Entre as pioneiras no Estado na criação de búfalos, a Fazenda do Cedro, de Pantano Grande, completa duas décadas de produção de leite desse animal. Diariamente, quase 2 mil litros são obtidos do plantel, e encaminhados para processamento em uma fábrica de laticínios no município de Glorinha. A propriedade tem 700 animais, dos quais 200 estão na ordenha.
Há algumas décadas, os búfalos eram apresentados em propriedades no interior do Rio Grande do Sul apenas como exóticos, e hoje constituem alternativa econômica de produção com garantia de comercialização. A atividade com os animais na Fazenda do Cedro, de propriedade do médico-veterinário Marcelo Alves Fortes, começou em 1977, com foco na produção de carne. “A carne tem características bem interessantes. Tem uma proteína de melhor qualidade e é mais rica em aminoácidos essenciais, com menos gordura entremeada”, comenta.
Acompanhando um movimento dos criadores em nível nacional, de 2001 para cá, Fortes resolveu se dedicar à produção de leite. Explica que traz animais de São Paulo, e conta ter um touro da Bahia. “Onde tem melhor genética de leite do Brasil, a gente busca reprodutores”, afirma. Atualmente, Fortes frisa que a fazenda faz inseminação artificial, destacando que no búfalo ela é mais delicada.
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“Estamos usando sêmen de animais italianos. A Itália é um país que tem uma criação de búfalos bem expressiva. E tem tradição na produção de queijo.” O veterinário observa ainda que, por ser um animal mais rústico que o bovino, requer um aporte menor de insumos, e isso faz com que haja pouca interferência no meio ambiente. Segundo ele, o búfalo tem uma adaptação boa no Rio Grande do Sul e em várias partes do mundo, como Tibete, região Amazônica, Uruguai e Argentina.
A gestação da búfala dura dez meses e meio. “A gente tem um trabalho para tentar distribuir os partos ao longo do ano de maneira mais homogênea para uma produção mais estável. Se ficasse numa situação natural, a búfala iria concentrar os partos em um período do ano”, salienta Fortes. Os pequenos mamam o colostro para adquirir imunidade, depois são separados e vão para uma espécie de “creche”.
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Ajuda dos filhos
Os dois filhos de Marcelo, Frederico e Carolina Diez Fortes, ajudam nos trabalhos da Fazenda do Cedro. E fica para Carolina a tarefa de alimentar os terneiros. “A gente esquenta o leite a 40 graus, bota na mamadeira e tenta convencer ele a mamar. Mas não é fácil”, relata. “Depois que eles aprendem a mamar, a mamadeira é trocada por um balde com bico, e ali os terneiros ficam por dois meses”, acrescenta.
A técnica passou a ser aplicada, pois havia em torno de 30% de mortalidade de terneiros. Marcelo Fortes conheceu esse sistema após fazer um curso na Itália. Mas a prática começou com outra fatalidade, contada por Carolina. “Uma búfala teve gêmeos e morreu. Nós demos de mamar para os terneiros e eles ficaram bem.”
Projeções
Como também se dedica à soja, o espaço da Fazenda do Cedro não permite mais búfalos. “Mas a gente tem uma expectativa de aumentar para o ano que vem. Talvez 20% do animal na ordenha em 2022 e mais 20% no outro ano”, projeta Marcelo Fortes. No entanto, ele reconhece que, apesar dos benefícios dos derivados do leite de búfala, a cultura do consumo no Rio Grande do Sul é mais atrasada.
Sobre o fato de os itens serem mais caros, exemplifica: “Uma vaca holandesa de boa qualidade produz 40 litros de leite. Uma búfala produz até 19 e come a mesma coisa que a vaca holandesa. O custo de produção não é barato, e o produto tem uma vez e meia mais proteínas, duas vezes gordura e minerais. Sem contar que o búfalo não é acometido pelo carrapato, que hoje é um problema sanitário grave na pecuária do Estado.”
Como exemplo, cita ainda que são necessários oito banhos para controlar carrapatos em bovinos. O único problema do búfalo é o piolho, e isso é resolvido com o uso de um produto duas vezes por ano.
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Orgulho e função social da fazenda
Os búfalos pastam e ganham silagem de milho e trigo e ainda farelo de arroz, pois é exigido um cuidado mais intenso com alimentação. Afinal, “ele tem que produzir leite para sustentar o terneiro e ainda para vender”, diz Marcelo Fortes. Para isso, ele planta também aveia e azevém para os animais.
Não há necessidade de confinamento, já que o búfalo é um animal rústico. Mas Fortes cita ainda outro motivo. “Eu acho que essa produção com o animal totalmente confinado é agressiva. Procuramos fazer com que eles exerçam a natureza deles. Que eles possam pastar, caminhar, ir para dentro d’água em um açude.”
No município de Pantano Grande, que não tem tradição na produção de leite, a Fazenda do Cedro se destaca como uma das maiores desse tipo no Rio Grande do Sul. E deixa seu dono orgulhoso. “Essa propriedade me dá certo orgulho. Diretamente, umas 35 pessoas comem daqui. Eu tenho empregados, suas esposas, filhos e todos tiram o sustento daqui”, comemora, lembrando que muitos de seus funcionários trabalham desde jovens. “Essa propriedade tem uma função social bem bacana. Nós produzimos muito leite, soja e carne. Muita gente vive do que fazemos aqui”, ressalta.
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Marcelo Fortes produz a matéria-prima para um laticínio de Glorinha. Ele explica as vantagens do consumo de derivados do leite de búfala. “O perfil de ácidos graxos presente no leite de búfala é melhor. Tem uma vez e meia mais proteínas do que o leite de vaca.”
Para as pessoas que têm intolerância ao leite de vaca, ela é melhor em relação ao de búfala. “A proteína do leite de búfala é A2A2, que provoca menos alergias. Isso é muito importante, pois dá uma possibilidade de essas pessoas consumirem uma variedade de pratos que têm leite”, frisa.
A Fazenda do Cedro entrega 80% do leite processado em Glorinha e produz quase 2 mil litros por dia. Fortes calcula que a produção média de queijo em todo o Estado fique entre 15 e 18 toneladas por mês. “A gente tem uma gama de produtos pequena que não faz no Rio Grande do Sul, mas que são especiais, como a burrata, que é muito procurada”, salienta, citando ainda que a mozzarella é o item principal.
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O leite de búfala tem rendimento industrial alto. “Enquanto a gente, em média, precisa de 10 litros para fabricar um quilo de queijo, com o leite de búfalo são necessários cinco litros e meio”, compara. Os cuidados nas questões de qualidade, como contaminação, bacteriológica, saúde dos animais e higiene da ordenha, seguem um rigoroso processo. Marcelo Fortes faz questão de destacar que os queijos produzidos são “100% com leite de búfala”.
Uma parceria com outro produtor permite venda para recria e abate, visando o consumo da carne. Fortes estima que o Rio Grande do Sul tenha hoje em torno de 70 mil búfalos; destes, cerca de 25 mil animais são colocados no mercado da carne. “O mercado está fluindo. Ele existe e não seria um problema hoje para quem quer criar búfalo.”
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