Polícia

“Eu sei que esse é um processo de interesse da comunidade”, diz juíza que irá presidir júri do Caso Francine

No dia 18 de novembro, os santa-cruzenses voltarão ao passado. Às 9h30, no Salão do Júri Juiz Gerson Luiz Petry, no Fórum de Santa Cruz do Sul, começará o último episódio de uma das páginas mais tristes da história recente do município. O assassinato da jovem Francine Rocha Ribeiro, de 24 anos, deixou marcas profundas não só na vida de seus familiares e amigos, mas na população, que não esquece do crime ocorrido em um dos pontos turísticos mais belos da cidade, o Lago Dourado.

No julgamento que marcará o encerramento das sessões do Tribunal do Júri neste ano em Santa Cruz, sentará no banco dos réus Jair Menezes Rosa, 62 anos, o homem acusado pela Polícia Civil e pelo Ministério Público como o autor do estupro e da morte de Francine, na tarde de 12 de agosto de 2018. Atualmente recolhido no Presídio Estadual de Candelária, ele nega que tenha cometido os crimes. O processo do caso conta com mais de 1,2 mil páginas.

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Na edição deste sábado, 15, a Gazeta do Sul dá início à série Caso Francine: O Júri. Ao longo das próximas semanas, os principais personagens da trágica história vão ser ouvidos para contarem sua visão em relação aos fatos. Responsável por presidir o julgamento histórico, a juíza Márcia Inês Doebber Wrasse, 52 anos, é a primeira entrevistada. A magistrada sabe de sua responsabilidade e vem se preparando para aquele que é, nas palavras dela, um dos grandes júris de sua carreira. Natural de Candelária e juíza experiente, com 23 anos de atuação, ela se formou em Direito pela Universidade de Santa Cruz do Sul (Unisc) em 1992.

Francine Rocha Ribeiro tinha 24 anos

Já no ano seguinte fez o curso de preparação à magistratura, na Escola Superior da Magistratura do Rio Grande do Sul. Iniciou sua vida como juíza em 23 de abril de 1999 em Encantado, para depois seguir para São Sepé e se estabelecer em Santa Cruz no ano de 2015. 

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Márcia Wrasse recebeu a equipe da Gazeta em seu gabinete e, com a tranquilidade que lhe é peculiar nas sessões do Tribunal do Júri, respondeu sobre questões como a demora no andamento do processo; o que pode gerar uma anulação da decisão dos jurados; quais as medidas de segurança que serão adotadas no dia 18 e como funciona a dosimetria da pena. Confira:

Qual a expectativa da senhora a respeito desse júri?

Eu sei que esse é um processo de interesse da comunidade, mas a forma de atuação é igual a qualquer outro processo. O cuidado que temos é de possibilitar que as pessoas interessadas possam assistir ao julgamento, que é algo que não vínhamos permitindo por causa da pandemia. Também estamos tomando todos os cuidados para que o julgamento transcorra da melhor maneira possível, e que seja dada uma resposta para a sociedade com relação a esse fato.

O júri ocorre após mais de quatro anos desde o crime. O que levou a essa espera?

Esse processo, que na época de seu começo era em formato físico, teve a particularidade de pegar o início da pandemia. A maioria dos processos físicos ficaram parados até ser dado o andamento em função das restrições que houve. Também foram interpostos recursos para o STJ e um recurso extraordinário que seria para o STF, o que normalmente não acontece. Em regra, o julgamento é mais rápido se na sentença de pronúncia não houver recurso, ou se houver recurso só para o Tribunal de Justiça. Já tivemos julgamentos aqui que foram pronunciados e, dentro de um ano, houve a sessão de julgamento, ou por não haver recurso, ou por ser logo analisado e ter uma resposta célere. Nessa caso, além da pandemia, tivemos essa situação dos recursos. Também houve um incidente de insanidade mental, mas isso não suspendeu o andamento do processo.

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Pela comoção ocorrida, este pode ser o julgamento mais aguardado dos últimos anos em Santa Cruz do Sul?

Desde que eu cheguei aqui em Santa Cruz, tivemos a sessão que ficou conhecida como o Júri da Cruz. Que eu tenho lembrança, aquele também gerou uma comoção muito grande. Infelizmente, assim como esse [caso Francine], aconteceu em um dos pontos turísticos da cidade. O [júri] de um crime ocorrido em Passo do Sobrado também causou bastante comoção. Existem casos emblemáticos, que chocam até mesmo a gente. São todos muito tristes. Infelizmente, como neste agora e no Júri da Cruz, para a cidade é algo muito triste que tenham acontecido em pontos turísticos, envolvendo vítimas bem jovens, mulheres.

Nos casos de condenação por parte dos jurados em sessões do Tribunal do Júri, a senhora é a responsável pela dosimetria da pena. Como funciona esse procedimento?

A dosimetria da pena considera as circunstâncias judiciais que estão previstas no Código Penal, com todas as questões levadas para fixar a pena-base. Também existem as circunstâncias agravantes ou atenuantes, que podem aumentar ou diminuir a pena, que estão previstas na lei. 

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Preso preventivamente pela Polícia Civil, Jair Menezes da Rosa permanece recolhido em Candelária

Recentemente houve um fato emblemático, a anulação do júri do Caso Kiss, que gerou muita frustração e revolta na sociedade. Como garantir que o processo não tenha nulidades que levem a situações como essa?

É uma questão muito difícil, porque não tem como garantir. A gente sempre trabalha buscando agir de todas as formas para que não aconteça nenhuma possibilidade de anulação. Mas o processo do júri tem um rigor formal muito grande. Já devo ter feito mais de cem júris, nenhum é igual ao outro e sempre surge uma questão nova. É muito difícil dizer que não vá acontecer nada que não gere uma nulidade do julgamento. Tive um júri que estava quase no final e o pai de uma jurada faleceu durante a sessão. Ela estava no corpo de jurados, o pai estava mal de saúde e ela precisou sair. Foi em São Sepé, antes de 2004. Como o júri tem vários atores, pessoas da comunidade, há diversas situações que podem gerar uma nulidade, inclusive um comentário por parte de jurado, que não pode externar sua opinião sobre o processo, sob pena de nulidade. É muito difícil se ter o controle completo da situação.

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Normalmente, as sessões do Tribunal do Júri ocorrem às quartas-feiras em Santa Cruz. Por que esse foi marcado para uma sexta-feira? E quais as medidas de segurança que vão ser adotadas para o dia do julgamento?

Será na sexta-feira porque tivemos muitos feriados de outubro para cá e temos aqui em Santa Cruz os depoimentos de crianças vítimas de violência, sempre às quartas-feiras. Como existem feriados em outubro e novembro, foram designados depoimentos em novembro. Em dezembro estarei de férias. Não tinha data disponível na minha pauta a não ser na sexta-feira, e eu quis pautar logo esse julgamento porque é um processo que está em andamento há muito tempo. Em termos de segurança, vamos solicitar o apoio da Brigada Militar, como acontece nos casos de réu preso. E no entorno também solicitaremos policiamento.

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Como será a disposição do espaço no Salão do Júri Juiz Gerson Luiz Petry e como funciona o sorteio dos jurados?

A gente tem experiência nesses júris com comoção social maior, em que as pessoas querem vir assistir, de designar um número para familiares e amigos da vítima e do réu, para imprensa e estudantes das faculdades de Direito. São 87 lugares no plenário, então vamos limitar e distribuir entre as pessoas. Sobre os jurados, fazemos um sorteio, geralmente pelo dia 10 do mês anterior, dos 25 jurados que atuarão nos júris de um determinado mês. Se tivermos dois ou três júris, vão ser sempre aqueles 25. Também são sorteados suplentes, porque há muitos pedidos de dispensa, ou pessoas que estão viajando ou nem moram mais em Santa Cruz. No dia do julgamento, precisamos ter no mínimo 15 jurados para declarar instalada a sessão do Tribunal do Júri. Desses 15, são sorteados sete que vão compor o Conselho de Sentença. Defesa ou acusação podem recusar, sem motivo, três jurados. Se for recusa motivada, deve ser comprovada a motivação, que também são três recusas para cada parte.

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A senhora prevê que esse júri possa se estender e não ser finalizado no dia 18?

Não acredito nisso. O que pode atrasar um júri é o grande número de pessoas a serem ouvidas. Neste, temos três testemunhas. Se fossem dois réus, seriam duas horas e 30 minutos para cada parte falar. Como é um, diminui para uma hora e 30 minutos para a Promotoria, que pode dividir seu tempo com o assistente de acusação; e uma hora e 30 minutos para a defesa do réu. Acredito que  deve se encerrar no máximo às 21 horas.

Não vejo que exista um problema nesse aspecto. Os jurados têm a tranquilidade de saber que o voto deles não vai ser de conhecimento público, mesmo porque, para a proteção do próprio jurado, para que ele não se sinta coagido ou constrangido, é feito o julgamento por maioria. Quando se tem a maioria de votos favorável, os outros não são mais abertos, como forma de preservar os jurados.

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Cristiano Silva

Cristiano Silva, de 35 anos, é natural de Santa Cruz do Sul, onde se formou, na Universidade de Santa Cruz do Sul (Unisc), em 2015. Iniciou a carreira jornalística na Unisc TV, em 2009, onde atuou na produção de matérias e na operação de programação. Após atuar por anos nos setores de comunicação de empresas, em 2013 ingressou no Riovale Jornal, trabalhando nas editorias de Geral, Cultura e Esportes. Em 2015, teve uma passagem pelo jornal Ibiá, de Montenegro. Entre 2016 e 2019, trabalhou como assessor de imprensa na Prefeitura de Novo Cabrais, quando venceu o prêmio Melhores do Ano na categoria Destaque Regional, promovido pelo portal O Correio Digital. Desde março de 2019 trabalha no jornal Gazeta do Sul, inicialmente na editoria de Geral. A partir de 2020 passou a ser editor da editoria de Segurança Pública. Em novembro de 2023 lançou o podcast Papo de Polícia, onde entrevista personalidades da área da segurança. Entre as especializações que já realizou, destacam-se o curso Gestão Digital, Mídias Sociais para Administração Pública, o curso Comunicação Social em Desastres da Defesa Civil, a ação Bombeiro Por Um Dia do 6º Batalhão de Bombeiro Militar, e o curso Sobrevivência Urbana da Polícia Federal.

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Cristiano Silva

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