Era uma vez um reino distante. Terra promissora, as pessoas e os negócios prosperavam. As fronteiras se expandiam dia a dia até que, repentinamente, uma inesperada escuridão encobriu todo o império.
– Tenham calma! – recomendavam os mensageiros aos súditos do rei. – Logo vai passar e a luz nos devolverá a vida normal. Mas por enquanto fiquem no seu refúgio para não se exporem aos riscos e às emboscadas da escuridão.
Intimidados, e sem saberem ao certo o que e por que isso estava acontecendo, os vassalos trataram de se recolher.
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A noite, porém, se prolongou por semanas, meses e mais meses, e ninguém mais suportava a vida em meio àquele breu. Nem o rei.
Então ele enviou mensageiros a todos os cantos dos seus domínios, mesmo os mais distantes, e marcou uma data para que todos pudessem – ou melhor, devessem – sair do seu abrigo para se dirigir a um povoado próximo. Não a passeio, nem a trabalho, mas para selar um pacto de fidelidade, efetuando o pagamento dos impostos devidos. Afinal, os pilares que sustentam o império são os tributos que os vassalos – alguns resignados, outros orgulhosos do seu gesto – oferecem para manter e fortalecer o domínio.
Houve quem arriscasse um protesto:
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– Nos disseram que é perigoso sair do abrigo. Não vamos enxergar nada e podemos nos perder e nos ferir ao longo do caminho. Muitos dos nossos já caíram nos precipícios.
Os mensageiros se apressaram em tranquilizar os servos:
– Para este dia providenciaremos luzes, muitas luzes, para que ninguém ande no escuro. O rei não se importa quanto vai custar, mas a todos garante total segurança.
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Ao que se sabe, houve, de fato, uma grande movimentação por todo o reino na data marcada. Sobre a peregrinação de retorno dos súditos, ainda não há informação. Nem como seguiu a vida em meio à escuridão depois daquele dia. Mas sua majestade e toda a corte estavam radiantes. O castelo continuaria iluminado por muito tempo.
***
Ficção à parte (ou nem tanto), me sinto dominado por uma estranha sensação. Como se uma força maior, não identificada, me encobrisse a cabeça com um capuz de incertezas. Em algum momento a escuridão dos radicalismos, dos preconceitos, da intolerância, da ambição, da violência de toda ordem, haverá de se dissipar?
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Imagine que todos somos um ponto de referência no universo: de luz ou de escuridão. Mesmo que haja amplo predomínio de almas boas – gente honesta, trabalhadora, solidária, cumpridora de seus deveres e que irradia luz ao seu redor – temo que nos falte energia. Quantos pequenos pontos de luz são necessários para quebrar a barreira das trevas, alicerçada sobre a corrupção, a ambição pelo poder a qualquer preço, sobre interesses escusos de toda ordem?
Para não nos deixarmos desperançar, resta acreditar em outra forma de ver este cenário: mesmo que o ambiente seja de escuridão, uma luz, por mais tênue, sempre será percebida. E como farol para o náufrago, será um ponto de referência no horizonte. E de esperança.
Não deixemos que nossa luz se apague!
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