Cursar uma faculdade e conquistar o diploma que o habilita para exercer uma profissão, é o sonho de muita gente mundo afora. Por diversos fatores, alcançar essa realização costuma ser sinônimo de batalha, desafios, dedicação e superação. E ainda, em meio a tudo isso, ocorre o incrível processo de aprendizagem. Para os estudantes que desembarcaram em Sobradinho há alguns dias, a educação tem papel essencial nas caminhadas que escolheram seguir.
Natural de São Luís no Maranhão, Enilson Carlos Madeira Costa, de 37 anos, cursa Administração e Ciências Contábeis na Faculdade Adventista da Bahia (Fadiba). Já Mike Kender Cameus, 23 anos, nasceu em Cap-Haitien, comuna do Haiti, mas há aproximadamente seis anos reside em São Paulo, onde cursa Teologia e Administração no Centro Universitário Adventista de São Paulo (Unasp). Em comum, além de participarem da mesma rede universitária e cursarem a área da Administração, está a importância dada à educação e à religiosidade.
Por se tratar de uma instituição particular, as mensalidades dos cursos de graduação que frequentam devem ser pagas pelos estudantes. No caso de Mike e Enilson, sem condições de arcar com as despesas, eles participam de um projeto de férias, conhecido como Colportagem Estudantil, no qual viajam para alguma região do país durante o período de recesso, efetuando a venda de obras de uma editora ligada à faculdade, para que assim possam custear o semestre do curso. “É um projeto que existe há muitos anos. Os estudantes oriundos de todos os polos da faculdade são reunidos, participam de capacitação de como desenvolver este projeto e são distribuídos por estados. Estamos com 150 estudantes na região de Santa Maria, são 70 meninas e 80 meninos, que ficam na casa sede, mas depois se distribuem entre municípios próximos”, explicou Mike.
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Segundo ele, são três focos principais na colportagem: o primeiro deles é ouvir a trajetória das pessoas, dos profissionais da região, como forma de adquirir conhecimento; o segundo é falar sobre assuntos que consideram essenciais, como a importância da família, saúde e educação; e no terceiro, mostram o que realizam nas férias para conseguir manterem-se nos estudos. “É um intercâmbio sócio-cultural que nos dá a oportunidade de crescer como pessoa e profissionalmente também”, acrescentou Enilson.
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Durante o projeto, os estudantes também dizem aprender muito uns com os outros. “Dentro da faculdade há aproximadamente 78 nacionalidades diferentes, lá se vive a diversidade no dia a dia”, mencionou Mike. Os dois estudantes se conheceram quando chegaram ao Rio Grande do Sul e criaram um vínculo de amizade, assim como com outros participantes do projeto. “Todos nós nos ajudamos. Essa diversidade cultural nos aproxima e nos permite agregar muito conhecimento”, enfatizou Enilson.
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Pela primeira vez no estado, Mike disse ter sido uma grata experiência. “Já tinha ouvido falar muito dos gaúchos, inclusive na faculdade tem bastante. Já tinha feito amizades, haviam me falado de chimarrão e cuca, eu estava na curiosidade de um dia poder conhecer. A experiência foi fantástica, espero um dia retornar”, ressaltou o jovem que já voltou a São Paulo. Para Enilson, esta foi a segunda visita ao estado, pois no primeiro semestre esteve na região da Serra. “Tinha um certo medo, terra distante, né. Muito receio de como ia ser recebido e tudo mais. Gostei muito do Sul, amei desde a primeira vez. Enquanto estiver estudando quero continuar aqui no Sul. Gostei do povo, acolhedor”, destacou ele, que permanece na região por mais alguns dias. Mesmo com o clima frio, diferente do que está acostumado, a persistência para alcançar o objetivo o fez seguir. “As histórias das pessoas nos ajudam a nos manter focados no objetivo. Vejo que também posso, também consigo e isso nos ajuda no dia a dia”, acrescentou.
Quanto ao futuro, ambos buscam o desenvolvimento por meio da educação, “a base para a mudança”, como afirmou Enilson que quer poder fazer a diferença na vida das pessoas. “Não adianta eu crescer na vida e não reconhecer tudo que estou passando agora, as pessoas que Deus tem colocado em meu caminho para me ajudar nesta carreira, pois ninguém consegue subir na vida sozinho. Meu propósito é viver para servir, ser o melhor para servir”, destacou. “Espero que Deus me capacite para que eu seja a pessoa que ele me designe para ser. Que a minha presença e participação na sociedade seja para trazer o positivo, inspirar pessoas e demonstrar que cada coisa boa que a gente faz vale a pena”, finalizou Mike.
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Em Sobradinho, os estudantes tiveram acolhimento especial de algumas pessoas, entre elas Marli de Souza Lago que os recebeu em sua casa para a estadia de alguns dias, além de auxiliá-los nos compromissos e levá-los a conhecer lugares e pessoas da região, junto ao marido Nilton Lago. “Como trabalhei com publicidade, marketing, participei de feiras em outros municípios, me sentia muito bem quando alguém me acolhia. Quando vi eles e me contaram sobre o projeto, me emocionei. Algo que me chamou atenção foi que muitos filhos têm tudo, ganham a faculdade dos pais e não valorizam, e eles estão aí batalhando para pagar. Pensei que se os auxiliasse estaria ajudando a realizar o sonho deles. Os acolhi como meus filhos”, destacou Marli.
A vinda de Mike para o Brasil ocorreu alguns anos após o terremoto que atingiu o Haiti em 2010. Um momento muito difícil, que se repetiu na última semana. “Um grande desastre, isso afetou muito mesmo. Conheço pessoas próximas que perderam suas casas. Está se vivendo um momento de luto. O terremoto de 2010 foi mais trágico ainda. Muitas pessoas morreram. São situações muito difíceis”, relatou.
O pai do jovem chegou ao Brasil no ano de 2011, em busca de uma vida melhor. “Meu pai veio em busca de um novo rumo de vida. Ele ficou com muito receio de ficar lá e que viesse uma segunda onda, o que ocorreu agora. Quando ele chegou aqui o contexto era todo diferente, a começar pelo idioma. Mas Deus é tão tremendo que ele encontrou pessoas boas que o acolheram, o hospedaram. Sem ter certeza de para onde iria, ele não conseguia trazer a família, pois poderia ser mais trágico sem saber onde iria ficar. Na fé e na coragem ele veio antes. Em dezembro de 2014, então, conseguiu trazer a família. Hoje ele, minha mãe e minha irmã moram em Sorocaba, em São Paulo. Quando cheguei tinha 16 anos. Então foi aqui que dei sequência e concluí o ensino médio, aqui que aprendi o português e vou aprimorando o idioma cada vez mais. Nesses seis anos tenho aprendido coisas que nunca pensei que fosse aprender na vida, são coisas positivas, então isso me alegra”, revelou.
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Entre os familiares que permanecem no Haiti, está a avó de Mike. “Quero muito que ela venha participar de minha formatura. Eu cresci com minha avó. A gente morava no sítio do meu avô. A estrada era de terra e a escola era um pouco distante, cerca uma hora e meia. Quando chovia era sempre complicado, difícil ir para a escola e minha avó me carregava nas costas dizendo ‘meu filho, vou te levar para a escola que a educação é a melhor coisa que eu posso te dar. Quero que ela esteja presente e veja que todo o esforço que ela fez valeu a pena”, enfatizou o jovem.
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