Eu não quero ser o Grinch

Desde criança, eu sempre preferi as festas de virada de ano às de Natal. Não sei por que, mas ter que ir na missa, ver todo mundo se estressando pra fazer a ceia perfeita e esperar até a meia-noite pra ganhar presente, me parecia esforço demais, desgastante demais. Sem falar naquela situação de ter que aguentar pessoas nem tão agradáveis só porque era Natal, era chato demais fingir que estava à vontade. Por outro lado, eu tenho lembranças lindas da minha infância, principalmente na casa dos meus avós.

As alegrias eram pequenas: num ano ganhei um óculos escuro de armação rosa; em outro uma bicicleta; e sempre tinha o momento de tirar fotos com o vô. Tenho elas até hoje. Ah, uma vez meus pais fizeram eu ter certeza de que o Papai Noel existia e que ele tinha me dado a mochila de rodinhas do Mickey e da Minnie que eu tanto queria. Com o passar dos anos, porém, as coisas vão ficando esquisitas e o nosso entendimento de mundo vai mudando. As coisas que nos fazem felizes já não se resumem a presentes embaixo do pinheirinho.

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No momento em que todos sentaram em torno da mesa, no dia de Natal, e aquele almoço maravilhoso foi servido, eu vi a cadeira que ele costumava ocupar vazia. Era como se o vô João fosse chegar a qualquer momento, mas eu sabia que aquilo não aconteceria. Poucas vezes eu senti tanta tristeza quanto naquele 25 de dezembro de 2019. A comida “não desceu” e eu só podia pensar em quantos presentes eu trocaria pela presença dele. Foi aí que eu passei a, definitivamente, não gostar de Natal.

No ano passado, como se simplesmente passar as festas em meio a uma pandemia não fosse ruim o suficiente – em isolamento, aliás, porque estava infectada com coronavírus –, minha vó sucumbiu à Covid-19 justamente no dia 24 de dezembro. No dia seguinte, furei o isolamento para ir ao enterro. Estava decretado: não havia mais chances de eu ter um bom Natal outra vez na minha vida.

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Foi ótimo, então, quando, neste ano, eu pude escolher trabalhar durante todo o feriadão natalino. Não precisaria me preocupar em viver o Natal, apenas em sobreviver a ele e esperar ansiosamente pela virada do ano. E daí pensei na possibilidade de chegar em casa, na noite da próxima sexta, e estar sozinha. Senti o peso de todas as ausências – não só de quem já se foi, mas de quem eu deixaria de ver – e foi aí que eu percebi que não queria ser o Grinch.

Combinei com meus pais e eles virão para Santa Cruz, preparar tudo para que possamos celebrar o simples fato de estarmos juntos, com saúde e em condições de comer panetone e tomar aquela cervejinha. Ainda não decorei meu apartamento e nem sei se vou, mas, tal qual o Grinch, estou trabalhando para ressignificar a data, criar novas tradições e aprender a conviver com os presentes que já não posso mais ter.

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Cristiano Silva

Cristiano Silva, de 35 anos, é natural de Santa Cruz do Sul, onde se formou, na Universidade de Santa Cruz do Sul (Unisc), em 2015. Iniciou a carreira jornalística na Unisc TV, em 2009, onde atuou na produção de matérias e na operação de programação. Após atuar por anos nos setores de comunicação de empresas, em 2013 ingressou no Riovale Jornal, trabalhando nas editorias de Geral, Cultura e Esportes. Em 2015, teve uma passagem pelo jornal Ibiá, de Montenegro. Entre 2016 e 2019, trabalhou como assessor de imprensa na Prefeitura de Novo Cabrais, quando venceu o prêmio Melhores do Ano na categoria Destaque Regional, promovido pelo portal O Correio Digital. Desde março de 2019 trabalha no jornal Gazeta do Sul, inicialmente na editoria de Geral. A partir de 2020 passou a ser editor da editoria de Segurança Pública. Em novembro de 2023 lançou o podcast Papo de Polícia, onde entrevista personalidades da área da segurança. Entre as especializações que já realizou, destacam-se o curso Gestão Digital, Mídias Sociais para Administração Pública, o curso Comunicação Social em Desastres da Defesa Civil, a ação Bombeiro Por Um Dia do 6º Batalhão de Bombeiro Militar, e o curso Sobrevivência Urbana da Polícia Federal.

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Cristiano Silva

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