Condição clínica que pode sinalizar o agravamento da infecção pelo novo coronavírus, a Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) registra números impressionantes no Brasil, nos primeiros meses de 2020: foram 68.828 internações por este motivo até 10 de maio.
Esse dado consta no último boletim InfoGripe, elaborado pela Fundação Osvaldo Cruz (Fiocruz) a partir de dados cedidos pelo Ministério da Saúde. Prevendo o atraso para atualização do sistema, o relatório semanal divulgado nessa terça-feira, 12, ainda estima que tenham ocorrido 90.973 casos de SRAG, podendo variar entre 81.880 e 104.878 até o término da semana 19, ou seja, entre os dias 3 e 10 deste mês. Para melhor compreensão do cenário atípico, o total de registros em todo o ano de 2019 foi de 39.429 casos e, em 2016, de 39.871.
Dos quase 69 mil casos de SRAG registrados até agora, 21.257 apresentaram resultado laboratorial positivo para algum vírus respiratório, 22.830 negativos, e ao menos 19.051 ainda estão aguardando resultado. Dentre os positivos, 4,2% para Influenza A, 2,1% para Influenza B, 2,6% para vírus sincicial respiratório, e 86% para covid-19.
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Em relação ao número de óbitos por Síndrome Respiratória Aguda Grave, o InfoGripe registra um total de 10.623 casos já reportados no ano. Dentre os positivos para algum tipo de vírus, 1,7% indicou Influenza A, 0,6% Influenza B, 0,2% vírus sincicial respiratório, e 95,9% para covid-19. Levando em conta o atraso para a digitação, o boletim estima que tenham ocorrido 12.588 óbitos de SRAG até o dia 10 de maio. Em todo o ano de 2019, foram 3.811 mortes, e em 2016, 4.785 óbitos.
No Rio Grande do Sul, o sistema registra 284 mortes desde o começo do ano. A estimativa, observado a demora para atualização, é de que já tenham ocorrido 320, como uma variação possível entre 292 e 399 óbitos. No mesmo período de 2019 haviam sido 40, e no total daquele ano, 238. Já em 2016, até o começo de maio, eram 189 mortes, e durante todo o ano, 421.
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Em entrevista para o programa Rede Social, da Rádio Gazeta FM 107,9, o pesquisador do Programa de Computação Científica da Fiocruz, Marcelo Gomes, detalhou e analisou os registros.
Leia os principais trechos da conversa com os jornalistas Leandro Porto e Maria Regina Eichenberg.
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ENTREVISTA
Marcelo Gomes Pesquisador da Fiocruz
Rede Social: Como é elaborado o levantamento de dados e quais as principais impressões que podem ser observadas?
Marcelo Gomes: O sistema é atualizado com base no repasse de informações do Ministério da Saúde, que é o grande parceiro do InfoGripe. O que nós vimos mantém o que já era observado na semana anterior: estamos numa situação de crescimento do número de novos casos de Síndrome Respiratória Aguda Grave; isto é, hospitalizações de pessoas com sintomas de doenças respiratórias mais intensos.
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Os números apresentaram crescimento significativo desde a última semana?
Até o encerramento da semana 18, ou seja, até o dia 2 de maio, tínhamos já inseridos no banco de dados cerca de 57 mil casos no acumulado do ano para Síndrome Respiratória Aguda Grave. Digo isso sem entrar na discussão do atraso da digitação, que é o tempo que levamos para identificar um caso desses na rede hospitalar e essa notificação ser de fato introduzida no banco de dados digital.
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Na última atualização, já estamos com 68,8 mil casos; ou seja, tivemos um aumento na ordem de 11,8 mil novos registros. Levando em conta esse fato que comentei, de que tem um atraso natural na inserção dos dados do sistema, desenvolvemos um modelo estatístico para justamente tentar estimar o que de fato já aconteceu, mas que só vai constar no sistema com o passar das semanas. Nesse sentido, a estimativa é que a gente já estaria com quase 91 mil casos no país só até a semana passada. Para colocar em perspectiva, em 2019 tivemos 38 mil casos no ano inteiro.
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A explicação para isso seria o novo coronavírus?
Quando analisamos esses dados do ponto de vista científico, montamos um quebra-cabeças pra tentar entender o que está por trás dessa grande variação. A primeira peça é que estamos com um número muito maior do que o histórico desse registro. A segunda peça aparece quando estratificamos os casos por faixa etária. Historicamente, tínhamos muitos casos em crianças, principalmente menores de 2 anos, e em adultos acima de 60 anos.
A partir de meados de março de 2020, quando olhamos para a distribuição por faixa etária, vemos que o volume está muito maior nos adultos jovens e também muito alto nos acima de 60 anos. Isto ocorreu justamente quando teve início esse salto no número de casos de SRAG e se estabeleceu a transmissão comunitária do novo coronavírus no Brasil. Isso também é compatível com o novo coronavírus.
A terceira peça é que quando a gente vai olhar os casos desse conjunto que já foram para exame laboratorial e tiveram resultado positivo para algum vírus respiratório; 86% de todos os testados deram teste positivo para o novo coronavírus. Então, quando juntamos todas essas peças, qual imagem acabamos formando? Ora, o mais provável é que esse aumento absurdo de internações e óbitos por SRAG seja consequência do novo coronavírus circulando no nosso país.
E o número de óbitos?
Até a semana passada, 10,6 mil óbitos registrados no sistema de monitoramento. Levando em conta o atraso na atualização, a perspectiva é de que o número chegue a 12,5 mil. E o que tivemos nos anos de 2019 e 2016, que foram os piores desde 2010? Em todo o ano passado, 3,8 mil mortes, e em 2016, 4,7 mil. Ou seja, é outra escala de grandeza.
Estamos lidando com algo que é completamente diferente do que observamos em outros tempos, principalmente em relação a Influenza, que sempre foi o vírus mais dominante nessas internações e nos óbitos por Síndrome Respiratória Aguda Grave.
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E os números do Rio Grande do Sul?
Para o Rio Grande do Sul, sabendo que tem atrasos, a estimativa até a última semana é de 3,3 mil internações, podendo variar entre 2,9 mil a até 4,7 mil. Em óbitos, estamos falando em 320, podendo variar entre 290 e quase 400 casos. Para termos uma comparação, em 2019 foram 2.770 casos, no ano todo. Sendo que no Rio Grande do Sul, historicamente, os casos estão ligados ao período do inverno; ou seja, não chegamos no período típico de maior incidência. E um detalhe importante sobre o Rio Grande do Sul: assim como observado em outros estados, no final de março e no começo de abril houve uma redução, ou uma estabilidade no número de novos casos registrados. Isso foi um sinal de que a adesão grande ao distanciamento social naquele período teve um impacto que era possível observar.
Mas de lá para cá isso se perdeu e os dados voltaram a crescer com uma velocidade preocupante. Isso acende um alerta de que ainda não é hora de a gente começar a relaxar. Pelo contrário, temos de manter aquilo que estava tendo resultado. Houve adesão ao distanciamento social e isso teve um efeito no sentido de frear a disseminação do vírus. E isso é fundamental para que, justamente, a gente tenha tempo de organizar a estrutura hospitalar no Estado para atender uma demanda que é muito maior do que o usual.
Isso significa que, pela baixa testagem, pela subnotificação, não temos nem de longe um quadro real do total de casos?
Perfeito. Isso a gente tem de ter muito claro. Para falarmos de casos confirmados do novo coronavírus, existe toda essa questão da demora do resultado dos testes. Assim como a rede hospitalar está começando a saturar, o Laboratório Central do Estado tem um teto de quantas amostras consegue processar por dia ou por semana. Então, estão chegando muitas amostras diariamente no Lacen, e começa a demorar cada vez mais para chegar a confirmação. É importante ter isso em mente para não ficarmos com uma falsa impressão de que não tem muitos casos confirmados.
Quando olhamos para as internações com quadro clínico grave, e estamos vendo que tem vários outros sinais que potencialmente estão associados ao novo coronavírus, mesmo sem o resultado laboratorial, esse é o dado mais rápido, e que nos permite ter essa precisão do que de fato está acontecendo em termos de pressão e demanda por leitos. Isso é uma coisa muito boa, de o Brasil ter há muito tempo essa vigilância, esse monitoramento de SRAG. Até porque o total de casos não é só o de hospitalizados. Os internados são uma parcela, a ponta do iceberg. Um percentual muito grande dos que se infectam pelo vírus desenvolvem sintomas leves ou são assintomáticos, mas estão transmitindo para pessoas que podem precisar de hospitalização.
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Quais sintomas se enquadram como Síndrome Respiratória Aguda Grave?
Quando a gente fala em SRAG, estamos falando de pessoas que tiveram febre, tosse ou dor de garganta e, além disso, dificuldade respiratória, que aí pode ser dispneia (falta de ar), saturação de oxigênio no sangue baixa ou propriamente falta de ar. Então, tem de ter esses sintomas e, além disso, ter necessitado de internação ou ter morrido após ter apresentado essas condições. E ressalto: isso é só um pedaço do total, inclusive de internações por doenças respiratórias, incluindo o novo coronavírus.
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