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“Escrevo sobre o que me encanta ou me espanta”, afirma o escritor Menalton Braff

Nas décadas em que se estabeleceu em São Paulo, Menalton Braff foi gradativamente perdendo o contato regular com o Rio Grande do Sul. “Saí do Rio Grande em 1965, e minha memória vai perdendo muito do meu estado”, frisa. E comenta que uma de suas irmãs mora em Gravataí, e ele costumava visitá-la uma vez por ano. “Além da pandemia, ainda fiz uma estenose na coluna, uma cirurgia mais ou menos brava, e desde 2019, se não estou enganado, não volto ao Sul”, refere. “Agora, estou em recuperação da cirurgia e, tão logo possa, voo para o Rio Grande.”

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Ele viera também para eventos literários em algumas ocasiões. Foi convidado duas vezes para a Feira do Livro de Porto Alegre, e outras duas vezes esteve na Feira do Livro de São Leopoldo.

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Aliás, foi uma dessas viagens ao estado que desencadeou o enredo que resultou no romance Além do Rio dos Sinos. “Fizemos uma viagem ao distrito onde nasceram meus pais, onde quase sempre, quando criança, passava as férias, na casa de meus avós”, explica. “Pois bem, a paisagem daquela região do Caraa, o distrito do Rio dos Sinos, me impressionou profundamente, a ponto de só me livrar dela transformada em palavras. Claro que, por ser um romance, com todos os elementos da narrativa e seus conflitos.”

Confira à direita a entrevista que Menalton Braff concedeu à Gazeta do Sul, e na qual aborda temas associados a sua produção literária e também suas predileções literárias.

Magazine – O senhor começou a publicar mais intensamente literatura quando já estava próximo dos 60 anos. Como foi esse processo, e como a literatura se fazia presente em sua vida até então?

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Bem, a literatura me chegou muito cedo. Quando criança, era devorador de livros (mesmo adultos). Nessa época foi que comecei a botar em prática o que lia no Manual de Versificação, de Olavo Bilac e Guimarães Passos. Me sentia um pouco espremido nas estrofes e descobri que também poderia escrever em prosa. Mas só no antigo Ruy Barbosa, de Porto Alegre, quando cursava o Clássico, foi que me dei conta de que podia fazer literatura, ao ler em um dos autores da geração de 30 a palavra táxi, palavra contemporânea em lugar dos tílburis machadianos. Além disso, descobri o Erico Verissimo, que falava de um povo muito parecido com meus primos. Então pensei: se isso pode virar literatura, posso fazer isso também.

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Ocorre que a vida nunca é como se deseja e é traçada por forças invencíveis, às vezes invisíveis, e não me sobrava tempo para escrever. Trabalhava e estudava (mesmo nos fins de semana). Só quando pude diminuir a carga horária das aulas, com projetos realizados, foi que comecei a publicar. Mas, no correr dos anos até então, tinha muita coisa na gaveta.

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O senhor de imediato surpreendeu a cena literária e cultural brasileira, por assim dizer, com o volume de contos À sombra do cipreste, premiado com o Jabuti. Essa receptividade acabou sendo um motivador a mais para a sua produção?

Não, eu produzia sempre não com a ideia de publicar. Produzir é uma espécie de compulsão, um modo de me sentir vivo. O que o prêmio facilitou foi a publicação. Não muitas portas, mas algumas foram abertas.

O senhor chegou a publicar nos anos 80 como Salvador dos Passos. A adoção do pseudônimo, na época, tem relação com a perseguição sofrida durante o período em que os militares estiveram no poder no Brasil?

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Exatamente. A anistia só veio em 1974, se não me engano, e expor meu nome sempre me pareceu arriscado. Por isso, meus dois primeiros livros (meus cadernos de aprendiz) foram publicados com pseudônimo.

O que levou o senhor, na época, a deixar o Rio Grande do Sul e onde se fixou? O que levou a que o senhor se radicasse em São Paulo?

A repressão na Ufrgs estava muito forte e eu participava dos movimentos políticos de oposição ao regime. Um amigo meu, Jorge Fischer Nunes, foi preso e lá de dentro me mandou recado para que desaparecesse, pois estavam perguntando muito por mim. Ora, desaparecer, de fato, é mergulhar no oceano que se chama cidade de São Paulo. Na capital, tive de restaurar um pouco da minha vida civil para sobreviver. E assim foi que fui criando raízes, até que São Paulo começou a se tornar sufocante e procurei alguma cidade do interior, onde vivo até hoje. Já há muito aposentado da Rede Pública do magistério.

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Na literatura, quais os senhor diria que são seus temas preferenciais ou os assuntos com os quais se sente mais à vontade em abordar?

No passado me atraía mais escrever sobre questões sociais. Até descobrir que jamais faria isso melhor do que a geração de 30. Não que o enfoque social tenha sido abandonado inteiramente, mas consegui trabalhar os assuntos com mais sutileza. Depois de um tempo, o que mais me apaixona é mergulhar no ser humano, suas causas, frustrações, desejos, ambições, medos, tudo aquilo que humaniza um ser, seu mundo interior, principalmente. Costumo dizer que escrevo sobre o que me encanta ou sobre o que me espanta.

O senhor apresenta uma obra bastante eclética em termos de gêneros, indo do conto ao romance e a obras mais voltadas a crianças ou adolescentes. Com qual dessas áreas se identifica mais diretamente?

Eu me sinto melhor nadando no oceano do que em uma piscina. O romance é minha praia.

Como é a rotina do senhor hoje em Serrana? Está aposentado da condição de professor, isso?

Pois é. Todo dia quando acordo espicho os braços, bocejo e pergunto para minha mulher: Que domingo é hoje? Leio, escrevo, às vezes um filme, um concerto, uma cervejinha com amigos. Não preciso de nada além disso.

Quais são as suas grandes referências na literatura, dentro e fora do País? Quem mais lhe inspirou ou quem jamais deixaria de ler?

Bem, a lista é grande e vou tentar resumir. No Brasil: Machado de Assis, José de Alencar, Graciliano Ramos, Clarice Lispector. No exterior: Dostoiévski, Sartre, William Faulkner, Garcia Marquez, Vargas Llosa, Julio Cortazar.

Nos últimos anos, o senhor tem lançado ao ritmo de ao menos um livro por ano, normalmente romance. São textos com os quais o senhor vinha trabalhando há mais tempo? Como é seu ritmo de escrita?

Olha, eu escrevo todos os dias. Nem tudo que escrevo é publicável, mas escrever faz-me sentir vivo. Por isso, tenho bastante coisa na gaveta. E realmente tem sido assim: um livro por ano.

Quem o senhor tem lido na literatura nacional ou estrangeira que indicaria para os demais leitores?

Fausto Wolff é um dos que recomendo. Henrique Schneider é outro, toda a Clarice Lipector, o Milton Hatoun. Do lado de lá, existem muito bons romancistas no Uruguai e na Argentina, mas são tantos que não consigo decorar-lhes os nomes.

O que o senhor espera ou entende que a sua obra pode fazer, ou gostaria que fizesse, junto aos leitores que têm contato, já tiveram ou ainda terão acesso a sua obra?

Em primeiro lugar, prazer estético, emoções de todos os tipos e, me parece que tendo isso, já tenho tudo como autor.

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