Carlos Eurico Pereira (Novo) é o único entre os sete candidatos a prefeito de Santa Cruz que fala em reduzir impostos municipais. Para ele, se a medida for combinada a uma maior eficiência na cobrança, a cortes de despesas (que incluem a eliminação de metade das secretarias e dos cargos em comissão) e à eliminação do que considera entraves para o empreendedorismo no município, como a demora na liberação de licenças para criação de empresas, não haverá prejuízo à arrecadação.
Crítico contumaz da política tradicional, promete lançar, na semana seguinte à eleição, um processo seletivo aberto a qualquer pessoa para definir, com base em critérios técnicos, quem serão os secretários. No que toca à estrutura administrativa, propõe um modelo de “supersecretaria”, congregando áreas afins para formar órgãos com mais autonomia.
Entusiasta das parcerias público-privadas, defende a participação de entidades e empresas em diversos setores, da manutenção de praças à segurança pública, passando pela compra de vagas em escolas privadas para alunos da rede municipal. Também fala em revisar o contrato com a Corsan.
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O senhor é muito crítico quanto aos acordos políticos tradicionais. Como aprovar projetos sem acordos?
Todo mundo faz essa pergunta porque na cabeça do brasileiro é inviável fazer política sem conchavos. E esse é o grande mal do Brasil hoje. Os projetos devem ser aprovados por sua qualidade, pelo benefício que vão trazer aos cidadãos que votaram nos indivíduos que estão lá. Pode ser até algo utópico, mas na nossa cabeça não existe outra maneira de retomar o respeito pela classe política se não for dessa maneira. Não podemos ter câmaras de vereadores totalmente compradas através de cargos em comissão e secretarias. A Câmara, na nossa gestão, vai ter toda a liberdade para fazer aquilo que ela deveria fazer: fiscalizar o Poder Executivo e aprovar leis que realmente façam a diferença. E por mais pressão que possam fazer, vai chegar um momento que vão cansar e entender que não existe esse tipo de moeda de troca.
No seu plano, além da redução de CCs, consta a realização de processo seletivo para preenchimento desses cargos. Esses cargos não serão ocupados por pessoas ligadas a partidos, nem o seu?
Na verdade, se a pessoa realmente for aprovada no processo seletivo e tiver capacidade técnica para assumir o cargo, pode ser do partido que for, não nos interessa a filiação partidária. Obviamente que é preciso ter alinhamento com nossas ideias, então é mais fácil que pessoas com ideias liberais venham a passar no processo seletivo. Esse processo vai ser aberto na primeira semana após a nossa aprovação nas urnas, e o que vai contar é capacidade técnica e capacidade de gestão de pessoal. Esse é o tipo de indivíduo que vamos buscar para cargos de secretários. E para cargos em comissão, aqueles que forem realmente essenciais, aí sim vamos ter cargos explicitamente técnicos.
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Se o senhor for eleito, qual será o primeiro assunto ao qual vai se dedicar?
A primeira questão é estabelecer uma boa relação com o funcionalismo. É impossível termos um governo que funcione de verdade se não tivermos o apoio e o engajamento do funcionário público. Nossa primeira semana vai ser de muita conversa com o funcionalismo, para que eles entendam quais são os nossos propósitos e vejam na administração um parceiro. Todo indivíduo que hoje é funcionário público passou por um concurso, ou seja, é alguém que tem competência para estar ali, mas muitas vezes está desestimulado exatamente pelas práticas políticas convencionais, de ter em cargos de chefia pessoas incompetentes.
No seu plano, consta “extinguir privilégios do setor público”. O que vocês consideram privilégios, já que mais de 60% dos servidores municipais recebem salário básico inferior a R$ 2 mil?
Sempre que nós assinamos para concorrer pelo Novo, assumimos um compromisso de reduzir em 50% o número de assessores ou cargos em comissão. Existem muitas pessoas que são ligadas a determinados partidos e, em função disso, ganham funções gratificadas e cargos de chefia. É esse tipo de privilégio que não vai acontecer no nosso governo. A gente sabe que o funcionalismo leva a pecha de não trabalhar, de ter muito privilégio, mas quando a gente fala de funcionalismo que tem privilégio, falamos dos grandes marajás de Brasília. Em nível municipal, a maior parte dos funcionários públicos enfrenta até dificuldade de manter suas famílias.
O senhor propõe o corte de sete secretarias. Gostaria que citasse uma pasta que pode ser extinta.
Vemos hoje que existem secretarias que praticamente não fazem sentido de forma separada. Ter uma Secretaria de Agricultura que não esteja relacionada à pasta de Desenvolvimento Econômico não faz nenhum sentido. Queremos unir áreas afins dentro de secretarias que falem mais entre si. É como se criássemos supersecretarias, com coordenadores muito técnicos e muito ligados uns aos outros, para que, quando você chegar à Prefeitura com determinada demanda, não tenha que ir em diferentes secretarias para resolver o seu problema. Queremos pastas mais enxutas, mas com muito mais poder de autonomia e resolução.
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O senhor fala em valorização dos servidores. Pode se comprometer em repor a inflação e dar ganho real todos os anos?
Todo e qualquer aumento de custo da máquina pública, inclusive por aumento de salário, depende muito da austeridade que vamos ter no cuidado das contas. No momento em que formos econômicos o suficiente, utilizarmos a tecnologia a favor dessa eficiência e tivermos a parceria do funcionalismo, com certeza vamos ter maior capacidade de investimento. Obviamente, se eu tenho verba, é muito mais fácil privilegiar quem realmente está se dedicando. E aí, sou totalmente simpático a que a gente realmente devolva ao funcionário aquilo que é dele de direito, pelo menos a reposição da inflação todos os anos.
No seu plano, consta redução de IPTU, ITBI e ISSQN. Como compensar essa perda?
Através da eficiência. Hoje, como tu sabe se deve alguma coisa para o governo municipal? Só se tu fores na Secretaria da Fazenda, tirar uma fichinha e ficar lá uma ou duas horas esperando para que alguém veja no computador quais são teus débitos. Então, a primeira coisa é combater a ineficiência, e isso a gente consegue através da digitalização do serviço. Se você esqueceu de pagar o boleto, vai receber uma notificação no seu aplicativo de cidadão. E aí você pode entrar no aplicativo e resolver essa pendência de maneira rápida. Com isso, nós aumentamos a arrecadação. Santa Cruz arrecada muito dinheiro e, por isso, existe um comodismo da administração. Com tributos mais enxutos, as pessoas vão estar mais favoráveis a cumprir com seus compromissos.
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O senhor pretende recorrer a empréstimos para investir?
O endividamento do Município de Santa Cruz, segundo os órgãos reguladores, está dentro de um limite aceitável. O uso de financiamento é um instrumento viável quando realmente não há condição e fluxo de caixa suficiente para fazer obras que sejam indispensáveis. Mas, na nossa cabeça, é muito mais viável melhorar a capacidade de investimento. Por que Santa Cruz, apesar de ter um orçamento de mais de R$ 550 milhões, tem uma capacidade de investimento crítica? É porque gastamos mal. Hoje sabemos que tem uma empresa em Santa Cruz que, se levantar a sua estrutura e ir embora, o nosso orçamento cai no mínimo pela metade. E aí, como vamos administrar a nossa cidade? Então, a partir do primeiro dia do ano que vem, temos que pensar em como administrar com um orçamento que seja a metade do que a gente dispõe.
Essa empresa que o senhor citou, todos sabem, é a Philip Morris. E muito se fala sobre a necessidade de diversificação econômica. Qual sua visão sobre isso?
Como liberais, não acreditamos que seja o poder público quem vai dar a direção para onde haverá diversificação. Isso vai partir dos empreendedores. Essa diversificação vai acontecer naturalmente no momento em que as pessoas tiverem liberdade para empreender. Enquanto governo, temos que facilitar de todas as formas possíveis o empreendedorismo em nossa cidade. Precisamos de licenças com liberação rápida. Você entrega o seu projeto de forma digital e recebe digitalmente autorização para botar o tapume na sua obra em 72 horas, isso é um compromisso nosso. E se você quiser abrir uma empresa, tem de conseguir fazer isso em 48 ou 72 horas. Queremos aderir à Redesim e à Lei de Liberdade Econômica, para que qualquer negócio com até 400 metros quadrados, tu possa abrir sem precisar nem mesmo de alvará municipal. Hoje, municípios vizinhos têm se beneficiado da dificuldade que é abrir uma empresa em Santa Cruz. Não podemos seguir correndo com os empresários.
E o que pensa sobre incentivos fiscais?
O incentivo fiscal, se houver, tem que ser de uma forma totalmente isonômica. Não posso favorecer determinadas cadeias produtivas em detrimento de outras. Não posso favorecer um cidadão em detrimento de outro. Se houver incentivos fiscais, têm de ser iguais para todo indivíduo que queira vir investir no município.
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No seu plano constam parcerias públicas-privadas e concessões de imóveis públicos. Onde esse modelo pode ser adotado?
Hoje temos cerca de 50 associações no interior. O uso de imóveis públicos por organizações não governamentais, especialmente imóveis que estão sem utilidade, para produzir, gerar riqueza, é o tipo de parceria público-privada que teremos o maior prazer de efetuar. E também parcerias com entidades para cuidar de praças, de centros de convivência, de parques. E criação de novos parques turísticos e ambientais, tudo pode ser feito por meio de parceria. Na nossa cabeça, o principal objetivo da gestão pública é não atrapalhar e entregar segurança, educação e saúde com muita qualidade. Queremos focar nisso e o resto, queremos ter as empresas, organizações e associações para nos ajudar.
Vamos falar dessas áreas essenciais, então. Qual será sua prioridade em saúde?
A prioridade é integrar toda a informação sobre a saúde municipal. Hoje já existem alguns programas que conectam alguns postos, mas não existe integração, por exemplo, entre informações dos cidadãos que são internados pelo SUS nos hospitais ou no plantão de urgência. A partir daí, vamos conseguir mapear a vida do cidadão em relação ao uso da saúde pública, identificar quem são as pessoas que estão em condições mais graves e dar uma atenção à saúde de forma proativa e não reativa. Queremos utilizar de maneira efetiva os agentes comunitários, ampliar os programas de saúde da família. Hoje estamos, de certa forma, cegos em relação ao que acontece na saúde pública como um todo.
No seu plano, consta a criação do vale-educação. Como funcionaria?
Em uma conta rápida, o Município de Santa Cruz investe hoje R$ 752,00 por cada criança no ensino público municipal. Com esse valor, pagamos uma mensalidade em qualquer escola privada. Então, os excedentes que as escolas públicas que já existem não forem capazes de suprir, a ideia é garantir o direito dessas crianças através do uso de vale-educação. Faz-se um convênio com diferentes escolas e creches privadas, aplica-se o valor equivalente e, com isso, garantimos vaga para todo mundo. Assim estimulamos a criação de vagas em escolas privadas, aumentando ainda mais a circulação de valores, e conseguimos oferecer uma educação com bastante qualidade.
Não se trata de um esvaziamento ou redução da rede municipal?
Não, trata-se de não ampliar o que a gente já tem. Precisamos manter as estruturas com muita qualidade e manter uma capacitação constante dos nossos professores. E queremos trabalhar muito a segurança nas escolas públicas para que professores, alunos e pais se sintam seguros. Para isso vamos precisar de parcerias público-privadas, de monitoramento através de câmeras nas escolas, vamos precisar atuar junto à Brigada Militar para ter patrulhas escolares. Queremos usar bastante a estrutura das escolas no contraturno, para que os alunos tenham diferentes atividades, muitas delas por meio de parcerias. Outra ideia é um projeto-piloto de um voucher para o contraturno, através de parcerias com empresas de esporte, de artes, de cultura, de línguas, e entregar um voucher para a família, que vai escolher qual a melhor atividade para os seus filhos.
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O senhor se compromete com a regulamentação do piso do magistério?
Somos extremamente simpáticos ao cumprimento de leis. Não se pode esperar que um gestor público não cumpra uma lei. E sei do valor de um professor na nossa vida.
Como evitar um colapso no transporte coletivo urbano, que enfrenta uma queda no volume de passageiros?
Esse é um movimento não só de Santa Cruz, mas em nível mundial. As pessoas estão buscando transportes alternativos. Temos hoje a popularização do transporte através de aplicativos, e isso vai fazendo com que o transporte público tenha uma redução. A primeira coisa é ouvir todas as partes. E não adianta prejudicar a maioria para atender poucas pessoas. Recentemente, vi uma propaganda de um candidato falando em ônibus gratuito aos domingos. Quem vai pagar a conta? Vai ser quem paga a passagem. Precisamos ter muita consciência em relação a esses benefícios, eles têm que ser dados a quem realmente precisa. E o ideal é equacionar as distâncias. Se eu aumentar, por exemplo, os índices construtivos de determinadas regiões centrais, eu trago as pessoas mais próximas para os centros. Outra coisa é termos serviços da Prefeitura mais próximos das pessoas para que elas não precisem se deslocar até o Centro. E o transporte público vai ter que se adequar ao novo mundo. Talvez tenhamos que pensar em ônibus menores, em uso de combustíveis não fósseis e em novos modais de transporte, como a utilização de bicicleta.
Existe uma lei que regula os aplicativos de transporte, mas na prática não funciona. Como o senhor pretende lidar com isso?
Defendemos a liberdade, mas com organização. Se existe a lei, tem que ser cumprida. Se a lei é ruim, tem que ser revogada ou substituída por um dispositivo legal que realmente atenda às necessidades da população e possa ser fiscalizada. O que não pode acontecer é o transporte irregular, porque isso põe a segurança das pessoas em risco. Os aplicativos surgiram para suprir uma demanda por transporte individual de mais qualidade nas grandes cidades, mas nas cidades pequenas sempre fomos muito bem atendidos pelos taxistas e temos que ter o cuidado de não inviabilizar o trabalho deles.
O senhor fala em revisar o contrato com a Corsan. Como garantir que a empresa cumpra o que assinou?
Ele precisa ser revisado a cada quatro anos. O novo Marco do Saneamento Básico prevê que todos os contratos até 2026 sejam revistos. Existe uma série de dispositivos nesse contrato, desde multas até mesmo quebra do contrato, no caso de não cumprimento. O que vem acontecendo é uma permissividade do poder público municipal em relação a isso. A primeira coisa é ficarmos muito próximos da agência reguladora, que vai nos auxiliar, e já faz isso de maneira muito competente, a estar de olho nesse contrato e fazer com que seja cumprido à risca por parte da Corsan. Hoje, nós temos uma perda de água tratada que é inadmissível. E temos que eliminar todos esses aditivos não legais que foram feitos.
Como seriam as parcerias público-privadas para a segurança pública?
Basicamente, é utilizar as empresas de segurança privada, não só a estrutura mas especialmente a inteligência dessas empresas, para nos auxiliar na melhor utilização das imagens das câmeras de segurança e em patrulhamento no interior. Sai mais barato contratar empresas para isso do que contratar novos guardas municipais, até porque isso denota concurso público e vínculo empregatício pelo resto da vida com o Município.
Santa Cruz conta com uma lei que prevê reserva de vagas para pessoas negras em concursos. Qual sua opinião sobre a política de cotas?
Tenho experiência com projetos esportivos no interior, e as pessoas de maior vulnerabilidade eram loiras e tinham olhos claros. É claro que existe uma necessidade de reparar danos históricos feitos a pessoas de raça negra. Porém, na minha concepção isso se faz não garantindo cotas, mas através de igualdade no acesso à educação, saúde, cidadania. Se a gente tiver educação de qualidade e cidadania para todas as pessoas, independentemente da cor, das escolhas sexuais, seja lá o que for, vamos ter igualdade de oportunidades. Estamos muito atrasados no Brasil ao discutir a questão racial, isso já foi resolvido na maior parte dos países desenvolvidos. Precisamos parar de nos classificar em relação a ricos, pobres, empregado, patrão. Toda essa briga de classes só serve para separar as pessoas.
Mas o senhor revogaria a lei de cotas?
Não sei se eu revogaria, porque não conheço a lei na íntegra. Teria que sentar, ler, rever toda essa lei. Mas não tenho essa preocupação agora. Nossa preocupação é garantir qualidade ao que as pessoas recebem.
Qual vai ser o papel do vice no seu governo?
Só entrei nisso porque tenho a segurança de ter um vice extremamente competente em uma área fundamental, que é a área jurídica. O Paulo vai ter o papel principal de nos dar segurança jurídica para fazermos o que é necessário. Ele vai estar diretamente ligado à Procuradoria do Município.
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A série de entrevistas
A menos de um mês da eleição municipal, a Gazeta do Sul veicula desde essa segunda-feira, 19, uma nova série de entrevistas com os sete candidatos a prefeito de Santa Cruz. Os prefeituráveis conversaram com a reportagem ao longo da semana e foram questionados sobre temas como economia, gestão fiscal, funcionalismo, saúde, educação, segurança, turismo, desenvolvimento rural, transporte coletivo urbano e saneamento, entre outros. Além da versão em texto, também será possível ouvir as entrevistas em podcast no Portal Gaz e nas plataformas de streaming.
Conforme definido em sorteio, a ordem de publicação será a seguinte:
Dia 19/10: Jaqueline Marques (PSD)
Dia 20/10: Alex Knak (MDB)
Dia 21/10: Helena Hermany (PP)
Dia 22/10: Mathias Bertram (PTB)
Dia 23/10: Carlos Eurico Pereira (Novo)
Dia 26/10: Frederico de Barros (PT)
Dia 27/10: Irton Marx (Solidariedade)
LEIA TODAS AS REPORTAGENS DA SÉRIE
1. “Santa Cruz do Sul tem tudo para ser um polo turístico”, diz Jaqueline Marques
2. “Nós temos que priorizar o que dá resultado”, diz Alex Knak
3. “Tenho muito orgulho da minha família”, diz Helena Hermany
4. “Vamos exigir que a Corsan cumpra o contrato”, diz Mathias Bertram
5. “Não podemos seguir correndo com os empresários”, diz Carlos Eurico Pereira
6. “É fundamental priorizar a economia local”, diz Frederico de Barros
7. “O Estado está acompanhando as eleições de Santa Cruz”, diz Irton Marx
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