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Fechamento escolar, sofrimento infantil

O papel da escola hoje vai muito além de apenas escolarizar. Ela serve de guarda para as crianças enquanto pais trabalham, produzem e mantêm a cidade funcionando. Ela alimenta crianças carentes. Nutre afeto entre alunos e professores, num processo de socialização que é a pedra fundamental da convivência. Ela protege ao identificar alunos vítimas de negligência e de violência doméstica. A escola, antes de todos, auxilia no diagnóstico precoce de transtornos mentais graves, que podem fazer toda a diferença na vida da criança, como na depressão, autismo, TDAH e suicídio. A escola, junto à família, é o fator mais definidor do futuro da criança. Fechá-la é arriscar tudo isso.

Nenhum lugar do mundo ficou tanto tempo sem escola. Talvez porque em outros países a educação é essencial há décadas. No RS, a educação só é essencial há alguns dias. O impacto no desenvolvimento neuropsicomotor e no comportamento das crianças causado pelos decretos que as impediram e impedem de frequentar o ambiente escolar ainda não é plenamente conhecido. Mas o que já sabemos, assusta. E muito.

Há relatos de aumentos expressivos no tempo de exposição a telas (celular, tablets, computadores, TV e videogames) que sempre tiveram recomendação para limitar seu uso entre as crianças. Hoje, seja pela aula remota, seja pela solidão ou restrição de atividades externas, o tempo de uso desses aparelhos explodiu. E as consequências são temerárias, pois alteram a biologia cerebral ao reduzir tempo de sono, dificultar o desenvolvimento de habilidades sociais e contribuir para o aumento já assustador do sedentarismo e obesidade infantil.

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Ao contrário do que se possa pensar, crianças não têm estrutura cerebral amadurecida o suficiente para acompanhar aulas remotas de carga horária plena, mantendo-se engajadas e motivadas para as atividades. Submetê-las a isso é tortura. Não só para elas, mas também para pais e cuidadores, que se veem perdidos entre auxiliar os filhos não tendo preparo, paciência ou habilidade para tal e dar conta de suas demandas da vida adulta. Multipliquem isso vezes 10, caso a criança tenha algum transtorno de aprendizado ou déficit de atenção/hiperatividade.

A falta da escola na rotina das crianças também é sentida através da desorganização de horários e rotinas, aumento da irritabilidade, crises de choro e comportamentos disruptivos. Tudo isso leva a crer que teremos uma modificação bastante significativa em todo o desenvolvimento psicossocial dessas crianças expostas ao fechamento prolongado da escola, principalmente as mais jovens. 

Se tudo isso já não fosse terrível o bastante, quando nos voltamos para a educação pública, os desdobramentos parecem ser muito piores. Numa realidade (ignorada por políticas simplistas de “fecha tudo”) onde metade das famílias não têm computador e 30% não possuem acesso à internet, querer falar em ensino remoto é um piada de mau gosto. De todos os alunos, 80% são do ensino público e muitos provavelmente terão um déficit escolar irrecuperável. 

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Precisamos voltar urgentemente às aulas. É o melhor momento? Não. Mas ao precocemente (e desnecessariamente pelas evidências científicas) fechar escolas durante o ano de 2020, desperdiçamos a chance de preservar nossas crianças sem prejudicar seu desenvolvimento e saúde mental.

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