até a fábrica de barcos, no quilômetro 323 da RSC-153 – a três quilômetros do entroncamento com a RSC-287. Quando chegaram lá, já por volta das 21h15, Gilson os teria recebido aos gritos, junto ao pavilhão da fábrica: “Tu acabou com a minha vida me colocando na cadeia! Eu sofri muito lá!”.
Publicidade
William tentou acalmá-lo: “Calma, pai. A gente vai resolver tudo isso”. E a resposta teria sido “Não! Daqui desse pátio hoje vocês não vão sair!”. William afirma ter logo percebido que o pai estava com um revólver na cintura. Em dado momento, Gilson teria sacado a arma. O filho então jogou-se sobre ele, segurando a mão que empunhava o revólver, o qual disparou contra o chão.
Em seguida, o jovem conseguiu empurrar a arma para longe. Instantes depois, ele escutou novos gritos: “Sai, William, sai!”. Era Henrique, que estaria apontando a mesma arma para Gilson Celmar Timm. Em um lance muito rápido, quatro disparos foram efetuados na direção do empresário. O primeiro acertou-o no rosto; o segundo, no peito. Após Gilson cambalear, outros dois disparos o atingiram nas costas.
“O Henrique foi o meu anjo da guarda”
O relato acima foi concedido por William Mateus Timm à Gazeta do Sul ainda no dia 18 de julho. Na oportunidade, porém, o jovem de 21 anos solicitou que a entrevista não fosse divulgada, a fim de preservar a investigação a cargo da Polícia Civil. Entretanto, nessa sexta-feira ele mudou de ideia e autorizou a veiculação.
Publicidade
Argumentou que está assustado com boatos que circulam em Vera Cruz acerca de seu envolvimento na morte do pai e disse temer pela própria vida, pois estaria sendo ameaçado. O relato coincide com o depoimento que deu à Polícia Civil. De acordo com Wiliam, antes do jantar realizado na casa da sogra na fatídica noite, ele e Henrique não haviam tido maior contato. “Eu o conhecia por ser primo da minha namorada, mas até a janta, não tínhamos conversado muito”, ressalta o filho de Gilson Timm.
O rapaz atribui ao primo da namorada o fato de estar vivo. “O Henrique foi meu anjo da guarda, porque ele me salvou naquele momento. Eu ia acabar morrendo naquela noite nas mãos do meu pai, pois jamais ia ter coragem de tirar a arma dele e matá-lo. Se não fosse ele a morrer aquele dia, com certeza seria eu ou a minha mãe.”
William Mateus diz que se apavorou ao ver o pai sem vida. “Levantamos a possibilidade de levá-lo ao hospital. Nós o arrastamos até o portão do terreno, mas vimos que não tinha mais sinal de vida, e o deixamos ali”, conta o jovem, que trabalha em uma loja de autopeças de Vera Cruz. “Naquele momento, o Henrique subiu para Herveiras e eu já fui direto para a casa da minha mãe, contar o ocorrido”, complementa.
Publicidade
A mãe de William, Angela Terezinha Freese, por sua vez, foi até a Brigada Militar relatar a ocorrência. Ela foi à fábrica junto com os PMs para fazer o reconhecimento do corpo do ex-marido.
Ex-mulher relata vida difícil com o marido
Para complementar o relato, William e Angela receberam a Gazeta do Sul a tarde dessa sexta-feira, na residência onde moram, no Bairro Conventos. Eles mostraram locais onde havia marcas de balas, que teriam sido feitas por Gilson Timm com o revólver apreendido pela BM no dia 7 de junho.
“Ele batia em mim, saía com outras mulheres e muitas foram as vezes que ele estava bêbado e disparou dentro de casa. Não era uma vida fácil. A gente não se dava bem.”
Angela Freese, ex-mulher de Gilson Celmar Timm
De acordo com mãe e filho, após a apreensão desse revólver, Gilson Celmar teria adquirido outro no intervalo entre o dia da soltura da prisão, em 12 de junho, e da morte, em 27 de junho. A procedência dessa arma – a mesma que matou o empresário – está sendo investigada pela Polícia Civil.
LEIA MAIS: Polícia investiga origem da arma que matou empresário em Vera Cruz
Angela, que é costureira, possuía medida protetiva contra Gilson. Abalada, falou da relação que tinha com o ex-marido. “Ele batia em mim, saía com outras mulheres e muitas foram as vezes que ele estava bêbado e disparou dentro de casa. Não era uma vida fácil. A gente não se dava bem”, limitou-se a dizer.
Conforme William, a relação entre ele e o pai já havia sido boa. Fãs de corridas de motocross, Gilson acompanhava o rapaz em todas as provas das quais ele participava há cerca de seis anos. Foi em um treino, no último dia 30 de maio, aniversário de William, que essa relação começou a mudar.
“A minha moto estava com o freio danificado, aí perdi um treino. Ele estava bem bêbado no dia, falou que eu só colocava desculpas na moto e não servia mais para ele como piloto. Desde esse treino, ele se alterou muito. Queria apedrejar meu carro e amigos dele tiveram que segurá-lo, pois estava armado e poderia ter feito algo naquele dia mesmo.”
O empresário teria feito um tratamento para parar com a bebida e conseguiu, por um certo período. No entanto, voltou a beber depois de um tempo. “Sem mais nem menos, disse que a vida dele estava dando errado e iria voltar a beber”, comentou o filho. Gilson também estaria tomando remédios para depressão. A fábrica de barcos da qual era proprietário estaria em vias de fechar, com R$ 180 mil em dívidas.
“Meu pai sempre foi muito bom para mim, só que o ponto fraco era a bebida. Quando bebia, se transformava em um demônio. Estava passando por um momento em que era uma bomba prestes a explodir e poderia fazer qualquer coisa com a vida dele e de sua família.”
“NAS MÃOS DE DEUS”
A repercussão do caso na região, sobretudo em Vera Cruz, assustou William Mateus e Angela Freese, que temem represálias por parte de amigos do pai. “Graças a Deus não fui demitido, mas estamos muito abalados pela repercussão que vem tendo. Venho recebendo várias ameaças, tanto no WhatsApp como pessoalmente”, disse William, que mencionou um caso da última semana.
“Um dia desses, fui entregar uma peça em uma mecânica e fui chamado de assassino. Não revidei, saí bem quieto, e registrei na polícia. É uma situação muito ruim, pois as pessoas ouvem boatos, ficam falando, aumentam e acabam distorcendo os fatos”, ressaltou. Sobre as investigações, afirma esperar que a justiça seja feita.
“Estou ajudando ao máximo nas investigações. Eu sempre coloquei nas mãos de Deus, então, acredito que Ele será justo nessa hora. Nunca pensei que teria de passar por um momento desses, como perder meu pai e ser culpado por isso. Só espero que a justiça seja feita à risca, por mim, que não cometi crime, e pelo Henrique, que naquela hora me salvou. Se não fosse ele, tenho certeza de que não estaríamos aqui.”
LEIA MAIS
Polícia manda exumar o corpo de empresário assassinado em Vera Cruz
Caso Timm está próximo do desfecho