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PÓS-ENCHENTE

Estratégias para proteger nossa bacia hidrográfica

Foto: Alencar da Rosa

Já se passaram mais de 130 dias desde que parte do Rio Grande do Sul ficou abaixo d’água. Na medida em que os trabalhos para reerguer cidades afetadas avançam, paira sobre os gaúchos a dúvida: quais ações precisam ser feitas para prevenir novas catástrofes climáticas como a de abril e maio?

Para os especialistas, a saída está na Bacia Hidrográfica do Rio Pardo. O seu curso d’água espraia-se por 13 municípios, que envolvem uma população de 362.240 habitantes. E sua importância vai muito além do fornecimento hídrico e da manutenção da produção agrícola.

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A cobertura vegetal nas margens contribui para a redução dos impactos de fenômenos climáticos, como as enchentes. Em períodos de chuva prolongada, impede a erosão e a perda de terreno para a plantação.
Cientes da sua relevância, entidades unem forças com especialistas para a elaboração de novas ações e reforçar as que foram implementadas nos últimos anos. Contudo, técnicos reforçam a necessidade de iniciativas conjuntas entre os municípios que recebem a água da bacia.

A Catástrofe climática fomentou novos planos de revitalização

Muito antes de as inundações transformarem completamente a paisagem da região, a bacia hidrográfica vivia em estado de alerta constante. Diversas vezes, o Comitê de Gerenciamento da Bacia Hidrográfica do Rio Pardo (Comitê Pardo) evidenciou que havia déficit de cobertura vegetal ao longo de toda a margem.

Entidades desenvolvem projetos para reflorestar margens do Rio Pardinho e preparar o ambiente diante de novas enchentes

Segundo o engenheiro ambiental Marcelo Luís Kronbauer, da Universidade de Santa Cruz do Sul (Unisc), a situação agravou-se após a catástrofe climática, escancarando as fragilidades. “Tínhamos um déficit de cobertura, que era mais grave em alguns locais. Eram cicatrizes. Agora, temos uma enorme ferida aberta”, afirmou o profissional.

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Em meio aos danos significativos, sobressaiu-se ainda mais a necessidade de elaborar projetos de recuperação do Rio Pardinho e dos demais afluentes que compõem a bacia para enfrentar a nova realidade. Não só para revitalizar a vegetação, mas também mitigar os danos e tornar toda a bacia hidrográfica mais resiliente diante de situações extremas.

Além do Comitê Pardo, outras entidades passaram a somar esforços, buscando desenvolver ações integradas a fim de se adaptar ao contexto atual. Recentemente, o Consórcio Intermunicipal de Serviços do Vale do Rio Pardo (Cisvale) criou o grupo de trabalho Pró-Clima, que, além da revitalização, tem como mote aperfeiçoar a gestão de recursos hídricos e a sustentabilidade. Colabora ainda o Centro Socioambiental da Unisc, que elaborou um projeto. Este atua em três frentes (econômica, social e ambiental), que incluem monitoramento da qualidade da água e reflorestamento das margens.

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Um ponto em comum é o levantamento de informações da bacia, fundamental para a realização das atividades. Envolve, por exemplo, o diagnóstico dos pontos de risco e das vulnerabilidades e estudos hídricos, para identificar as condições dos recursos para sua manutenção.

Uma nova paisagem

A forte correnteza das enchentes registradas em abril e maio mudou drasticamente a paisagem das margens do Rio Pardinho. O déficit de vegetação, registrado em toda a Bacia Hidrográfica do Rio Pardo, foi severamente ampliado. Com isso, ações de revitalização tornam-se ainda mais necessárias e urgentes.

A engenharia natural vira protagonista

Entre as ações voltadas à revitalização da bacia do Rio Pardo, os projetos que envolvem a engenharia natural têm ganhado força nos últimos anos. Por meio de materiais do meio ambiente (plantas, solo e madeira, por exemplo), é possível estabilizar os taludes (terreno inclinado que tem a função de sustentar o solo) e as margens dos cursos de água em trechos do Rio Pardinho. A combinação com os recursos naturais garante maior proteção ao solo, ao se integrar com o sistema, reduzindo a rejeição e controlando o processo erosivo superficial.

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Em 2021, o Comitê Pardo colocou a iniciativa em prática numa área com dois quilômetros de abrangência, entre o ponto de captação de água e a antiga ponte. Três anos depois, durante as enchentes, constatou-se a eficiência dos trabalhos, prevenindo não apenas a queda de sedimentos na água, mas também o assoreamento do rio.

Conforme o engenheiro ambiental Marcelo Kronbauer, diretor-presidente da Associação Pró-Gestão das Águas da Bacia Hidrográfica do Rio Pardo (Agepardo), entidade ligada ao comitê, apesar dos estragos causados pelas enchentes, as estruturas resistiram. Em uma das obras, segundo ele, localizada próximo à ponte que liga Santa Cruz e Vera Cruz, os danos foram mínimos – cerca de 10%. Ressaltou que a estrutura conseguiu reter 400 toneladas de terra.

A engenharia natural também está sendo implementada por um projeto da Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan), ao longo de 185 metros de extensão do Rio Pardinho, em Santa Cruz. Com investimento de R$ 1,6 milhão, será feito o plantio de 11.750 mudas nativas adaptadas ao ambiente para resistirem à força da água. Além do plantio de seis espécies, serão aplicados rochas e solo envelopado, para evitar erosão da margem do rio.

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O trabalho ainda tem como objetivo reduzir a velocidade da água do rio para evitar o arrastamento de solo e de vegetação da margem. Com isso, mais água ficará retida na bacia, proporcionando maior segurança na captação para tratamento e distribuição entre a população.

Segundo a Corsan, a iniciativa irá contribuir para a melhora da qualidade da água captada, já que haverá menos sedimentos, deixando-a mais clara e limpa. Isso porque a vegetação nativa que será plantada às margens vai atuar como uma barreira natural, absorvendo e filtrando detritos.

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Os trabalhos iniciaram-se em janeiro. Atualmente, foram feitas melhorias para acesso ao local da obra e a supressão de vegetação para remodelar o barranco. Até o final do mês, serão realizados o plantio das mudas e a colocação de rochas e de solo envelopado.

Juntamente com o processo para impedir a presença de sedimentos, a Corsan adquiriu um equipamento de ultrassom para reduzir a proliferação de algas no Lago Dourado. Quatro aparelhos ficarão flutuantes no lago, emitindo ondas que impedem a reprodução do organismo. Para obter o material, importado dos Estados Unidos, foram investidos R$ 2 milhões. De acordo com a companhia, eles estarão em operação até o final deste mês, quando a proliferação de algas começa a ser maior.

Agricultores contribuem para revitalização

Os produtores rurais que dependem da bacia do Rio Pardo para a produção assumiram um importante papel na preservação e revitalização das margens. Conforme a coordenadora do curso de Agronomia da Unisc, Priscila Mariani, a presença da instituição no campo proporcionou a aproximação com os agricultores. “No contexto geral, o produtor nunca é o problema, é a solução. E eles vêm buscando cada vez mais aprimorar essas técnicas; só precisam de ajuda para implementar isso”, afirma.

Os estragos provocados pelas enchentes não se limitaram à destruição de instalações das propriedades rurais. Segundo o presidente do Comitê Pardo, Adalberto Huve, a fertilidade do solo foi comprometida.
“A camada produtiva, que dava sustentabilidade, não existe mais, foi parar
no rio ou em outra propriedade.”

Diante dos impactos das enchentes no meio rural, o Centro Socioambiental da universidade incluiu na sua proposta de revitalização o projeto para reconstruir os solos nas pequenas propriedades. Ele visa coletar e analisar a fertilidade dos sedimentos removidos, verificando a possibilidade de reutilização por meio de técnicas de conservação do solo nas lavouras, permitindo a recuperação da capacidade produtiva das áreas agrícolas.

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Importância da drenagem é tema de evento

As ações de resposta às enchentes foram tema do 1º Seminário de Drenagem Adaptada à Nova Realidade, que ocorreu no auditório do Memorial da Unisc na tarde dessa sexta-feira. Especialistas e técnicos do setor, ligados às universidades gaúchas, apresentaram soluções para o meio urbano
e rural, frisando a importância de planejar o escoamento.

Segundo o coordenador da Câmara Setorial do Meio Ambiente do Consórcio Intermunicipal de Serviços do Vale do Rio Pardo (Cisvale), Ricardo Konzen, a drenagem (que envolve um conjunto de estudos e obras para transferir a água da chuva para evitar alagamentos) tem papel importante na gestão e no controle dos excessos. E, diante da relevância, necessitava-se reunir líderes do Vale do Rio Pardo para pensar em políticas públicas e colocá-las em prática. “Percebemos, durante o evento, que a região não estava preparada para o enfrentamento dos extremos que tivemos”, afirmou em entrevista ao jornalista Ronaldo Falkenback, da Rádio Gazeta FM 107,9.

O professor Marcelo Dutra da Silva, da Universidade Federal de Rio Grande (Furg), ressaltou como os eventos extremos vão se tornar cada vez mais recorrentes. Isso porque, segundo ele, a descaracterização das paisagens proporcionou a vulnerabilidade. “Estamos em um cenário diferente, com a Amazônia e o Cerrado reduzidos, formando zonas de muito calor. E, para piorar, os espaços que não deveriam estar ocupados estão mais ocupados do que antes. É a tempestade perfeita.” Segundo ele, tudo indica que a sociedade vai voltar a viver eventos similares. Por isso, destacou a necessidade de novas estratégias diante do novo contexto.

Professor Marcelo Dutra da Silva destacou a necessidade de uma adaptação à realidade

Já o professor Marcelo Kronbauer deu ênfase à combinação de ações que envolvem a conservação de solo e a retenção de água dentro da bacia hidrográfica. Para ele, é preciso entendê-la não só como um sistema de drenagem, mas como uma rede de retenção e de absorção de água. “Precisamos pensar em mecanismos que propiciem da melhor forma possível condições de absorver a água na fonte, ou seja, dentro da escala da propriedade rural, e ter mecanismos que potencializem a infiltração da água e evitem a erosão”, salientou.

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